terça-feira, 9 de agosto de 2016

Conselheiro de Alckmin em privatização de metrô e trens é réu por cartel

Ex-presidente da CPTM Mário Bandeira responde a processos na Justiça Federal e na estadual, por improbidade administrativa e suposto envolvimento no esquema de cartel em licitações

por Rodrigo Gomes, da RBA publicado 08/08/2016 17:25, última modificação 08/08/2016 17:40

RENATO SILVESTRE(BANDEIRA)/MARCO AMBROSIO (ALCKMIN)/FOLHAPRESS
alckminebandeira


São Paulo – O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), mantém o ex-presidente da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) Mário Manuel Seabra Rodrigues Bandeira como conselheiro em colegiados em que é discutida a privatização de linhas da malha ferroviária. Bandeira é réu na Justiça Federal, em processo que investiga o esquema de cartel em licitações do Metrô, e na Justiça Estadual, por improbidade administrativa.
Bandeira integra tanto o Conselho Gestor do Programa Estadual de Parcerias Público-Privadas e do Conselho Diretor do Programa Estadual de Desestatização, segundo edições do Diário Oficial do Estado de São Paulo de 12 de abril, 19 de maio e 30 de junho deste ano. Ambos os colegiados respondem ao governador (leis 9.361/1996 e 11.688/2004). O ex-presidente da CPTM está registrado como assessor do secretário estadual de Planejamento e Gestão, Marcos Antonio Monteiro, atuando como seu substituto designado.
De acordo com atas publicadas no Diário Oficial do Estado de São Paulo, o conselho de Parcerias Público-Privadas atualmente discute a concessão das linhas 5-Lilás (Capão Redondo-Adolfo Pinheiro) e 17-Ouro (Jabaquara-Morumbi), do Metrô. E o conselho do Programa Estadual de Desestatização debate a privatização das linhas 9-Esmeralda (Osasco-Grajaú) e 8-Diamante (Júlio Prestes-Itapevi), da CPTM. Os órgãos discutem ainda privatizações na Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos (EMTU) e de aeroportos estaduais, entre outros temas.
Deles também participam o secretário de Governo de Alckmin, Saulo de Castro Abreu Filho, o procurador-geral do Estado, Elival da Silva Ramos, o secretário da Fazenda, Renato Augusto Villela dos Santos e secretário-adjunto da Casa Civil, Fabrício Cobra Arbex, substituindo o titular da pasta, Edson Aparecido dos Santos.
Bandeira foi afastado do comando da CPTM em janeiro de 2015, depois de a Polícia Federal (PF) indiciá-lo, junto com o ex-diretor da companhia José Luiz Lavorente e outros 31 funcionários e ex-funcionários das multinacionais Alstom, Siemens, Bombardier, Mitsui, CAF e Ttrans. As acusações dão de corrupção passiva e ativa, formação de cartel, crime licitatório, evasão de divisas e lavagem de dinheiro, por meio de um esquema de corrupção que funcionou entre 1998 e 2008, nos governos tucanos de Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin. O processo corre em sigilo na Justiça Federal.
Antes disso, o atual conselheiro de Alckmin se tornou réu na Justiça paulista por suposto ato de improbidade administrativa na assinatura de um aditamento contratual para aquisição de 12 trens da CPTM, por R$ 223 milhões, em sua primeira passagem pela empresa, entre 2003 e 2006. A CPTM havia contratado as empresas Asea Brown Boveri, Equipamentos de Tração Elétrica (ETE), ABB-Tracción, Construcciones Y Auxiliar de Ferrocarriles e GEC Alsthon Transporte, em 12 de janeiro de 1995, para fabricação de 30 trens.
Em 28 de dezembro de 2005, Bandeira autorizou um novo aditamento ao contrato para fornecimento de 12 trens, em vez de realizar uma nova concorrência. O Ministério Público de São Paulo considera que o procedimento, feito dez anos depois da assinatura do contrato e adquirindo composições diferentes das contratadas inicialmente, é ilegal. O processo ainda está tramitando na primeira instância da Justiça paulista.
Quando Bandeira foi indiciado pela PF, Alckmin (PSDB) exitou em destituí-lo do cargo, justificando que era preciso analisar os documentos da investigação para “não fazer nenhuma injustiça” e disse que o então presidente era “uma pessoa extremamente respeitada”.
A Secretaria de Planejamento e Gestão informou à RBA que Bandeira “não assessora o secretário de Planejamento, tampouco o substitui em qualquer função”. Embora ele conste como substituto de Monteiro nos comitês, no Diário Oficial, a pasta alega que “seu trabalho tanto na pasta quanto nos respectivos conselhos tem caráter consultivo na área de sistemas de mobilidade e na gestão de transporte de passageiros, razão pela qual presta assessoria em assuntos dessa espécie”. E concluiu dizendo que “todas as decisões dos comitês são tomadas exclusivamente pelo secretário responsável”.

Repercussão

Trabalhadores da CPTM demonstraram preocupação ao saber que o ex-presidente da companhia, afastado por denúncias de corrupção, aconselha o processo de privatização. "É um absurdo que alguém que responde a processo por corrupção seja membro de um grupo dessa importância. Isso demonstra falta de responsabilidade do governo", disse o presidente do Sindicato dos Ferroviários de São Paulo, Eluiz Alves de Matos. Para o presidente do Sindicato dos Ferroviários da Zona Sorocabana, Izac de Almeida, é como colocar "lobo para cuidar de ovelhas". "É uma total falta de transparência", afirmou.
O deputado estadual Alencar Santana (PT), presidente da Comissão de Infraestrutura da Assembleia Legislativa paulista, responsável por avaliar a concessão de uso de bens públicos, considera que a atuação de Bandeira nos comitês expõe como se entrelaçam o governo paulista e as fraudes na CPTM e no Metrô. "Ele foi afastado por estar sendo investigado por corrupção, mas vai atuar nas decisões sobre privatizações? O governador precisa esclarecer isso, afinal são conselhos que se submetem ao governo", afirmou.
Os metroviários também demonstraram indignação com a presença do ex-presidente nos conselhos. “Ter ele nos comitês que discutem a privatização do Metrô e da CPTM, sendo réu, é um símbolo de como esse processo é corrupto e só interessa àqueles que querem entregar as companhias à iniciativa privada. É uma situação lamentável”, afirmou Alex Fernandes, secretário-geral do Sindicato dos Metroviários de São Paulo.
Mário BandeiraO ex-presidente da CPTM é funcionário de carreira da Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô), onde ingressou em 1973. Atualmente, embora afastado de suas funções na companhia, recebe R$ 36.823,11 na condição de Especialista III da estatal, segundo o Portal da Transparência. O teto do funcionalismo estadual é R$ 21,6 mil, salário do governador.
Além da atuação nos conselhos citados, Bandeira também é conselheiro na empresa Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A), recebendo R$ 4.118 mensais, e na EMTU, com remuneração de R$ 6.177, de acordo com o Portal da Transparência. No dia 6 de julho, ele foi designado, pelo governador, para compor ainda o Conselho Estadual de Saneamento (Conesan).

Nenhum comentário:

Postar um comentário