Os sinais da temida desaceleração da economia chinesa se intensificaram após a Bolsa de Xangai registrar a maior queda dos últimos oito anos e lançaram um alarme para a economia brasileira. O forte recuo de 8,5% da bolsa chinesa, na segunda-feira, influenciado pela divulgação de dados ruins da indústria, teve impacto nos preços das commodities e levou à desvalorização de várias moedas emergentes como o real, que chegou à cotação mais baixa em 12 anos.
A freada do gigante asiático, maior comprador do Brasil, e a própria mudança de rumo no modelo da economia chinesa, que aposta agora no consumo interno, já se reflete na balança comercial brasileira deste ano. Segundo dados da Secretaria de Comércio Exterior, de janeiro a junho deste ano, as exportações para a China registraram uma queda de 22,6% em receita, quando comparado com o mesmo período do ano passado. Ao todo, a China comprou 18,4 bilhões de dólares no período, equivalente a 19,6% do total das vendas ao exterior do Brasil, mantendo-se como o maior comprador do país.
“Claramente, a produção chinesa vai reduzir e, consequentemente, diminuirá a demanda por commodities nos países exportadores, como o Brasil”, diz o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Além da queda de volume exportado, o Brasil sofrerá pela queda no preço do minério de ferro, soja e o petróleo enviados a Pequim.Vários indicadores ruins divulgados recentemente voltaram a mostrar que os esforços do Governo chinês para retomar o bom desempenho das Bolsas do país, que caíram cerca de 28% nos últimos 45 dias, não foram suficientes. Um deles foi a notícia de que o lucro das maiores companhias do país caiu 0,7% no semestre em relação ao mesmo período de 2014. Pelas novas estimativas do FMI, a segunda maior economia do planeta deve seguir um ritmo mais lento neste ano e crescer 6,8%. No ano passado, a expansão foi de 7,4%.
“O modelo chinês está mudando, dando uma ênfase maior no consumo com o avanço do processo de urbanização. Eles estão colocando um freio em novos investimentos já que há uma descompasso entre a oferta e a demanda. Desacelerar é uma estratégia, mas claramente essa transição não poderá ser abrupta”, explica o professor André Nassif, da FGV.
Para o Presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, Charles Tang, o fundamento da economia ainda é sólido, porém a preocupação com um crescimento mais sustentável faz o país desacelerar economicamente. "O Governo já não está preocupado com uma expansão de dois dígitos, ele está focado na qualidade do crescimento. Os investimentos serão mais sofisticados nos próximos anos", explica Tang que acredita que o país asiático ainda tem interesse de investir no Brasil e exportar seus produtos para o mercado brasileiro.
"A China possui hoje uma produção que ultrapassou a demanda e vê no Brasil a possibilidade exportar os seus excessos”, prevê. Ele lembra que mesmo com desaceleração, a China também ainda precisa dos grãos e do petróleo brasileiro.
Mudança de rumo
Apesar do recuo chinês impactar a economia brasileira, Nassif pondera que o novo cenário mundial de queda dos valores das commodities indica que o modelo brasileiro tão dependente da exportação de matérias-primas já não é sustentável e precisa ser alterado. “Se o Brasil continuasse assim, entraríamos em um ciclo da doença holandesa (que, em economia, refere-se à relação entre o aumento da exportação de recursos naturais e o declínio do setor manufatureiro”, explica Nassif.
A saída do Brasil para retomar o crescimento, segundo o professor, é incentivar o desenvolvimento industrial e do setor manufatureiro. “Só assim é possível reverter esse quadro de dependência de vendas de minério e de produtos agrícolas”, diz. Nos primeiros seis meses deste ano, os manufaturados representaram apenas 37% das exportações brasileiras.
No entanto, o caminho para essa transformação do setor exportador não é fácil já que o Brasil enfrenta uma situação adversa interna e está imerso em uma conjuntura de crescimento mundial rastejante. Ainda que o atual patamar da taxa de câmbio favoreça a competitividade de produtos exportados pelo Brasil, o país depende da volta de um crescimento mundial mais robusto, que não tem dado grandes sinais de recuperação, com exceção dos Estados Unidos.
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