Os advogados de Marcelo Odebrecht, denunciado na Operação Lava Jato sob as acusações de participar de organização criminosa e praticar corrupção ativa e lavagem de dinheiro, escolheram uma tática bizarra para defender seu cliente. Poderia se tratar apenas uma excêntrica manobra diversionista para evitar encarar os fatos – não fosse o que ela revela, ao mesmo tempo, de arrogância e delírio paranoico. Marcelo teria, por lei, o direito de ficar calado no depoimento que prestou na última sexta-feira ao juiz Sérgio Moro, da 13.a Vara da Justiça Federal em Curitiba. O direito ao silêncio é uma prerrogativa sacrossanta da defesa, para evitar que os réus produzam declarações que depois sejam usadas para incriminá-los. Em vez de lançar mão desse direito – algo legítimo e compreensível –, a defesa de Marcelo preferiu responder por escrito às acusações do Ministério Público Federal (MPF), que constam da denúncia apresentada no final de julho.
Como num jogo de faz-de-conta, os advogados assumiram o papel de policiais, promotores e juízes. Elaboraram um questionário com 60 perguntas, intitulado “Interrogatório de Marcelo Bahia Odebrecht”. Não foi, por óbvio, um interrogatório real, mas uma elaboração dos argumentos da defesa, com perguntas fictícias atribuídas a algum interrogador. O documento – apresentado ao juiz Moro na sexta-feira e distribuído à imprensa antes do interrogatório real, para valer – vai de questões anódinas sobre a formação de Marcelo, seu conhecimento dos envolvidos na Lava Jato ou a descrição do funcionamento do Grupo Odebrecht e chega a perguntas mais específicas, formuladas e selecionadas pelos advogados, a respeito do conteúdo da denúncia.
Há explicações as mais variadas para algumas das anotações comprometedoras que estavam no iPhone de Marcelo, apreendido pela Polícia Federal por ocasião de sua prisão. Já comparei o iPhone de Marcelo a uma espécie de Pedra de Rosetta da Lava Jato – se decifrado na íntegra, ele poderia contar boa parte da história da corrupção na Petrobras. Mas, como eles mesmos elaboraram as perguntas, os advogados de Marcelo se restringiram a tentar desvendar as anotações apontadas na denúncia do MPF.
Eles tentam explicar, de modo às vezes convincente, outras não, algumas sequências enigmáticas de caracteres que intrigaram os procuradores – como “RA vs cc Sw (direção fluxo? Delação dos envolvidos?)”; “Sw (CNO vs Pessoal vs RA vs as dos BOs? PKB?)…” ou “Swiss: Pic (declarar ctas já) RA, PKB…)”. Sustentam que as três notas têm relação com o desejo de Marcelo de investigar internamente as menções na delação premiada de Rafael Ângulo, um dos portadores de dinheiro do doleiro Alberto Youssef, a documentos de operações no exterior (conhecidos como “swifts”) recolhidos na Braskem, uma empresa do Grupo Odebrecht, e ao banco suíço PKB. Afirmam que a célebre anotação “Ações B… trabalhar para parar/anular (dissidentes PF …)” não traduz a vontade de interferir nas investigações, mas apenas de saber se as divergências na PF poderiam ser aproveitadas pela defesa dos acusados para interrompê-las ou anulá-las. Dizem que “Higienizar apetrechos MF e RA” era um lembrete para necessidade de fazer uma varredura para verificar se executivos da Odebrecht eram alvo de grampos ilegais. E por aí vai.
As informações do iPhone de Marcelo são, é claro, muito mais abundantes. Não há, nas respostas dos advogados, nenhuma explicação para anotações enigmáticas como “Deixar prédios com Vaca”; “40 para vaca (parte para Feira)”; “Créditos Vaccari e pagtos diretos” e outras do tipo. Um interrogatório real teria servido para desvendá-las de modo definitivo. Poderia ter servido, em especial, para elucidar a mais comprometedora – e, surpeendetemente menos enigmática – das anotações, situada entre menções aos nomes de “Edinho”, “Haddad” e “Adams”: “MRF: dizer do risco cta suíça chegar campanha dela?”. Marcelo, infelizmente, não esclareceu, afinal, quem é "ela".
No momento em que se sentou diante de Moro para falar, ele preferiu fazer um pequeno discurso, em que proclamava sua inocência e se dizia vítima de uma prisão arbitrária, com base em provas inconsistentes. Moro tentou algumas vezes interrompê-lo, mas ele se recusou a parar sua arenga. No momento em que, finalmente, Moro pôde formular suas perguntas, Marcelo recusou-se a respondê-las, sem porém invocar seu direito ao silêncio. Dizia apenas que suas respostas haviam todas sido entregues por escrito.
Houve como que uma inversão de papeis. Marcelo se arrogou não apenas um direito que, por lei, cabe ao juiz – formular as perguntas. Também se recusou a dar qualquer resposta que não tivesse sido previamente aprovada e analisada por seus advogados. As três perguntas que Moro tentou fazer ficaram no ar. Em vez do silêncio, Marcelo adotou uma atitude que – embora disfarçada sob o manto da cooperação com a Justiça, por apresentar respostas por escrito –, desafiou a autoridade do juiz, por impedi-lo de proceder às perguntas. Uma atitude arrogante, disfaçada de cooperação. Em vez de um interrogatório real, tivemos um “interrrogatório” de faz-de-conta.
Quer se der o trabalho de ler e analisar a denúncia do Ministério Público, poderá encontrar nela diversas falhas (já escrevi sobre isso aqui). Mas as acusações centrais são inequívocas e estão embasadas num minucioso trabalho de rastramento do caminho do dinheiro, realizado com a cooperação do Ministério Público da Confederação, na Suíça. Estão lá as empresas de fachada, as contas secretas, as datas e valores das transferências e toda a complexa engenharia financeira usada para conduzir o dinheiro da Odebrecht às contas de Pedro Barusco, Renato Duque, Paulo Roberto Costa, Jorge Zelada e Nestor Cerveró. Entre aqueles que receberam o dinheiro, vários já declararam em depoimentos que se tratava de propina relativa à obtenção de contratos na Petrobras. Não há defesa contra esses fatos. Há, tão-somente, a negativa atribuída a Marcelo por seus advogados" "Jamais orientaria esse tipo de confuta ilegal. Esta acusação é profundamente injusta".
Diante de fatos semelhantes, empreiteiros de renome como Ricardo Pessôa, da UTC, ou Dalton Avancini, da Camargo Corrêa, decidiram colaborar com a Justiça e contar a verdade. A Camargo Corrêa decidiu até mesmo fechar um acordo de leniência com as autoridades reguladoras, para tentar limpar seu nome no mercado e afastar o fantasma da Lava Jato de seus negócios no futuro. Trata-se, antes de tudo, de uma questão de sobrevivência empresarial.
Qual é, em situação similar, a reação de Marcelo? Ele prefere negar os fatos, construir uma realidade paralela em que sempre será inocente, atribuir sua prisão a uma perseguição das autoridades e inventar um faz-de-conta que serve apenas para desafiar o poder da Justiça. Aparentemente, não está em seus planos admitir que errou, como fizeram os demais empreiteiros, contar a verdade e pagar o preço disso. Marcelo sempre manifestou preocupação com o futuro de sua empresa e com o exemplo que deixará às futuras gerações. Ninguém sabe o que acontecerá até o final da Lava Jato. Mas, se ele persistir em sua atitude, o preço que a empresa pagará pode ser altíssimo. Com o acúmulo de processos – até mesmo nos Estados Unidos –, é a sobevivência do Grupo Odebrecht que está em jogo. Que exemplo transmitirá então Marcelo de dentro da cadeia?
Sinopse leve, boa informação com objetivo de dar cara nova ao padrão comportamental de leitura Blogger.
segunda-feira, 2 de novembro de 2015
O faz-de-conta de Marcelo Odebrecht
Todo líder esquerdista é um ressentido e um invejoso, mas não tem a menor competência para ficar rico senão através do roubo. Mas roubo na esfera pública, é claro, sem riscos ou perigos, com a garantia de não poder sequer ser demitido, pois além da passividade do povo, que ele mesmo produziu ao destruir a educação, sempre pode contar com o auxílio de políticos cúmplices e a defesa de inúmeros "advogados do diabo". O esquerdista é um burguês do dinheiro dos outros. Como dizia Margaret Thatcher: "Todo esquerdista é um incompetente fracassado que acha que as pessoas de sucesso lhe devem alguma coisa".
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