A queda acentuada da bolsa de valores de Xangai, nesta semana, e o seu impacto global levantaram temores sobre a saúde da economia chinesa.
Além disso, a China desvalorizou a moeda local, o yuan, numa tentativa de tornar suas exportações mais competitivas após as vendas internacionais do país terem registrado queda. A produção interna também caiu.
Em dia menos tenso, o mercado financeiro de Xangai fechou em -1,3% nesta quarta-feira, mesmo após estímulos promovidos pelo governo, e a baixa foi acompanhada pelas bolsas europeias - mas não pelas americanas e pelo Ibovespa. Este último subiu 2,7%. Mas analistas preveem que a volatilidade continuará nos mercados internacionais.
Seria o fim do milagre chinês? Não, opina John Ross, professor do Instituto de Estudos Financeiros Chongyang da Universidade Renmin, de Pequim, em entrevista à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC.
"A China está crescendo a 6,5% ou 7%, três vezes mais do que os Estados Unidos e quatro vezes mais que a Europa. É uma economia que tem saído de um ritmo de crescimento 'super sensacional' de 10% por ano para um 'sensacional', que é o atual", disse Ross.
Outro dado comparativo: enquanto Estados Unidos e Europa têm taxas de juros de quase zero para estimular suas economias há quase sete anos, a China reduziu sua principal taxa de juro em 0,25 ponto percentual, para 4,6%.
Mas isso não significa que não haja problemas na China. E, devido ao papel central que desempenha no comércio global, um recuo em sua economia tem consequências em todo o mundo, Brasil incluído.
O futuro da segunda maior economia do mundo depende da solução de quatro temas-chave:
1. Queda de investimentos e mudança de modelo de crescimento
O crescimento econômico chinês nos últimos dez anos sedeve muito mais ao investimento do que à exportação de produtos 'Made in China'. Neste período, o país teve um ritmo impressionante de crescimento de dois dígitos.
O investimento aumentou durante a crise financeira de 2008 - representava 35% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2000 e ultrapassou os 50% após a queda do banco de investimentos americano Lehman Brothers.
Em comparação, o consumo interno como motor do crescimento mal superou os 30% neste período.
Uma economia baseada excessivamente no investimento pode estimular bolhas imobiliárias, dívidas insustentáveis e problemas financeiros.
Consciente dos limites deste modelo, o governo iniciou em 2010 uma transição a outro, mais baseado no crescimento do consumo interno.
Segundo Kamel Mellahi, especialista em mercados emergentes da britânica Warwick Business School, os problemas chineses que causam temores no mundo são fruto dos inevitáveis desajustes produzidos por essa mudança.
"Uma mudança num país das dimensões da China é mais fácil de propor que de executar. O mundo vai ter que se adaptar a esses altos e baixos porque vai levar tempo", disse.
2. Desvalorização e exportações
O sinal de alarme sobre a China soou forte com a desvalorização cambial realizada em agosto.
Em junho, as exportações caíram 8,3% devido a queda da demanda mundial e alta do custo de trabalho chinês, consequência da mudança do modelo que estipula aumentos salariais para estimular o consumo.
Em 11 de agosto, o Banco Central chinês iniciou um processo de desvalorização do yuan que se prolongou por três dias. A cotação da moeda caiu 3%, e gerou-se um temor global de uma "guerra cambial" - quando países desvalorizam suas moedas para ganhar vantagem competitiva para suas exportações.
Muitos analistas avaliam que a desvalorização está mais vinculada ao desejo chinês de resposicionar o yuan como divisa internacional, incorporando-a às moedas com direitos especiais de giro do Fundo Monetário Internacional (FMI). Até agora, apenas euro, libra, iene e dólar americano têm essa classificação.
"É uma estratégia a longo prazo para situar o yuan neste cenário", disse Mellahi.
Com uma moeda atada ao valor do dólar, a China sofreu com a valorização da moeda americana nos últimos 12 meses, que encareceu sua própria moeda em cerca de 10%.
Mas desvalorizar a moeda até recuperar esse valor tornaria a dívida do país insustentável.
3. Dívida e inflação
Um dos efeitos mais perigosos do modelo baseado no investimento é a emissão de títulos de dívida necessária para sustentá-lo, algo que pode sair do controle.
Há outro perigo concreto que enfrenta a economia chinesa: deflação. Os preços médios têm caído nos últimos 40 meses.
Este fenômeno pode levar a um processo deflacionário, no qual uma empresa teria que vender seus produtos por menos do que pagou por eles, o que aumentaria o montante de sua dívida e o perigo de falências.
4. Desemprego
Um fator estratégico para o governo chinês é o nível de desemprego, crucial para a paz social - e um dos debates sobre a mudança do modelo econômico chinês é o impacto que ele terá no mercado de trabalho.
Segundo dados oficiais, a taxa de desemprego variou pouco nos últimos cinco anos. Em 2014, foi de 4,09%, pouco mais alta que os 4,05% registrados em 2013.
Mas o Labour China Bulletin (LCB), editado em Hong Kong e especializado em assuntos trabalhistas, diz que esse índice subestima o número real de desempregados.
"O índice oficial registra apenas o número de pessoas que buscam emprego em relação ao total de empregados urbanos. Ignora os trabalhadores rurais, os imigrantes e os que têm trabalho parcial ou casual", disse.
De acordo com o FT Confidential, serviço de investigações do jornal Financial Times, houve uma contração da demanda de trabalho em julho.
Segundo Mellahi, a "China tem uma linha vermelha: o emprego. Se a situação piorar e afetar o nível de emprego, então, vai ser irresistível a tentação de voltar a estimular a economia com um novo plano de investimento em infraestrutura".
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