O largo Eixo Monumental de Brasília que passa pelo Congresso Nacional e pelo Palácio do Planalto parece uma coleção de estandartes de blocos carnavalescos. Em mais de duas dezenas de postes há cartazes de centrais sindicais reclamando das medidas do Governo Dilma Rousseff que afetam os trabalhadores. A pressão dessas entidades já dura quase cinco meses e, agora, começa a surtir efeitos.
A presidenta Rousseff, que desistiu de fazer um discurso televisionado no dia dos trabalhadores por temer protestos, iniciou um movimento de reaproximação das centrais sindicais. Nesta quinta, ela se encontrou com os principais representantes e anunciou a criação de um fórum multissetorial para discutir políticas de emprego, trabalho e previdência.
No discurso que durou cerca de 20 minutos, ela defendeu a necessidade das medidas de ajuste fiscal que o Governo tem adotado para reequilibrar as contas públicas, justificando que elas são "essenciais" para recuperar o crescimento econômico. Entre as propostas estão as duas MPs que alteram o acesso da população a benefícios trabalhistas, como seguro-desemprego, pensão por morte e abono salarial. "É importante afirmar que nós mantivemos os direitos trabalhistas, mantivemos os direitos previdenciários e mantivemos nossas políticas sociais. O que nós propusemos ao Congresso Nacional foram correções nas políticas de seguridade social para evitar distorções e excessos, não para tirar direitos dos trabalhadores", disse.
A principal mudança foi na redução dos prazos de carência (que é o período de vínculo formal) que os funcionários terão de cumprir para ter acesso ao seguro-desemprego e ao abono salarial. A MP 665 previa que o trabalhador dispensado sem justa causa só poderia solicitar o seguro-desemprego depois de 18 meses de trabalho ininterruptos nos dois anos anteriores à demissão. O relator dessa medida, o senador Paulo Rocha (PT-RS) reduziu a carência para 12 meses de trabalho.As duas novas regras, as MPs 664 e 665, devem ser votadas na próxima semana no Congresso Nacional e, se aprovadas como querem os relatores das propostas, abrirão mão de 3,2 bilhões dos 18 bilhões de reais previstos inicialmente do ajuste fiscal orquestrado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy.
Entre as outras mudanças sugeridas pelos relatores estão: a redução do prazo mínimo para contribuição para que a pensão por morte seja concedida ao cônjuge; a obrigação da empresa pagar 30 dias de salário para o funcionário afastado por doença e a ampliação do tempo de pagamento de pensões por faixa etária. “São medidas que centrais sindicais e especialistas nos pediam. Analisamos o assunto e decidimos alterar isso na MP”, afirmou o relator da MP 664, o deputado Carlos Zarattini (PT-SP).
Apesar dos esforços da base governista, parte das centrais ainda reclama das MPs. Na terça-feira, um grupo de presidentes de confederações se reuniu com o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para tratar dessa questão e do projeto que regula a terceirização de trabalhadores. Após essa reunião, o presidente da Centra Única dos Trabalhadores (CUT) disse que as centrais não vão tolerar a retirada de direitos. “Não vamos permitir que o governo faça ajuste fiscal no lombo dos trabalhadores dificultando o acesso a direitos adquiridos”.
A pressão continuou na quarta-feira, quando um grupo de 15 manifestantes protestou durante a audiência pública da Comissão de Finanças da Câmara na qual era ouvido o ministro da Fazenda. Os militantes levantaram cartazes pedindo que a presidenta não mexesse em direitos como seguro desemprego, abono salarial e seguro defeso (esse para pescadores). Os últimos dois temas continuam em suspensão. Não está claro como eles serão tratados pelos congressistas nas sessões de votação da semana que vem.
Os esforços do Governo abrangem também a atuação de Levy. Nas últimas semanas ele tem participado de encontros com empresários e entidades de classe para apresentar o pacote de ajuste econômico da gestão petista. Com relação às medidas 664 e 665 ele disse nesta quarta-feira na audiência da Câmara: “Ninguém está passando a conta para o trabalhador. Estamos buscando medidas para crescer e para diminuir o desemprego”. (Colaborou Heloísa Mendonça)
Ministro diz que grau de investimento depende de pacote fiscal
A. B.
Sem o pacote fiscal o Brasil pode perder o grau de investimento. O alerta, com um tom de cobrança, foi feito pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, a deputados federais que participaram de uma audiência com ele na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, nesta quarta-feira em Brasília. Não bastou o alerta, Levy fez questão de mostrar uma apresentação na qual dizia com letras maiúsculas em amarelo sob um fundo vermelho da importância de manter o investment grade.
O panorama apresentado por Levy aos deputados da comissão não era nada animador. “Os gastos foram maiores do que a receita no ano passado”, explicou o ministro. Por isso, diz que o ajuste é necessário. “Desde que recebemos oinvestment grade aumentamos os investimentos estrangeiros. Não podemos perder isso”, defendeu Levy aos deputados. Na audiência, o ministro apresentar uma tabela mostrando que, em 2007, antes de receber a nota positiva de agências de classificação de riscos, o Brasil recebeu 35 bilhões de dólares de investimento estrangeiro. No ano passado, esse valor subiu para 62 bilhões.
No mesmo dia em que o Fundo Monetário Internacional anunciou que o Brasil deve ter a pior desaceleração da economia em 20 anos, o ministro também reforçou que o Governo conta com o apoio dos congressistas para reduzir as desonerações. Anualmente o Brasil deixa de receber 113 bilhões de reais em impostos. “O valor equivale a mais de sete vezes o programa habitacional Minha Casa Minha Vida. Precisamos rever essas desonerações”, ressaltou Levy.
Desse total, 25,2 bilhões ocorrem por conta da desoneração da folha de pagamento dos trabalhadores. Dentro do pacote fiscal elaborado pela equipe econômica há a previsão de reduzir essa renúncia fiscal para 12,4 bilhões. Dessa forma, haveria a redução de número de beneficiados pela renúncia, cairia de 89.000 empresas para 56.000.
Essas alterações já deveriam ter entrado em vigor por meio de uma medida provisória, a 669. Ocorre que o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), devolveu o texto ao Planalto por entender que a matéria não deveria ser analisada em regime de urgência, como queria a gestão Dilma Rousseff (PT). Dessa forma, o Governo agora pressiona o Congresso para votar o assunto e tentar economizar esses recursos.
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