sábado, 23 de janeiro de 2016

Por que desapareceu o lago Poopó, o segundo maior da Bolívia? O El Niño deu o golpe final num lago dos Andes que foi muito maior que Los Angeles e que agora será muito difícil de recuperar.

O lago Poopó, na Bolívia, que na década de 1990 chegou a cobrir uma área superior a mil quilómetros quadrados — duas vezes mais que a cidade de Los Angeles — e uma profundidade entre os 1,5 e os quatro metros, foi oficialmente declarado como evaporado. Está reduzido a 2% da sua anterior área e secou a um ritmo alarmante, no que resultou num enorme desastre ambiental para as muitas espécies que ali viviam.
A região do lago, que fica nas montanhas do Altiplano dos Andes bolivianos, no Sudoeste do país, a 3821 metros de altitude, foi declarada pelo Governo "zona de desastre" em Dezembro. O antigo lago alberga agora maioritariamente carcaças de animais e barcos encalhados. Sobram três pequenas áreas húmidas, com menos de um quilómetro quadrado e apenas 30 centímetros de profundidade.
Mais de 200 espécies animais habitavam aquele ecossistema. Aves, peixes, répteis e mamíferos desapareceram. “Há 40 dias havia água e os flamingos estavam lá”, contava à Reuters, ainda em Dezembro, Valerio Calle Rojas, um dos 150 pescadores da comunidade Untavi.
Apesar de não ter secado em apenas 40 dias, e ter-se tratado de um processo que demorou anos, esta tragédia teve impacto não só no ambiente mas também nas comunidades locais, que viviam maioritariamente à custa da exploração do lago. Cerca de 350 famílias, na maioria de pescadores, que viviam já em condições precárias de subsistência, foram atingidas pelo desaparecimento do lago. Mas pelo menos 3250 receberam ajuda humanitária, segundo o governador da região, diz o Guardian.
O Governo da Bolívia anunciou um plano de recuperação do lago no valor de três milhões de dólares, para reverter o desvio do rio Desaguadero, na década de 1990. Fonte abastecedora do lago durante décadas, foi impedido de atingir a bacia do Poopó com estas obras, através da execução de um plano director em que foi privilegiado o lago Titicaca — o maior lago fechado da América do Sul, partilhado com o vizinho Peru —, que possui uma área superior a 8000 quilómetros quadrados.
Há planos para recuperar toda a bacia hidrográfica do Poopó, muito mais ambiciosos e caros — no valor de 140 milhões de dólares —, que incluem estações de tratamento de águas residuais e desassoreamento de vários rios. O Governo de Evo Morales pediu ajuda à União Europeia para tentar levar este plano avante. No entanto, várias vozes na comunidade científica classificam o desastre como “irreversível”.
Na realidade, foi a combinação de vários motivos que conduziu a este desastre ecológico, envolvendo participação humana directa e indirecta, além de factores climáticos como o aquecimento global e o fenómeno cíclico El Niño.
A mão humana foi sentida através da exploração mineira excessiva, desde 1982, e a contaminação da água pela agricultura. O aquecimento global fez subir a temperatura no local em cerca de 1ºC nos últimos 30 anos, intensificando o derretimento dos glaciares dos Andes. E, à medida que vai desaparecendo esse gelo, também se evaporam as fontes de reabastecimento do lago. Mais: o aumento da temperatura também fez com que o lago se evaporasse a um ritmo três vezes mais rápido.
A isto, juntaram-se ainda as secas que se acentuaram nas últimas décadas. As chuvas deixaram de vir com a regularidade necessária para assegurar a manutenção do equilíbrio do lago. Segundo um estudo publicado em 2013 pelo consórcio alemão Gitec Cobodes, ficou provado que, para se manter tal equilíbrio, o lago precisaria de receber mais 161 mil milhões de litros de água além do que tinha vindo a receber.
Por fim, outro efeito que contribuiu para o fim deste lago foi a crescente regularidade de catástrofes climatéricas como o El Niño. “O fenómeno El Niño costumava aparecer de dez em dez anos”, disse Milton Perez, professor da Universidade Técnica de Oruro. Agora, “o fenómeno ocorre de três em três anos. Não há tempo suficiente para o lago recuperar e é cada vez pior”, notou.
A última grande crise, no final do ano de 2014, levou à morte de milhares de peixes e forçou a deslocação de imensas espécies da fauna local.

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