quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Acordo entre Colômbia e Farc pode pôr fim ao mais longo conflito interno do Ocidente

Aperto de mão que selou acordo (Foto: Yamil Lage/AFP/Getty Images)Image copyrightAFP
Image captionRaúl Castro (ao centro) intermediou aperto de mão entre Juan Manuel Santos (à esq.) e Timochenko
Em encontro intermediado pelo presidente de Cuba, Raúl Castro, o governo da Colômbia e as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) anunciaram que a paz será firmada em um prazo de seis meses.
As negociações estão ocorrendo em Havana desde 2012. Juan Manuel Santos, presidente colombiano, viajou nesta quarta à capital cubana para o anúncio, durante o qual ficou lado a lado com Rodrigo Londoño Echeverri, o "Timochenko", o mais importante comandante das Farc.
O acordo, lido pelo porta-voz do governo de Cuba, Rodolfo Benitez, prevê a criação de uma jurisdição especial para a paz, formada por magistrados colombianos e estrangeiros, para “acabar com a impunidade” e julgar crimes tanto de integrantes das Farc como do Exército do país.
O governo colombiano outorgará uma ampla anistia que, porém, não incluirá violações graves aos direitos humanos. As penas para delitos mais graves serão de 5 a 8 anos, em “condições especiais de restrição”, para aqueles que reconheçam culpa.
Para ter direito às condições especiais, os guerrilheiros deverão abandonar as armas em um período de 60 dias após o acordo ser firmado.
“Nós acordamos que em no máximo seis meses a negociação deve ser concluída e firmada em um acordo final”, disse o presidente colombiano, que defendeu a reparação às vitimas do conflito.
Image copyrightGetty
"É o fim da guerra mais longa do nosso continente. Um acordo que deve sentar as bases de uma paz estável e duradoura”, continuou Santos, que agradeceu as Farc pelo passo dado. “Somos adversários. Estamos em extremos diferentes. Mas hoje avançamos na mesma direção.”
Conheça abaixo os principais eventos deste que é considerado o mais longo conflito interno do Hemisfério Ocidental.

Guerra civil

1899-1902 - "A Guerra dos Mil Dias" entre liberais (que governaram entre 1861 e 1885) e conservadores, que assumiram o poder em 1885.
1948-1957 - Entre 250 mil e 300 mil pessoas mortas na guerra civil.
1958 - Conservadores e liberais chegam a um acordo e formam a Frente Nacional para acabar com a guerra civil.

Formação das guerrilhas

1964 - Exército Nacional de Libertação (ELN), de esquerda, e o Exército Maoista da Libertação do Povo (EPL) são fundados.
1965 - Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc, atualmente o maior grupo de guerrilha) é estabelecida.
1970 - Aliança Nacional do Povo é formada como um movimento de esquerda para enfrentar a Frente Nacional.
1971 - Surge o grupo guerrilheiro de esquerda M19.
Image copyrightGetty
Image captionSão muitos os desaparecidos na luta entre governo e das Farc
1978 - O presidente Julio Turbay (liberal) inicia o combate intensivo contra traficantes de drogas.

Os cartéis

1985 - Onze juízes e outras 90 pessoas são mortas depois que guerrilheiros do M19 invadem o Palácio da Justiça. Partido da União Patriota (UP) é formado.
1986 - Grupos paramilitares de direita iniciam uma série de assassinatos tendo como alvo políticos do UP em meio à violência de grupos de esquerda e de esquadrões da morte liderados por cartéis de traficantes de drogas.
BBC
Image captionPablo Escobar foi morto pela polícia em 1993
1989 - O M19 se transforma em um partido legalizado depois de um acordo de paz com o governo. Candidatos à presidência dos liberais e do UP são assassinados durante a campanha eleitoral, supostamente a mando dos cartéis de tráfico drogas; Cesar Gaviria é eleito graças ao seu programa eleitoral contra as drogas.
1993 - Pabro Escobar, líder do cartel de Medellin, é morto a tiros pela polícia enquanto tentava evitar a prisão.

Negociações e um plano

1998 - Andres Pastrana (conservador) é eleito presidente e inicia negociações de paz com os guerrilheiros. Ele garante às Farc um território seguro do tamanho da Suíça no sudeste do país para ajudar no progresso das negociações.
1999 - As negociações de paz são lançadas formalmente, mas o progresso é cheio de idas e vindas. Pastrana e o líder das Farc, Manuel Marulanda, se encontram.
2000 - O "Plano Colômbia" de Pastrana consegue uma verba de quase US$ 1 bilhão, principalmente em ajuda militar dos Estados Unidos, para combater o tráfico de drogas e os rebeldes que lucram com o tráfico.
2001 - Rebeldes das Farc libertam 359 policiais e soldados em troca de 14 rebeldes capturados. Depois, o governo e as Farc assinam o acordo de San Francisco, se comprometendo com um cessar-fogo.

Negociações fracassam

Image copyrightAFP
Image captionNegociações de paz com as Farc foram interrompidas e retomadas várias vezes
2002 - Pastrana interrompe três anos difíceis de negociações de paz com as Farc, depois do sequestro de um avião. Ele ordena que os rebeldes deixem a zona desmilitarizada e determina que o sul é zona de guerra depois que os rebeldes aumentam o número de ataques.
2002 - O candidato independente Alvaro Uribe vence as eleições presidenciais; ele intensifica o combate aos grupos rebeldes.
2003 - Combatentes do grupo de direita Autodefesas Unidas da Colômbia (AUC) começam o processo de desarmamento.
2004 - Ricardo Palmera, membro das Farc e mais importante guerrilheiro colombiano já capturado, é condenado a 35 anos de prisão. A AUC e o governo iniciam negociações de paz.
2005 - Uma nova lei oferece penas mais curtas e proteção contra extradição para paramilitares que entregam as armas. Grupos de direita afirmam que a legislação é muito complacente.
2006 - Líderes paramilitares detidos afirmam que se retiram do processo de paz. O governo diz que a desmobilização dos grupos de direita vai continuar.
2007 - Governo liberta dezenas de guerrilheiros das Farc na esperança de que os rebeldes libertem reféns. As Farc, entretanto, rejeitam a medida e dizem que só libertarão reféns se o governo retirar seus solados e estabelecer uma zona desmilitarizada.

Libertação de reféns

2007 - Em seu papel como mediador, o presidente venezuelano Hugo Chavez, concorda em convidar rebeldes para negociações para troca de prisioneiros. Como resultado, as Farc libertam duas reféns famosos, Clara Rojas e Consuelo Gonzalez, meses depois.
2008 - Um ataque no qual colombianos ultrapassaram a fronteira e foram até o Equador mata um importante líder das Farc, Raul Reyes, e desencadeia uma crise diplomática com o Equador e a Venezuela.
BBCImage copyrightBBC Ronachan Films
Image captionIngrid Betancourt foi libertada pelas Farc depois de seis anos de cativeiro
2008 - As Farc anunciam a morte de seu líder e fundador, Manuel Marulanda. O Exército colombiano resgata 15 reféns, incluindo a mais famosa do país, a política Ingrid Betancourt, prisioneira das Farc há seis anos.
2009 - Mais reféns famosos são libertados, incluindo um ex-governador de província e um cidadão sueco que seria o último refém estrangeiro do grupo. O presidente Alvaro Uribe afirma que retoma negociações de paz com o grupo se os rebeldes suspenderem suas "atividades criminosas".

Causa comum

2008 - Os grupos rebeldes marxistas (as Farc e o grupo menor, Exército Nacional de Libertação, ou ELN) anunciam que vão parar os combates entre eles e se concentrar em atacar as forças armadas da Colômbia.
2010 - Juan Manuel Santos assume a presidência; ele responde a uma oferta das Farc, de negociações de paz, insistindo que o grupo rebelde deve primeiro libertar todos os reféns que ainda tenha. Mas as Farc intensificam a campanha de violência. Um importante líder do grupo, Mono Jojoy, é morto por um ataque aéreo do governo.
2011 - As Farc libertam vários reféns no que descreve como um "gesto de paz" unilateral.
Image copyrightAlto Comisionado para la Paz de Colombia
Image captionNegociações de paz em Havana começaram ainda em 2012
2012 - Governo tem negociações preliminares com as Farc. O Congresso aprova em junho uma lei para facilitar o processo e os rebeldes das Farc declaram um cessar-fogo de dois meses, enquanto as negociações de paz formais com o governo começam em Cuba.
2013 - Um acordo é fechado entre as duas partes a respeito de reforma agrária, uma das questões mais polêmica do conflito. Eles também concordam com a futura participação polícia das Farc se o acordo de paz for realmente fechado.

Últimos passos

2014 - O presidente Santos vence outra eleição e conquista mais quatro anos no poder. Ele afirma que espera assinar um acordo de paz dentro de um ano.
Maio: É fechado em Havana um acordo sobre um dos pontos das negociações de paz, a eliminação da produção de drogas ilegais no país.
ReutersImage copyrightReuters
Image captionFarc e governo colombianos retomaram combates em 2015
Novembro: As Farc sequestram o general Rubén Dario Alzate junto com um civil. O governo suspende as negociações de paz, que são retomadas depois da libertação dos dois.
Dezembro: As Farc declaram cessar-fogo unilateral.
2015 - Março: Os dois lados concordam em trabalhar juntos para remover minas terrestres. A Colômbia é um dos países do mundo que mais tem minas terrestres.
Abril: O governo retoma ataques aéreos depois que as Farc matam 11 soldados em emboscada.
Maio: As Farc suspendem o cessar-fogo unilateral depois de alguns de seus membros morrerem em uma ofensiva aérea e terrestre do governo. Mas o grupo afirma que quer continuar as negociações de paz.
Julho: As Farc declaram outro cessar-fogo de um mês, que depois foi estendido sem um prazo final específico. O governo responde anunciando uma diminuição progressiva das hostilidades.
Setembro: Analistas relatam que julho e agosto tiveram os níveis mais baixos dos últimos 40 anos de violência relacionada ao conflito.

Nenhum comentário:

Postar um comentário