sábado, 28 de março de 2015

O ex-ministro e os 400 da Câmara

Não faz muitos anos, o ex-presidente Lula fez uma afirmação bombástica e dramática: “Na Câmara dos Deputados tem cerca de 300 picaretas”.
Foi uma efervescência! Muitos parlamentares enlouquecidos, outros indignados, outros até agradecidos pelo número alto, sendo que assim ficaria até fácil para dissimular, outros ensaiando uma pantomima, na tentativa de jogar uma cortina de fumaça, enquanto escorregavam pelos fundos, e aqueles realmente bons – que, afinal, ainda eram 213 – ensaiavam as mais diversas reações, repúdios e condenações.
Quanto ao Lula, ele fez igual àquele vereador semianalfabeto de câmaras de vereadores do interior que, quando o presidente ordena que aqueles que estão de acordo com alguma proposição que esteja sendo votada fiquem sentados se concordarem ou fiquem de pé, se contrários; aí ele não entendendo nada fica numa posição intermediária, nem de pé, nem sentado. Assim o Lula fez de conta que ‘desfalou’ e, ao final, ficou tudo por isso mesmo.

Agora, com o ex-ministro da Educação, Cid Gomes, há poucas semanas, não foi bem assim, muito pelo contrário. Até porque ele não tinha nem o cacife, nem a habilidade, nem o carisma, nem o prestígio de Lula. Não obstante disso, o ex- ministro, de rompante de ‘cabra macho’ nordestino, lascou essa nova versão já atualizada em números, da afirmação do Lula, agora ainda mais virulenta: ‘’Na Câmara dos Deputados existem 400 achacadores’’. Aí, o mundo político veio abaixo.
Começou tudo de novo, as mesmas reações iradas acima, principalmente do presidente daquela Casa, Eduardo Cunha, que, aliás, figura como um dos astros denunciados na ‘’Lava Jato’’ da Petrobras.

O bicho pegou! Só que aqui o desfecho foi bem diferente daquele protagonizado por Lula.

A presidente Dilma determinou que o ministro fosse à Câmara dos Deputados e se desculpasse ante aos impolutos parlamentares, se bem que, sozinha, nos recônditos espaços do palácio da Alvorada, ela deve ter dado risadas.
Satisfação à parte, lá foi o Cid Gomes, armado até os dentes. Começou como quem nada queria, fazendo aqueles falsos elogios à Casa, enchendo o ego dos parlamentares, levando-os a pensar que tinham capturado uma inofensiva lebre. De repente, quando deram o primeiro cutucão com a vara de marmelo que cada um tinha à mão, foi só dente que apareceu; haviam capturado um urso e o mesmo se dispunha a fazer ‘pó de traque’ da frágil gaiola de folha de cebola que pensavam tê-lo aprisionado. Longe de se desculpar, o ex- ministro que é irmão de outro ‘cabra macho’ de Sobral, interior do Ceará, o Ciro Gomes, resolveu jogar pelo ar o ministério, esbravejar e instilar todo o veneno que parecia carregar contra os parlamentares. Foi um verdadeiro frisson da galera. A turma dos 400 ensaiando uma rebelião contra o governo, os outros 113, idem. Queriam-lhe a cabeça.

Ao final, como se diz, entre mortos e falecidos se salvaram todos; uma das maiores acomodações políticas, dessas dimensões, já ocorridas na Câmara. A começar pelo próprio Cid Gomes, que já compareceu com a firme determinação de se tornar ex-ministro.
Para a presidente Dilma, que deve ter sido a que mais gostou da afirmação, inclusive porque para se ter 400 achacadores, grande parte deles seriam de seu próprio governo; lobos em pele de cordeiro. Ademais que nem sequer precisou despedir o ministro, pois ele mesmo pediu demissão. Igualmente, a demissão tanto atendeu aos 113 deputados probos que se sentiram de alma lavada, quanto aos outros 400 que querem acreditar que nós pobres eleitores os julgamos vitimas indefesas.
E, assim, todos se sentiram vitoriosos, tanto que já estão fazendo de conta que esqueceram o episódio e que ‘’tudo vai continuar como antes no quartel de Abrantes’’.

O perigo para eles é se surgir nova afirmação e o número da picaretagem ser atualizado para 500; aí, para dissimular ante um filetinho tão estreito de 13 vagas e onde todos vão querer estar, primeiro terão que votar mudança na lei da física. Agora, se cair para 200, aí será motivo de festa
na Casa!
NORIVAL BARBOSA é Secretário de Fazenda do Governo Ataíde Vilela. 

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