O casal de escoceses Andy e Maggie Robin viveu, durante os anos 1970 e 1980, com um animal de estimação atípico: um urso-pardo de 2,5 metros de altura chamado Hércules.
Isso provavelmente não seria possível hoje, com as mudanças ocorridas na sociedade em relação ao trato de animais selvagens. Mas, naquela época, Hércules tornou-se uma espécie de celebridade, estrelando filmes e programas de TV ao redor do mundo.
A seguir, Maggie conta como seu relacionamento com o urso começou.
"Antes de nos conhecermos, Andy havia chegado a lutar com um urso, chamado Terrible Ted, e daí em diante ele ficou fascinado com a relação que seria possível ter com um animal do tipo. Ele ficou intrigado com isso. Andy era quase um urso - então não havia duas criaturas melhores para viverem juntas.
Quando ele me disse que queria ter um urso, era um domingo de tarde. Ele estava hesitante, mas eu disse que seria uma ótima ideia. O Parque de Natureza Selvagem Highland, na Escócia, sempre tinha muitos filhotes de ursos e eles nos venderam um.
Pagamos, porque queríamos ter certeza que não seria possível voltar atrás no acordo. Se não o tivéssemos o comprado, ele provavelmente teria sido abatido, porque os ursos se reproduzem facilmente em cativeiro e na natureza e havia mais animais do que o parque comportava.
Quando o compramos, ele era um filhote de nove meses e meio e bastante selvagem. Antes, ele vivia com sua mãe e dois irmãos, e de repente foi parar na casa de um casal de estranhos. Quando o colocamos na toca que fizemos para ele, Hércules ficou muito insatisfeito e buscou escapar de todas as formas.
Ursos são tímidos e costumam ficar na defensiva, podendo se tornar agressivos. Como Andy era lutador e era muito ágil, ele conseguia escapar das investidas do Hércules. Mas eu não pude chegar perto dele por alguns meses. Ele era muito rápido e dava mordidas por reflexo. Pensava que isso nunca pararia, mas parou.
Tivemos que persistir para criar uma relação com ele. Andy se dedicava totalmente para fazer com que Hércules se tornasse nosso amigo. Ele sabia que isso não poderia ser forçado, a única maneira era deixar acontecer.
Havia muita natureza ao nosso redor, e Andy e Hércules faziam longas caminhadas juntos. Era um ambiente ideal para um urso. Ele não era mais um animal de estimação. Ele se divertia de verdade.
A esta altura, estávamos encantados por ele. Ele era tão lindo... Tinha um charme próprio, adorava brincar e era cheio de energia. Com o tempo - e vivemos juntos por muito tempo, como os três mosqueteiros, muito felizes na companhia uns dos outros – eu me tornei sua mãe, mas Andy era seu companheiro, seu parceiro de luta.
Acredito que se Andy não tivesse sido lutador as coisas não teriam acontecido da mesma forma, porque, com Andy, Hércules nunca ficava frustrado. Se você vive com alguém por tantos anos e não pode tocar nelas, cheirá-las ou pegar nelas, isso o deixa maluco.
Mas Hércules nos aconchegava. Deitávamos em cima dele. Ele ficava em casa, na cama. E, como tínhamos um pub, ele sempre recebia visitas.
Ele não gostava muito de cerveja, mas adorava limonada e champagne. Sempre ouvíamos o barulho dele na lixeira, porque Hércules saía de sua toca e ia ver o que havia restado no fundo das garrafas, mas rejeitava toda bebida que fosse muito seca.
Ele era como uma pessoa para nós. Não gostava de comida crua. Ele costumava fazer sua refeição principal no meio tarde. Servíamos 3,5 kg de carne. Ele gostava dela cozida com sopa, principalmente de tomate, com batatas e cenouras. De manhã, o encontrávamos nos esperando para o café.
Hércules sempre veio em primeiro lugar para nós. Tínhamos assumido uma responsabilidade enorme. E era algo que poderia dar muito errado. Mas ele nunca nos feriu seriamente. Só um machucado aqui e ali, como quando, por exemplo, nos deitávamos na sua barriga e ele queria se virar e colocava os dentes na nossa cabeça, mas nada grave.
Era uma situação surreal, as coisas que ele fazia eram incríveis. Ele era um urso de meia tonelada que ia a teatros, estúdios de TV. Um dia, em 1980, ele estava filmando um comercial numa ilha e foi nadar, mas não voltou.
Havia sido uma manha incrível. Hércules e Andy estava na água, e Hércules estava muito animado. Havia muitos cheiros interessantes por ali, do mar, das focas. E Andy sempre ia atrás dele, mas, neste dia, a corrente estava muito forte e Hércules foi levado.
Fiquei vendo da praia e pensando: 'O que está acontecendo? Algo está errado'. Andy também foi levado e, com a ajuda de pescadores, surgiu no outro lado da ilha. Mas não havia sinal de Hércules.
Todo mundo o procurou. Os moradores, a polícia, o Exército. Mas ele ficou desaparecido por 24 dias. Quando Hércules reapareceu, estava agitado, com os instintos aflorados. Foi dopado e levado de volta para casa de helicóptero.
Ele estava muito magro e coberto por anzóis. Não comia nada. Não estava nada bem. Pedimos ajuda, e muitas pessoas trouxeram leite para ele. E Hércules tomou. Isso foi uma surpresa, porque ele gostava de leite no seu chá, mas não era algo que costumasse beber.
Hércules melhorou e se tornou uma estrela ainda maior. Foi quando nos mudamos para Los Angeles. Ele foi a muitos shows, fez filmes, inclusive um do James Bond. Ele adorava as equipes de filmagem. Chegou inclusive a receber um telegrama da rainha Elizabeth 2ª e depois do presidente americano Ronald Reagan.
Ele viveu até os 25 anos e meio. Quando partiu, eu e Andy ficamos perdidos, mas de formas diferentes. Andy não conseguia acreditar, mas eu sabia que estava chegando a hora. Costumava ficar perto dele enquanto dormia e chorava no escuro. Fiz isso muitas vezes.
Quando Hércules ainda estava vivo, eu tirei vários pelos dele e pus em um pote que guardei por anos. Costumava cheirar os pelos para sentir seu cheiro. Era uma forma de me confortar. Mas acho que Andy nunca superou a perda. Foi como perder seu braço direito. Uma parte dele que se foi junto com Hércules."
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