Jorge Oliveira
Estoril, Portugal - Noaldo Dantas, de saudosa memória, não cansava de repetir, para deleite da plateia, quando via um colega com o rei na barriga: “O jornalista é um miserável importante”. Frasista dos bons, não sei se posso atribuir-lhe a autoria dessa pérola mas que é verdade não há dúvida. Lula, quando fala que “se juntar todos os jornalistas da Veja e da Época não dão 10% da sua honestidade”, não quer atingir apenas os profissionais dessas duas revistas, mas também os jornalistas que usaram seus veículos de comunicação para levá-lo ao poder. Fala de cadeira porque muitos ele cooptou para o seu governo.
Portanto, conhece a vulnerabilidade de cada um dos seus seguidores.Na verdade, dois candidatos à presidência da república contaram com os teclados submissos e generosos de muitos jornalistas no Brasil: Collor e Lula. O primeiro atraiu muitos colegas de redação com a guerra contra os marajás. Convidava-os em lote para visitar Alagoas, onde uma estrutura de comunicação se encarregava de encantá-los com os projetos de moralização do seu governo garantindo a mídia favorável nos jornais e revistas.
O Lula apareceu como líder dos trabalhadores do ABC e logo virou atração de modernidade para a esquerda festiva e burguesa e dos jornalistas deslumbrados que viram no PT a marca da contestação ao regime militar e o rompimento ideológico com antigos partidos, como o PCB, por exemplo.
Veja que o vermelho não é diferente do colorido. A prova disso é que ambos estão juntos hoje em dia. E partiu de Lula a iniciativa de se aproximar de Collor para que ele ajudasse o PT a se estabilizar no poder, postura tão diferente daquela quando incentivou o Zé Dirceu e seus militantes caninos a provocar a CPI do PC Farias que terminou com o impeachment do seu atual amigo. Lula não se conformava ter perdido a eleição para Collor em um debate desastroso em que gaguejou durante todo o tempo, mesmo acostumado aos grandes confrontos.Pois bem, Lula fala de cadeira quando direciona seus mísseis para os jornalistas.
O único equívoco é quando generaliza. Nem todos os profissionais comem ou comeram no seu cocho de mandioca. Mas uma boa parte sim, diga-se. Com a sua chegada ao governo, muitos dos seus adeptos largaram as redações e seguiram o mestre na sua escalada ao poder. Foram coerentes: defenderam as ideias de Lula nas redações às custas dos patrões que os remuneravam e depois foram se aboletar nas repartições a soldo do erário.
Lula aparelhou o estado distribuindo estrategicamente os jornalistas que lhes prestavam obediência nos órgãos estatais. Aos colunistas políticos mais conhecidos, ele deu posição de destaque no seu governo. Entregou a alguns, inclusive, os cargos de comando nas empresas de comunicação do governo.
Usou e abusou de todos eles e depois descartou-os como rolete chupado. Muitos, desiludidos e frustrados, hoje estão na oposição. Coisa feia. Cospem no prato que comeram. Uma indelicadeza com o chefe. Agora, doze anos depois, surge uma nova geração de jornalistas independentes nas redações que só conhece de Lula e do PT os atos de corrupção. É para esses jornalistas novos, apartidários, que Lula se lança ao ataque com seu contingente de guerrilheiros vermelhos da comunicação na rede dos blogs chapas-brancas financiados pelos órgãos públicos.
Imoralidade
Na trincheira de Lula, tentando erguer envergonhadamente a bandeira da moralidade, estão muitos jornalistas medíocres que foram se abastecer nas tetas do governo. São dessas tetas que provêm seus sustentos. Nada seria demais se o trabalho desses profissionais visassem apenas a divulgação isenta da notícia dos órgãos estatais. O que se vê, porém, é a utilização da máquina do governo para difamar e ameaçar autoridades constituídas que investigam a corrupção ou pessoas de bem que divergem do caminho desastroso que os petistas levam o país.
ServilismoÉ assim, diante dessa submissão e do servilismos doentio de alguns profissionais de imprensa, que vivem à sombra das benesses petistas, que o jornalista brasileiro deixa de ser um miserável importante, para se transformar, infelizmente, apenas em miserável.
ServilismoÉ assim, diante dessa submissão e do servilismos doentio de alguns profissionais de imprensa, que vivem à sombra das benesses petistas, que o jornalista brasileiro deixa de ser um miserável importante, para se transformar, infelizmente, apenas em miserável.
Nocivos
Já que falamos dos jornalistas cooptados por Lula para o seu exército vermelho da comunicação chapa-branca, nada mais natural do que comentar também sobre os patrões da imprensa, vassalos que vivem a soldo do governo desde que o Brasil é república. Quem resumiu muito bem o caráter dos donos de jornais nas últimas década foi o escritor Graciliano Ramos lá pelos anos de 1950, quando era revisor do Correio da Manhã, no Rio, um dos jornais mais influentes do país à época. Avesso a bajulações, sisudo, conciso, amargo e cortante, como se mostra em seus textos literários, Mestre Graça foi convidado por Paulo Bitencourt, o dono do jornal, para fazer uma saudação em nome dos empregados numa data festiva do periódico.
Sabedoria
Graciliano relutou. Dizia modestamente não ter o dom da oratória. Paulo, porém, insistiu que o alagoano falasse para a plateia que se aglomerava no local da festança aos gritos de “fala”, “fala”, “fala”..., quando o autor de Vidas Secas, profundamente encabulado pelo apupo, interrompeu a animação e iniciou suas primeiras palavras:
- Paulo, de todos os patrões que já tive, você é o menos filho da puta que conheço...”
A síntese
O discurso lacônico do Mestre Graça pode ser a síntese do que o povo brasileiro pensa dos seus empresários da mídia. A história da imprensa no Brasil mostra, pelos menos nas últimas décadas, que alguns donos de jornais foram mais perversos e danosos ao povo brasileiro do que mesmo os tiranos que em momentos diversos ocuparam o poder no país. Veja alguns exemplos: Carlos Lacerda, na Tribuna da Imprensa, espinafrou Getúlio Vargas até levá-lo ao suicídio, enquanto Samuel Wainer o defendia na Ultima Hora, jornal criado com dinheiro do BB facilitado por Vargas; Assis Chateaubriand, criador dos Diários Associados, achacava empresários e governo para manter o seu poderio de comunicação, como revela Fernando Morais no Chatô, o Rei do Brasil; Os Frias, do grupo Folha de São Paulo, mantinham Notícias Populares para empregar policiais da repressão; o Estado de S. Paulo defendeu em seus editoriais a tomada do poder pelo regime militar; e o Roberto Marinho, o mais astuto de todos eles, aliou-se à ditadura para expandir seu império.
As benesses
Como se vê, cada grupo sempre defendeu interesses próprios. Como a televisão, como força popular e de persuasão, ainda engatinhava, os jornais deram as cartas durante muito tempo com a palavra final da verdade. Enquanto um grupo atacava determinado governo, outro defendia para se abastecer das verbas publicitárias e das benesses do submundo oferecidas tanto por governos militares como civis. Dono de jornal nunca teve ideologia nem partido. Ele se movimenta pela conta bancária. Seu interesse, ao contrário do que pensam os ingênuos, nunca foi o de defender os interesses do povo e nem o de estar ao seu lado, mas expandir seus impérios de comunicação para formar um poder paralelo, como fazem até hoje, em proporções menores, os grupos que dominam a comunicação no país.
A farsa
Imprensa independente é balela. A mais independente de todos os tempos, os jornais alternativos editados durante a ditadura, desapareceu com ela. O conteúdo que vendia, a contestação ao regime, acabou. Com o fim do militarismo, a pauta desses jornais se esgotou e eles começaram a ficar iguais à imprensa convencional e, por causa disso, sucumbiram, deixaram de ser alternativos.
Dias contados
Mas não devemos confundir imprensa com liberdade de imprensa. Esta deve ser defendida com unhas e dentes contra todas as tentativas de silenciá-la por governos déspotas ou pela esquerda festiva. A imprensa escrita, a do Gutemberg, infelizmente está com os dias contados com o surgimento da globalização que digitaliza a notícia em tempo real. Essa nova geração não quer sujar as mãos com tinta, como faz diariamente o pequeno contingente de velhos e saudosos leitores de jornais.
Manipulação
Mas a imprensa brasileira – pelos menos os três grupos mais importantes desse segmento – procura caminhos alternativos ao do papel impresso. E não se engane, durante muito tempo essas organizações ainda vão mandar no país, mexendo no tabuleiro do poder ao seu bel-prazer. E nós, os mortais, ainda seremos manipulados por elas por várias décadas.
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