terça-feira, 12 de maio de 2015

Gritaria e o “sentimento” do doleiro Youssef na viagem da CPI a Curitiba Delator da Lava Jato reafirma que Planalto sabia de desvios, mas diz não ter provas disso

Alberto Youssef na sessão da CPI em Curitiba. / RODOLFO BUHRER (REUTERS)
No primeiro dia de sessões da CPI da Petrobras em Curitiba, epicentro das investigações da Operação Lava Jato, o saldo foi magro. Gritaria, perguntas insólitas e troca de acusações emolduraram o longo depoimento do doleiro Alberto Youssef, peça-chave no caso, que repetiu informações já conhecidas, mas voltou a constranger o Governo e o PT ao reafirmar que os esquemas de desvios da estatal  “serviam aos interesses do partido [PT] e da base aliada”. Youssef fechou acordo de delação premiada com Justiça, que inclui apresentação de provas de suas denúncias, mas disse aos deputados da comissão não poder comprovar suas acusações contra o Planalto. "A opinião é minha, é meu sentimento. Agora, provas eu não tenho."
A CPI, de já abalada credibilidade pela blindagem de acusados do PMDB, teve de lidar com outro revés, o fato de que o relator da comissão, o petista Luiz Sérgio, ter sido convocado como testemunha de defesa do ex-tesoureiro do partido, João Vaccari Neto, preso preventivamente por suposta participação nos desvios da Petrobras. Nos corredores, vários dos parlamentares julgavam "urgente e necessária" uma escolha de Luiz Sérgio - ou o testemunho, ou a permanência na relatoria da CPI.
“Pedirei para que o meu nome seja excluído. Se não houver a possibilidade, me julgarei impedido”, se comprometeu o petista do Rio, que se esquivava das câmaras. Ele afirmou que sua indicação como testemunha foi um erro e justificou sua proximidade com Vaccari: “Normal, [o contato de parlamentares com tesoureiros de seus partidos], durante o período eleitoral há uma choradeira permanente de candidatos que dizem que estão sem recursos para campanha”.

"O senhor é o Papai Noel?"

“O senhor é o Papai Noel?”, perguntou o deputado Delegado Waldir (PSDB) ao ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró. “É que fica doando apartamento por aí...", completou, em referência à transferência de imóveis feita pelo acusado na Lava Jato a parentes antes de ser preso. Esse trecho do interrogatório de Cerveró, que já havia anunciado que permaneceria calado, dá dimensão do circo armado na sessão em Curitiba que constrangeu a audiência. Waldir interpelaria ainda Cerveró, apontando seus sapatos "de 500 reais", e o chamando de "bonitão" com "esse terno caro". 
Coube também a Waldir elaborar uma pergunta para "entender a coincidência" de tantos protagonistas dos esquemas de corrupção e da investigação serem naturais da cidade paranaense de Londrina, que acumula casos de corrupção e lavagem de dinheiro, mas também desenvolveu práticas de vigilância e investigação.  “Tem coisas que a gente não explica, elas acontecem naturalmente”, respondeu, serenamente, Alberto Youssef, protagonista de outro escândalo, o do Banestado, arrancando risadas da plateia. 
Houve também momentos de tensão. Durante o depoimento do combalido empresário Mario Goes, que está preso no complexo médico de Curitiba, houve um rápido entrevero entre o advogado David Teixeira e deputados que insistiam em perguntar, apesar da prerrogativa de ficar em silêncio adotada pelo depoente. A discussão virou uma gritaria, com dedos em riste e acusações mútuas de falta de decoro e desacato.
A sessão de interrogatórios, que correu sem intervalos ao longo do dia, foi aberta perto das 9h. O de Youssef levou quatro horas. O doleiro negou ter qualquer contato com o ex-ministro da Fazenda Antônio Palocci, mas voltou a citar repasses para a campanha dos senadores Gleisy Hoffman (PT) e Valdir Raupp (PMDB) e integrantes do PT. Ele disse nunca ter tido contato com o presidente do Senado, Renan Calheiros, e não conhecer o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, ambos do PMDB. No caso de Cunha, afirmou ter repassado valores para campanha indiretamente, a pedido do empreiteiro Julio Camargo. Segundo deputados da CPI ouvidos por esse jornal, a convocatória de Julio Camargo tem sido barrada pela cúpula da CPI, dominada por aliados. Pela sede da Justiça Federal, em Curitiba, onde acontecem os interrogatórios, passaram ainda o empresário Mario Goes, o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró, Fernando Baiano, acusado de intermediar o recebimento de propinas para o PMDB, e os empresários Guilherme Esteves e Adir Assad. Nenhum deles respondeu a perguntas dos deputados. A última convocada, a operadora Iara Galdino, falou, admitiu culpa por contratar laranjas, mas afirmou que a delação que a incriminam por 90 contratos é "mentirosa".O doleiro foi questionado ainda sobre sua participação em outro escândalo, o do Banestado, em 2004, quando teve o benefício da delação premiada pela primeira vez. A aceitação de Youssef pela segunda vez como delator é um dos pontos questionados pelos defensores dos acusados na Lava Jato para tentar invalidar suas denúncias.
Os depoimentos da CPI continuam até quarta-feira, se o cronograma for cumprido à risca. Nesta terça, Carlos Habib Chater, dono do posto em Brasília que batizou a operação da Polícia Federal fala -ou não- com os deputados. Além dele, responderão aos questionamentos da comissão a doleira Nelma Kodama, o operador René Luiz Pereira, os ex-deputados Luiz Argôlo (SDD), André Vargas (sem partido) e Pedro Corrêa (PP).

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