A inédita prisão de um senador em exercício, o petista Delcídio do Amaral (MS), sob a acusação de atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato, espalhou apreensão em Brasília. Enquanto parte dos 37 políticos com foro privilegiado investigados pelo esquema temem ter o mesmo destino de Delcídio, outro grupo, os que ainda são aliados de Rousseff, sem falar do próprio Planalto, preveem dias difíceis com o desenrolar imprevisível da apuração e paralisia nas votações do Congresso consideradas urgentes para o Governo.
“Quem deve com certeza tem medo do que pode acontecer nos próximos dias. Esse não é o meu caso, mas sei que a cada dia o clima de suspense aumenta por aqui”, afirmou o deputado Júlio Delgado (PSB-MG), um dos deputados alvo da operação. “Aqui está um clima de cada um por si. Todos só pensam em salvar a si mesmo”, disse reservadamente outro parlamentar.
Há 13 investigados pela Lava Jato no Senado e 24 na Câmara, incluindo os dois presidentes de cada Casa, Renan Calheiros (PMDB-RN) e Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Todos contam os dias para terem seus casos concluídos pelo Ministério Público Federal, enquanto, no Planalto Central, ainda ecoam as palavras da ministra do STF Cármen Lúcia durante seu voto favorável à prisão de Delcídio. “Houve um momento em que a maioria de nós brasileiros acreditou num mote segundo o qual uma esperança tinha vencido o medo. Depois, nos deparamos com a ação penal 470 [o mensalão petista] e descobrimos que o cinismo tinha vencido aquela esperança. Agora parece-se constatar que o escárnio venceu o cinismo. O crime não vencerá a Justiça”, escreveu ela. O recado aos políticos foi direto: "Não se confunde imunidade com impunidade".
No Palácio do Planalto, além da preocupação com o nível da atividade no Congresso, há discussões sobre como o PT tem atacado Delcídio e se essa é a melhor saída para evitar a contaminação do Governo com os casos de corrupção. Em reunião fechada com ministros e parlamentares na quarta-feira passada, Rousseff disse que “não vai macular o governo para defender A ou B”, mas a mensagem foi clara: isso não significava que seus auxiliares estavam liberados para destratar o senador detido. O risco seria provocar um desfecho ainda pior: que o parlamentar decidisse fazer um acordo de delação premiada e revelasse a suposta extensão do esquema dentro do Executivo.
Meta fiscal 2015Os opositores tentam colar exatamente essa imagem na gestão petista. “O Delcídio já tinha seu caso arquivado pelo Supremo [Tribunal Federal]. Para mim, está claro que ele não negociava com o filho do Cerveró para si próprio, mas para o Governo da presidenta Dilma”, analisou o deputado Rubens Bueno (PPS-PR).
A prisão de Delcídio teve efeito pior, neste momento, para o Governo Dilma Rousseff (PT) do que qualquer ação de seus opositores ou investidas do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). A principal preocupação dos governistas é a não aprovação da meta fiscal de 2015 que autoriza a União, Estados e Municípios a fecharem o ano com um déficit de 119,9 bilhões de reais. Além da enorme contratempo legal, a não aprovação embute um risco político. Sem esse projeto aprovado em sessão conjunta do Congresso Nacional, a tese do impeachment presidencial volta a crescer porque irregularidades fiscais teriam de ser feitas para concluir o ano. Se isso ocorrer, Rousseff poderia ser acusada de crime de responsabilidade fiscal.
O projeto estava previsto para ser votado na última quarta-feira, porém, o Legislativo brasileiro ficou paralisado com a detenção de Delcídio, que era, até então, o líder do Governo no Senado, e a reunião foi suspensa. Assim, o prazo para a meta ser aprovada ainda este ano fica mais apertado. São só nove sessões até o início do recesso parlamentar, em 22 de dezembro. Caso não seja aprovado, o Governo diz que recorrerá ao Judiciário para evitar ser punido.
“Para pagarmos tudo que devemos, precisamos fazer um novo contingenciamento [bloqueio de verbas] no Orçamento, que prejudicaria os investimentos e a prestação de serviços pelo Estado. Entendemos, inclusive, que a questão é passível de questionamentos jurídicos”, afirmou o secretário do Tesouro Nacional, Marcelo Saintive, para a Agência Brasil.
Dos sete congressistas ouvidos pela reportagem, seis dizem acreditar que dificilmente as propostas do ajuste fiscal conseguirão ser aprovadas neste ano. “Há uma onda negativa, mas não podemos nos deixar abater. Temos de correr atrás de aprovar as propostas de interesse do país”, afirmou o vice-líder do Governo no Senado, Telmário Mota (PDT-RR).
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