sábado, 27 de junho de 2015

Dilma viaja para os EUA em busca de investimentos em infraestrutura Força política da presidente divide opinião de analistas ouvidos pelo G1. CNI avalia que Brasil e EUA precisam de agenda econômica 'ambiciosa’.

Um ano e nove meses após cancelar uma visita de Estado, a presidente Dilma Rousseff embarca neste sábado (27) para os Estados Unidos com o objetivo de retomar as relações diplomáticas, atrair investimentos para concessões na área de infraestrutura (aeroportos, portos, rodovias e ferrovias) e impulsionar a economia.

O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, que integra a comitiva da presidente Dilma, foi internado na noite desta sexta-feira (26) no Hospital do Coração do Brasil, em Brasília, com suspeita de embolia pulmonar. Ele deixou o hospital na madrugada e, apesar do problema de saúde, poderá viajar aos Estados Unidos.
Pela programação inicial, divulgada pela Presidência, Dilma embarca para Nova York, onde permanecerá até a próxima segunda (29). Nos dois dias em que estiver na cidade, a presidente terá série de encontros com empresários brasileiros e norte-americanos.
Especialistas ouvidos pelo G1, contudo, divergem sobre o poder de negociação que Dilma terá diante de empresários norte-americanos e o presidente Barack Obama em razão do atual cenário econômico do Brasil.

Esta é a primeira vez que a Dilma fará visita oficial ao país após as denúncias de que agências de inteligência norte-americanas teriam espionado líderes mundiais, incluindo a própria presidente, há quase dois anos – ela chegou a estar no país duas vezes, mas para participar da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Considerado "questão do passado" pela presidente, o mal-estar diplomático, avaliam especialistas, não estará na pauta do encontro.
A presidente desembarcará na noite deste sábado em Nova York e retornará ao Brasil na próxima quarta (1º), após cumprir agenda em São Francisco.Nos quatro dias em que permanecerá nos Estados Unidos, Dilma terá compromissos em Nova York, Washington e São Francisco. Nas três cidades, terá encontros com empresários dos setores financeiro, manufatureiro, de investimentos, tecnologia e inovação.

Em meio às medidas de ajuste fiscal propostas pelo governo para reduzir os gastos da União, Dilma apresentará nos EUA o Plano de Investimentos em Logística, linformou o Ministério das Relações Exteriores. O plano foi lançado há cerca de duas semanas e prevê concessões em aeroportos, portos, rodovias e ferrovias – o pacote envolverá, segundo o governo, R$ 198,4 bilhões.

Os Estados Unidos são o segundo maior parceiro econômico do Brasil, com fluxo comercial (soma das exportações e importações) em torno de US$ 60 bilhões, atrás somente da China (US$ 77,9 bilhões).

Especialistas e representantes da indústria ouvidos pelo G1, porém, divergem sobre a força política que a presidente terá nos EUA para negociar acordos econômicos com o governo norte-americanos e os investidores do país.
Embaixador do Brasil em Washington, Roma (Itália) e Londres (Inglaterra) durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o diplomata Paulo de Tarso Flecha de Lima elogiou o fato de a presidente decidir ir aos Estados Unidos.
Por considerar o país o "o grande líder do mundo", Flecha de Lima disse que é preciso sempre manter o diálogo com os Estados Unidos.
Para o diplomata, o Brasil, sétima maior economia do mundo, "não é um paisinho qualquer", e, como presidente, Dilma tem "poder enorme". Ele avalia que a petista não chega "fragilizada" aos Estados Unidos em razão do atual cenário econômico, e ressalta que, eleita no ano passado, deve viajar "de cabeça erguida".

"A presidente Dilma não chega fragilizada aos Estados Unidos. Acho que ela, presidente do Brasil eleita com a maioria considerável dos votos, eleita democraticamente, tem todos os requisitos para ser nossa representante", disse.

Ao G1, Flecha de Lima afirmou que o Brasil perdeu "certo ativismo" no cenário internacional nos últimos anos, mas não o prestígio diante de líderes mundiais como Barack Obama. Ele avalia que Dilma poderá ter "muito êxito" na visita e obter resultados "positivos" para o Brasil.
 O professor do Instituto de Ciência Política e Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB) David Fleischer, entretanto, avalia que, com a aprovação da presidente em 10%, e em meio ao ajuste fiscal, o atual cenário político-econômico do Brasil pode gerar "muitas dúvidas" aos empresários norte-americanos.

Para ele, os investidores esperam ouvir da presidente durante os encontros garantias de que a situação econômica do Brasil vai melhorar nos próximos anos.
"Ela [Dilma] vai tentar vender o peixe para os empresários. Porém, ela está chegando com uma carga negativa muito forte, até mesmo em função de todo o problema na Petrobras e com a economia em parafuso", afirmou.
Política interna
Para o professor do Departamento de História da UnB Virgílio Arraes, especialista em Relações Internacionais, as questões políticas internas do Brasil, como a popularidade da presidente, "não são tão importantes" para os empresários norte-americanos.
Segundo ele, porém, o que pode "complicar" o Brasil na tentativa de atrair investimentos estrangeiros são questões tributárias. "Nós temos uma das mais altas taxas de juros do planeta, por exemplo. Isso, sim, pode complicar a atração de investimentos", disse.
Acho que o momento para vender o Brasil no exterior não é dos melhores. Neste ponto, o governo Lula tinha muito mais facilidades, surfava em uma onda de otimismo e prosperidade econômica. Agora, o momento é completamente diferente"
Paulo Velasco, professor da FGV
O professor do MBA de Relações Internacionais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Paulo Velasco diz que, "sem sombra de dúvida", a presidente chegará aos EUA "fragilizada" em função do atual momento econômico do país.
Para ele, o cenário é diferente do período em que o Brasil foi governado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o desafio de Dilma é mostrar que a economia brasileira vai "voltar aos trilhos".

"Acho que o momento para vender o Brasil no exterior não é dos melhores. Neste ponto, o governo Lula tinha muito mais facilidades, surfava em uma onda de otimismo e prosperidade econômica. Agora, o momento é completamente diferente, há grande desconfiança internacional e interna, e o objetivo principal de Dilma deve ser mostrar que o cenário econômico brasileiro tende a se estabilizar", afirmou.

Empresários
Responsável por organizar um dos seminários com empresários dos quais presidente Dilma participará nos EUA, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) avalia que, embora o Brasil passe pelo ajuste fiscal e a aprovação da petista seja a mais baixa desde que ela assumiu, a Presidência, os empresários norte-americanos "não olham o cenário de dois ou três anos". Para a entidade, os investidores do país têm tradição de fazer investimentos a longo prazo.
 Ao G1, o gerente-executivo de Comércio da CNI, Diego Bonomo, afirmou que os empresários querem ouvir da presidente uma sinalização política de que o governo brasileiro buscará junto à Casa Branca medidas que possam impulsionar acordos na área econômica. Para ele, tanto a indústria brasileira quanto a norte-americana aguardam "agenda econômica mais ambiciosa" dos dois governos.

Embora Dilma tenha anunciado esta semana o Plano Nacional de Exportações, Bonomo diz que não há "medidas milagrosas" para alavancar o comércio exterior no Brasil. Ele defende ações como o fim da bitributação.
Para o representante da CNI, o Plano de Investimento em Logística pode atrair investimentos, mas a presidente precisa dar garantias aos norte-americanos de que os projetos serão rentáveis nos próximos anos.

"No fundo, o que os Estados Unidos querem é ter uma agenda econômica mais ambiciosa com o Brasil. Toda a avaliação do governo americano e dos empresários com quem nós conversamos é de grande realismo. Eles sabem que a atual fase econômica do Brasil é temporária, é um período de ajuste, com um ou dois anos mais difíceis, mas nenhuma grande empresa norte-americana está aqui pensando no curto prazo", disse.

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