sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Beltrame vira réu em caso de improbidade administrativa Denúncia de contratos superfaturados na compra de viaturas foi aceita. Secretário de Segurança disse que está à disposição para esclarecimento

O juiz Marcelo Martins Evaristo da Silva, da 7ª Vara de Fazenda Pública, aceitou a denúncia de improbidade adminstrativa contra o secretário de Segurança do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame. A informação foi divulgada pela "Veja" e confirmada nesta quarta-feira (14) pelo Tribunal de Justiça do Rio.
Segundo o Ministério Público, Beltrame é responsável por dois contratos supostamente superfaturados na aquisição e manutenção de viaturas da Polícia Militar firmados entre 2007 e 2008.
No primeiro, a secretaria gastou R$ 28,4 milhões para a compra de viaturas e R$ 56,7 milhões com a manutenção. O MP concluiu que o preço da manutenção de cada carro, pelo prazo de 30 meses, daria para comprar dois veículos novos.
No segundo contrato, a secretaria pagou R$ 107,6 milhões pelo carros e gastou R$ 78 milhões na revisão de 779 veículos. Um custo de R$ 3,3 mil por mês para a conservação de cada carro da polícia.
O juiz que aceitou a denúncia indeferiu, no entanto, o pedido do promotor Rogério Pacheco Alves de bloqueio de bens e devolução de cerca de R$ 135 milhões aos cofres públicos. Segundo o magistrado, não há "parâmetros minimamente seguros para dimensionar o prejuízo", o que tornaria "prematura e excessivamente onerosa" a decisão.
Cinco réus
Além de Beltrame, são réus o Governo do Rio de Janeiro, a ex-secretária de gestão de estratégia da Seseg, Suzy Avellar, e as empresas Júlio Simões Transportes e logística e CS Brasil também foram denunciadas. O secretário e os demais serão citados para apresentar contestação, de acordo com a Justiça.
Procurado pelo G1, o secretário informou que está à disposição para "total esclarecimento dos fatos" e aguarda notificação da decisão judicial. Quando foi denunciado, em 2014, Beltrame enviou uma longa nota se defendendo (leia no fim da reportagem). A equipe de reportagem ainda não conseguiu contato com os outros acusados.
O juiz que aceitou a denúncia indeferiu, no entanto, o pedido do promotor Rogério Pacheco Alves de bloqueio de bens e devolução de cerca de R$ 135 milhões aos cofres públicos. Segundo o magistrado, não há "parâmetros minimamente seguros para dimensionar o prejuízo", o que tornaria "prematura e excessivamente onerosa" a decisão.
Segundo o MP, na comparação entre os contratos, os valores cobrados para manutenção das viaturas superou em quase o dobro o valor das próprias viaturas. Além disso, foi cobrada a manutenção dos veículos mesmo que não houvesse necessidade do serviço.
Leia a íntegra da nota enviada por Beltrame em 2014:
"A respeito das acusações do Ministério Público com relação ao primeiro contrato de gestão da frota de carros da Polícia Militar, gostaria de fazer algumas considerações antes que a visão do titular da ação tome conta do juízo das pessoas não acostumadas com o tema.
Em primeiro lugar, a decisão do Estado do Rio de comprar automóveis para sua polícia e incluir o serviço de manutenção é uma prática nova. Até para quem fiscaliza. Portanto, pode causar estranhamento, aliás, como causou ao promotor do Ministério Público.
Carros de polícia são mais do que um simples carro. Além de carregar equipamentos específicos, estes carros têm uma função primordial que é muitas vezes esquecida pelo senso comum. Carro de polícia é também equipamento de segurança para o policial. Numa situação de confronto, de perseguição, de abordagem é a vida do profissional que está em jogo e o uso do carro faz parte do contexto do risco.
O estado brasileiro, e principalmente o Rio de Janeiro, sempre tratou a questão da segurança do trabalho do policial com desleixo, como se fosse o menos importante. Se quisermos profissionalismo e correção na polícia, o carro - e todo o resto - tem de estar funcionando nas condições adequadas ao exercício da profissão.
Não é difícil resgatar na memória - pois o cenário é recente - carros de patrulha caindo aos pedaços circulando pelas ruas da cidade. E, na época, nenhum sinal de indignação dos órgãos de controle. O Rio, a sociedade, o promotor que agora nos acusa, ninguém indagava, à época, aquela penúria. Até hoje lutamos para que o policial tenha todos os seus equipamentos de segurança no mais perfeito estado, sem concessões. É um resgate lento, pois custa caro aos cofres públicos. Segurança Pública, que respeita a democracia, dentro da lei, custa caro.
Mas tais argumentos justificam comprar equipamentos a qualquer preço, com valores absurdos ou fora da realidade do mercado? Claro que não! O que causou estranhamento com os valores dos carros é a visão curta do problema. Precisamos de carros que estejam sempre em condições, se não ideais, bem perto disso. Isso significa deixar o equipamento num nível de conservação muito mais elevado do que acostumamos a exigir.

Um carro de polícia, que roda o dia inteiro, dura em média 14 meses, um pouco mais, um pouco menos. E já a partir do décimo mês, a maioria estará circulando no limite do padrão que consideramos seguro. Há hoje muitos carros das UPPs, por exemplo, comprados fora do contrato de manutenção, que aguardam consertos. Enquanto a burocracia não anda e a solução não chega, o policial vai ficar a pé ou vai  buscar outros meios, que nem nós e nem a sociedade toleramos mais. É contra essa lógica perversa, que afeta o policial e o serviço prestado à população, que estamos lutando. E qual é o custo disso? Ele tem de entrar na conta.
O contrato é agora questionado porque, segundo a tese de acusação, poderíamos comprar três carros (três editais, três licitações) que se degradarão com o tempo, no lugar da gestão da frota, que tem a manutenção do nível de serviços como princípio. O custo x benefício não é só valor de compra. Na lógica antiga de comprar e depois jogar fora, a PM mantinha um batalhão de funcionários apenas para fazer reparos. Isso foi motivo de chacota no passado, além de retirar policiais da atividade fim, num momento em que a população quer sua polícia nas ruas. Esta foi uma economia enorme que o promotor não considerou.
Pelo contrato atual, carros destruídos são repostos, carros em conserto são substituídos. Ao fim do período, 30 meses, toda a frota fica com o Estado. Funciona assim até hoje. Ou seja, hoje há muito mais carros na patrulha de rua do que na lógica anterior. Quando chegamos, em 2007, metade da frota da PM estava parada aguardando conserto! Por esse raciocínio, poderíamos dizer que carros sem contrato de manutenção custam o dobro, pois, na prática, só a metade funciona. Portanto, não foi uma compra que custou o preço de três. Sem manutenção, para ter o resultado na rua dos três carros que o promotor diz que poderíamos comprar, na verdade teríamos de comprar seis carros novos. Pergunto então: o que é mais eficiente?
Há ainda uma série de fatores técnicos que poderia explicar aqui, mas isto vai ficar para a defesa caso a denúncia faça sentido para a Justiça. Reitero que não existe situação perfeita quando tratamos de gestão pública. É uma luta diária para fazer a máquina funcionar. E na hora de fazer melhor, além de cuidar do melhor preço -  há uma série de leis e normas que controlam a ação do gestor - existem outros fatores que precisam ser considerados. Errados são aqueles que acham que, para as questões de Estado, as contas se resumem ao mesmo preço de tabela do consumidor individual."

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