No passado dia 19, fui festejado como pai, e pensei: não há "dia do filho", certamente por se achar que todos os dias são "dias dos filhos". O que é muito questionável, tendo em conta muitos pais que vou encontrando por aí, mas enfim. Alguns dias antes, tinha sido o "dia da mulher". E, por isso, repeti o pensamento: também não há "dia do homem", certamente por se pensar que todos os dias são "dias dos homens". O que também acho muito questionável, devo dizer. Lembrei-me ainda de várias notícias que saíram sobre as diferenças de salários ainda hoje existentes entre homens e mulheres. Creio até que vi comparativos de diversos países. Por fim, não sei se ouvi ou li este comentário: só lá para 2050 (a data não será exactamente esta) é que os salários serão iguais.
Na bibliografia existente sobre a área da Responsabilidade Social das organizações, é muito frequente a preocupação em observar se há igualdade de oportunidades entre sexos, se existe discriminação de salários para as mesmas tarefas, se mulheres e homens acedem com igual probabilidade a lugares de topo, etc.. Também na "política" se discutem as célebres "quotas": nos governos, nos parlamentos, nos cargos de chefia.
Todos estes exemplos são normalmente usados como material bélico numa contenda que opõe duas teses. A primeira diz que não devem existir quotas de sexo impostas a qualquer nível e que as pessoas devem ser escolhidas para os cargos em função das suas capacidades, currículo ou similar. A segunda diz que esta selecção em função das capacidades é uma treta e, como são os homens que estão no poder, limitam indevidamente o acesso das mulheres; ora, como as mulheres não são mais estúpidas ou ignorantes do que os homens (neste momento, as mulheres até têm níveis de instrução mais elevados), a única maneira de acabar com essa injustiça acumulada do passado é impor as quotas. E impor as quotas significa, para que se perceba, as mulheres ganharem tanto como os homens e serem em igual número nos cargos de chefia, nos órgãos consultivos (mesmo na Comunicação social, etc.).
Já numa crónica anterior - de homenagem à Zaha Hadid - falei sobre a ausência de mulheres na arte e na filosofia. Fruto de uma subalternização de séculos? Não sei, ou, melhor, tenho uma teoria sobre o assunto, mas não é agora o momento de ir por aí. O meu é objectivo é outro. E é simples. Falando de arte ou de filosofia, seria humor britânico dizer que teriam de passar a existir tantos músicos, ou filósofos, masculinos como femininos. Ou mesmo designers de moda. Porquê? Porque nada obriga as mulheres a ter, para certas actividades ou profissões, a mesma apetência ou propensão que os homens. Como seria ainda mais hilariante dizer que, a partir de agora, deveriam existir tantas mulheres como homens nas obras de construção civil. O absurdo destas afirmações advém de um princípio simples: mulheres e homens são diferentes. Mas dir-se-á: têm os mesmos direitos. Pois têm, mas apenas no que diz respeito aos direitos fundamentais, de condição humana. Não temos, tanto homens como mulheres, direitos em relação a tudo: não podemos reivindicar o direito de admissão numa determinada empresa, de exercer determinado cargo, de ter um livro publicado, de ter uma estátua no Rossio. Por isso, se é admissível as mulheres não terem paridade na música, por que a devem ter na administração das empresas? Quem decide em que profissões deve haver, ou não, paridade?
Na minha opinião, toda esta discussão não leva a lado nenhum. Acho imoral dizer-se que temos de esperar 30 anos para as mulheres ganharem o mesmo que os homens. Acho medíocre passar a vida a discutir quotas. Que penso eu então?
Estou de acordo com as duas teses que acima enunciei. Ou seja, reconheço que não há qualquer selecção com base no mérito. Mas também sou contra as quotas. Tal como sou contra os que propõem, na sociedade, a igualdade de todos os indivíduos. É o erro fundamental do comunismo. Apesar da ternura da ideia. Ou seja, não aceito que as mulheres devam ganhar o mesmo que os homens pela mesmíssima razão que não aceito que os homens ganhem todos o mesmo. Defendo, acima de tudo, a liberdade. E a justiça social. Logo, defendo a mesma solução para as duas questões. Proponho para a justiça "de género" o mesmo que proponho para a justiça social: igualdade à partida (defendo um conceito complexo de igualdade de oportunidades, de todos, aos 18 anos) e, depois, a partir daí, meritocracia em função de uma avaliação de desempenho justa e imparcial. E essa avaliação deve ser, como é óbvio, igual para homens e para mulheres.
Se esta meritocracia fosse implantada, todas as discussões que descrevi no início deste texto se tornariam obsoletas. E não teríamos de esperar 30 anos por coisa alguma. No entanto, não vejo os que condenam as injustiças praticadas contra as mulheres defender a meritocracia (que é palavra, recordo, que não existe - ou não existia até há pouco tempo - nos dicionários da língua portuguesa). Como não vejo os "sirizos" (neologismo), que julgam ser os únicos a lutar pelos injustiçados da sociedade, defender a meritocracia. Preferem idolatrar o absurdo da igualdade à chegada e, consequentemente, atrasar - para benefício dos que estão sentados em cima dos privilégios de nascença - uma solução verdadeiramente justa.
Andamos nisto há 150 anos (publicação de "O Capital").
PS: enquanto a meritocracia não existe, e como sou a favor da justiça, sinto-me obrigado a defender um equilíbrio entre homens e mulheres nos salários e nos cargos de chefia das empresas. Em que áreas? Pelo menos naquelas onde existe relativo equilíbrio na frequência do ensino superior.
Ler mais: http://visao.sapo.pt/paridade-entre-homens-e-mulheres=f815072#ixzz3VsAzpLDT
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