segunda-feira, 7 de novembro de 2016

Força de um candidato é a fraqueza do outro no duelo de propostas nos EUA

Edição do dia 07/11/2016
07/11/2016 21h39 - Atualizado em 07/11/2016 21h39

Eleição é uma das mais polarizadas dos últimos anos nos EUA. Diferença de posicionamento entre os candidatos democrata e republicano é acentuada.


Nesta terça-feira (8), os Estados Unidos vão eleger o seu 45º presidente. E, como acontece desde 2004, o Jornal Nacional acompanha esse momento histórico na cidade onde estão jornalistas do mundo todo.
A importância do cargo de presidente dos Estados Unidos, por si, justifica a presença da imprensa mundial em Washington. Mas essa eleição tem um grau de interesse maior por causa da polarização da disputa. A diferença de posicionamento entre os candidatos democrata e republicano em 2016 é muito mais acentuada. A campanha eleitoral deste ano tem uma agressividade muito grande.
Os eleitores que participam dos comícios têm perfis diferentes, mas principalmente os discursos dos candidatos são muito diferentes.  No sábado (5) à noite, a equipe do JN foi ao comício da Hillary Clinton, na Filadélfia. O tema geral dos discursos era, basicamente, o de que Hillary é a candidata mais preparada, mais experiente no trato dos grandes temas nacionais e internacionais, e que vai cuidar do bem-estar social, da saúde, da educação.
Teve discursos de artista, teve show de Katy Perry, uma estrela pop, uma jovem, e o público era muito diversificado. Não tinha uma característica predominante que saltasse aos olhos.
Já no domingo (6), no comício de Trump, era tudo muito diferente. A equipe do JN foi para Leesburg, no estado da Virgínia. O local do comício era uma espécie de parque de exposições com acesso por uma alameda estreita. A polícia bloqueou esse acesso num determinado momento e a equipe teve que ir a pé. Foi parecido com o que aconteceu com a equipe do JN em 2008, num comício de Obama.
O comício de Trump tem diferenças muito claras em relação ao da Hillary. No dele, os discursos eram só de políticos. Não tinha artista. O tema que mais se repetiu era o de reafirmação dos Estados Unidos como uma potência militar que precisa ser respeitada e do uso dessa força militar. É um discurso agressivo: “vamos esmagar esse terror dos radicais islâmicos como se deve”, “vamos construir o muro na fronteira com o México”, “vamos recuperar os empregos que os chineses nos tiraram nos últimos anos”.  E palavras de ordem e cartazes contra Hillary: "Lock her up"  (prendam-na), “Ela mente, os e-mails não”, “Impeachment para o Obama” e “Vamos fazer a América ser grande de novo”.
Também teve discurso de Oliver North, que foi um militar envolvido em operações secretas e ultra polêmicas na década de 1980. Hoje ele é um comentarista político aliado com os republicanos. E o público chamava atenção por uma coisa: era todo de pessoas brancas, de 3 a 4 mil. Os organizadores falavam em 9 mil. E a nossa equipe só viu um homem negro. Ele estava trabalhando, parecia ser um funcionário do centro de exposições.

Trump chegou com umas três horas de atraso, passava da meia-noite. Falou por muito mais tempo do que Hillary no comício dela e foi festejado como um herói ou um super-herói. Teve gente que passou muitas horas de pé para vê-lo de perto. Numa eleição com a população dividida, é possível sentir que aquilo que o eleitor de Trump vê como um ponto forte dele, o eleitor de Hillary enxerga como maior defeito do Trump e vice-versa.
À esquerda, pelo Partido Democrata, Hillary Clinton, 69 anos, mulher, advogada, ex-primeira-dama, ex-secretária de Estado, ex-senadora.
À direita, pelo Partido Republicano, Donald Trump, 70 anos, bilionário do ramo da construção civil, ex-astro de televisão.  
O cientista político Ian Bremmer acha que "os dois têm personalidades e experiências que são, ao mesmo tempo, fatores positivos ou negativos para os diferentes grupos de eleitores".
Donald Trump conquistou milhões de eleitores investindo na imagem de um candidato que diz tudo o que pensa, que é autêntico, que é sincero. Mas para outros milhões de eleitores, isso é assustador, porque o discurso dele é de xenofobia, de racismo, de intolerância.
Algumas declarações dele nessa campanha espantaram o mundo. Trump chamou os mexicanos de traficantes, criminosos, estupradores. E, do jeito dele, fez uma ressalva para aliviar. Disse que "alguns são boas pessoas”.

Bremmer explica que o americano médio que quer votar em Trump vê o candidato como a resposta para tudo que está errado com Washington. Alguém que diz o que pensa mesmo que isso crie problemas.
Cada movimento da campanha de Hillary Clinton costuma ser muito estudado, muito cuidadoso. Ela não é uma candidata de sair muito do script. Isso ajuda a explicar por que nas pesquisas de opinião a candidatura dela é vista como mais segura, menos arriscada. Só que para as pessoas que querem mudar tudo na política, isso não chega a ser uma vantagem.
“Para quem acredita que o sistema é corrupto, arcaico e não funciona, ela é a candidata mais integrada ao sistema que você pode ter", diz Bremmer. "Isso pode ser negativo para ela", acrescenta.
Trump cultiva a imagem do não-político e faz questão de ressaltar que é rico, muito rico, bilionário.
O cientista político explica que essa imagem, para muitos eleitores, representa a concretização do sonho americano.
"Trump é uma pessoa com quem o americano médio consegue se identificar, é ‘gente como a gente’. Pode ser uma sensação falsa, mas faz sucesso principalmente com os eleitores brancos de nível educacional mais baixo”, afirma.
Mas o currículo do magnata tem manchas. Uma sequência de pedidos de falência ou a revelação de que, no período de um ano, perdeu quase US$ 1 bilhão.
Na secretaria de Estado, Hillary viajou o mundo como a diplomata mais graduada dos Estados Unidos por quatro anos. Ela estava no centro das tomadas de decisão quando tropas de elite mataram Osama bin Laden.
Mas os críticos lembram fracassos americanos no Iraque e na Síria e a formação do grupo terrorista Estado Islâmico nos últimos anos.
O ataque ao posto diplomático em Benghazi, na Líbia, é visto não só como falha, mas como uma tentativa da então secretária de Estado de enganar o público ao demorar a reconhecer que o país tinha sofrido um atentado.
A falta de confiança do eleitorado em Hillary é uma das maiores fraquezas dela. E ter usado um e-mail pessoal para tratar de assuntos de governo alimentou a imagem de uma candidata pouco transparente.
Só que o adversário dela também causa essa mesma impressão.
"O problema com Trump é o nível de incerteza sobre o tamanho do estrago que ele pode causar se virar presidente", diz Ian Bremmer. "Com Hillary, o problema é que as pessoas consideram que ela não é confiável porque acha que as regras não se aplicam a ela", acrescenta.
E isso tudo ajuda a explicar por que depois de mais de um ano de campanhas com ataques pessoais e escândalos, mais da metade dos americanos não gosta de Hillary, e uma parcela maior ainda rejeita Trump
.

Nenhum comentário:

Postar um comentário