Brasilia
Cunha na quinta-feira, quando renunciou. UESLEI MARCELINO REUTERS
A renúncia de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da presidência da Câmara dos Deputados tinha, em um primeiro momento, o objetivo de garantir que ele poderia eleger seu sucessor e manter o seu mandato. Um dia após a decisão ser anunciada, porém, o cenário é muito mais confuso do que ele ou qualquer analista político poderia prever. Há uma luta fratricida no Legislativo e uma extensa lista com nomes de possíveis candidatos. Na última contagem de lideranças partidárias, 25 nomes foram postos. Eles representam cinco grupos bastante heterogêneos: as siglas organizadas no centrão, o PMDB, a antiga oposição (PSDB e DEM, entre outros), a nova oposição (PT, PC do B e agregados), além do baixíssimo clero, desgarrados de todos os grupos anteriores, mas numerosos o suficiente para serem relevantes.
O fim de semana será de intensa negociação entre todos eles e entre os representantes do Governo interino de Michel Temer, que têm preferência por dois deles: Rogério Rosso (PSD-DF) e Osmar Serraglio (PMDB-PR).
O cenário atual é o seguinte: o centrão, uma confluência de partidos conservadores idealizada pelo próprio Cunha (entre eles PSC, PSD, PTB, PP, PR e PRB), é o mais rachado até o momento. Já lançou ao menos sete nomes e demonstrou pouco interesse em fortalecer uma candidatura única. O Solidariedade, por exemplo, já abandonou esse grupo político do qual era um dos principais membros, e lançou um nome próprio.
O PMDB, por sua vez, tenta não interferir diretamente no pleito porque entende que seria o momento de fortalecer partidos aliados e recuperar a presidência da Câmara em 2017, quando o mandato não será tampão - quem for eleito apenas complementará o que falta desde período, que termina em fevereiro. Os peemedebistas, contudo, ameaçam que, se não houver um consenso entre a base do presidente interino Michel Temer (PMDB), podem lançar um nome. Quatro peemedebistas estão entre os possíveis candidatos.
Entre a antiga oposição (PSDB, PPS, PSB e DEM) que hoje possui cargos importantes na gestão Temer, há oito pretensos concorrentes. O discurso deles, no entanto, é que de que formam o grupo mais unido entre os cinco que tramitam na Casa e estimam que até segunda ou terça-feira apenas um nome será apresentado.
Do lado da nova oposição, formada pelos apoiadores do mandato da presidenta Dilma Rousseff – como o PT, o PCdoB e o PDT – ou de legendas consideradas independentes – como PSOL e REDE – há ao menos dois nomes postos. Ambos já admitem que poderiam abrir mão de candidaturas, caso haja um consenso de não eleger um aliado de Cunha e que esse candidato tenha um perfil conciliador, não de desagregador, como era o ex-presidente. A situação está tão embaralhada na Câmara que um incomum acordo entre tucanos e petistas pode ocorrer, se não no primeiro turno da disputa, ao menos no segundo. “É difícil fazer acordo com petistas, mas como não temos um nome que seria de consenso, como um Ulysses Guimarães, não podemos correr o risco de ter um preposto do Cunha aqui”, disse ao EL PAÍS um deputado do PSDB se referindo ao ex-presidente da Câmara, morto em 1992, que era quase uma unanimidade entre os legisladores brasileiros.
A confusão é tanta que o baixíssimo clero pode ser o fiel da balança na eleição. No parlamento são chamados do bloco do eu sozinho e ressuscitaram após amorte política de Cunha – antes eles haviam se aglutinado no centrão. Agora, o grupo, o mesmo que elegeu Severino Cavalcanti para a presidência em 2005, está de volta. São deputados que não necessariamente respeitam as orientações de suas legendas e fazem o jogo político pensando apenas em causa própria. “São os que só querem receber ‘bombons”, brincou um experiente deputado. Os bombons citados por ele são cargos em comissões e indicações para funções públicas principalmente em suas bases eleitorais. É o velho grupo que atua de maneira mais direta com o toma-lá-dá-cá.
Nas contas de alguns parlamentares, essa congregação tem entre 80 e 100 votos. Cinco de seus membros já ameaçam concorrer ao cargo de presidente da Câmara. Um sexto, o atual presidente interino Waldir Maranhão (PP-MA), chegou a cogitar essa hipótese, apesar de sua passagem sofrível pelo cargo, humilhado pelos colegas e vetado na presidência das sessões. Alheio a isso, Maranhão até se reuniu com Temer para saber se teria o seu apoio. Ouviu um sonoro não, sob a justificativa (ainda que nem tão verdadeira) de que o Executivo não vai interferir no processo do Legislativo.
A revolta de Maranhão
Não seria o único ato de resistência de Maranhão. Rompido com Cunha, ele resolveu fazer valer sua autoridade e atrapalhar os planos do antigo aliado. O resultado é que nem a data da eleição para a presidência da Câmara está clara. Maranhão diz que ocorrerá no dia 14, quinta-feira, e assinou dois atos com essa decisão. Já parte das lideranças partidárias dizem que será no dia 12. Em tese, o que vale é o que diz o presidente.
A disputa sobre o tema começou na quinta-feira. Capitaneados pelas lideranças do centrão, um grupo tentou agilizar a escolha do novo presidente da Câmara. Em uma reunião de última hora após a renúncia de Cunha, decidiram que passariam por cima da decisão do presidente interino Maranhão e que a eleição ocorreria na próxima terça-feira.
A intenção era beneficiar Eduardo Cunha. A ideia era marcar a eleição no mesmo dia em que estava prevista votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) que decidirá se o processo de cassação de Cunha aprovado no Conselho de Ética é nulo ou não. Se o plano funcionasse, a sobreposição de agenda acabaria, possivelmente, por empurrar a nova sessão da CCJ só para agosto.
A cereja do bolo para rebeldia de Maranhão foi ter sido chamado por Cunha de “bizarro”. O ex-presidente da Casa também que a Câmara estava “acéfala”. Maranhão impôs, como raras vezes no cargo, sua autoridade e mandou recolher todas as urnas que os líderes partidários haviam mandado instalar no plenário da Câmara. “Vou cumprir o regimento e a Constituição, teremos eleição na câmara. Está mantida para quinta-feira”, disse o deputado.
Além disso, demitiu o servidor público Silvio Avelino do cargo de diretor da Secretaria Geral da Mesa. Avelino fora empossado na função por Cunha e foi exonerado porque participou da reunião de líderes que queria impor a data da eleição a contragosto do presidente interino. Seu substituto deve ser um ex-funcionário de um deputado petista. “Concordemos com o Maranhão ou não, nós não podemos humilhá-lo, como fez o Eduardo Cunha. Agora, temos de dar suporte e garantir que ele consiga conduzir ao menos o processo eleitoral da Casa”, disse um deputado petista.
OS 25 POSSÍVEIS CANDIDATOS
Os sete nomes do Centrão: Rogério Rosso (PSD-DF), Jovair Arantes (PTB-GO), Cristiane Brasil (PTB-RJ), Francisco Giacobo (PR-PR), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), Espiridião Amim (PP-SC), Beto Mansur (PRB-SP).
Os quatro nomes do PMDB: Osmar Serraglio (PMDB-PR), Baleia Rossi (PMDB-SP), Marcelo Castro (PMDB-PI) e Carlos Marun (PMDB-MS).
Os oito nomes da antiga oposição: Rodrigo Maia (DEM-RJ), José Carlos Aleluia (DEM-BA), Antonio Imbassahy (PSDB-BA), Jutahy Júnior (PSDB-BA), Rubens Bueno (PPS-PR), Júlio Delgado (PSB-MG), Heráclito Fortes (PSB-PI) e Hugo Leal (PSB-RJ).
Os dois nomes da nova oposição: Chico Alencar (PSOL-RJ) e Alessandro Molon (REDE-RJ).
Os quatro nomes do baixo clero: Carlos Manato (SD-ES), Milton Monti (PR-SP), Fausto Pinatto (PP-SP) e Carlos Henrique Gaguim (PTN-TO).
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