sábado, 4 de fevereiro de 2017

Cresce o número de policiais civis que buscam ajuda psicológica no DF




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No ano passado, a Policlínica da PCDF fez 4.134 consultas psicológicas ou psiquiátricas, 17,4% a mais que em 2015



Estresse, endividamento, frustração. Esses são os principais motivos que têm levado parte dos policiais do DF a adoecer e, em casos extremos, tirar a própria vida. O caso mais recente que se tem notícia é de um PM da reserva que se matou em uma rodovia movimentada perto de Samambaia, em 26 de janeiro. Um dia antes, um policial civil tentou suicídio. Muitos têm buscado socorro médico. Para se ter ideia, diariamente, é realizada uma média de 11 consultas por psiquiatras e psicólogos na Policlínica da PCDF. O número cresce a cada dia e preocupa a corporação.
Dos 28.218 atendimentos aos policiais feitos pela policlínica no ano passado, 4.134 (14,6%) foram consultas com psicólogos ou psiquiatras — 11 por dia. O número é 17,4% maior do que em 2015, que fechou em 3.520. Entre 2015 e o ano passado, foram 7.654 atendimentos médicos nas duas especialidades voltados para a corporação composta por 5 mil policiais.


Os casos de suicídio também são motivo de preocupação. O Sindicato dos Policias Civis do DF (Sinpol) diz não ter acesso ao número oficial de agentes que se mataram nos últimos anos. Mas a estimativa é de que, de 10 mortes envolvendo policiais civis entre 2015 e 2016, metade tenha sido causada pela própria vítima. A corporação admite dois casos neste período.
Para o sindicato, o quadro, apesar de grave, estaria sendo negligenciado pela corporação. De acordo com o Sinpol, o atendimento prestado pela policlínica, por exemplo, é precário, especialmente porque a quantidade de médicos seria insuficiente para atender as demandas. “Se algum policial tiver problemas ou até algum surto e não conseguir tratamento estará desassistido, pois também não temos plano de saúde”, reclama Rodrigo Franco, presidente do sindicato.
Franco garante que o bom funcionamento da policlínica é essencial para que armas sejam retiradas de policiais que estão em acompanhamento, mas que os agentes não estariam conseguindo atendimento psiquiátrico adequado.
Nós, como sindicato, comunicamos a direção quando há algum problema e tentamos as consultas, porque é um risco para o policial, para a família dele e para a sociedade, pois são pessoas armadas"
Rodrigo Franco, presidente do Sinpol
O presidente do Sinpol elenca os motivos que mais levam ao adoecimento dos agentes. “Ser policial é uma vocação. Muitas vezes, não conseguimos dar a resposta que gostaríamos à sociedade e isso nos frustra. Também tem a questão do estresse da rotina de trabalho, que agrava ainda mais o quadro”, ressalta.
A diretora da Policlínica da PCDF, Zildinai França de Oliveira, nega que os acompanhamentos estejam suspensos ou com falhas, como acusa o Sinpol. Perita médica, ela também afirma que o quadro de pessoal, de 40 servidores, é suficiente para suprir a demanda. Diz ainda que, somente no mês de janeiro, a policlínica fez 152 atendimentos psicológicos e psiquiátricos.
 A policlínica oferece consultas e tratamentos com psicólogos, psiquiatras, fisioterapeutas, dentistas, além de atendimento assistencial e médicos peritos. Em 2015, a equipe que trabalha no local começou um acompanhamento de diagnóstico preventivo. O primeiro contato com os policiais é feito nas delegacias e, dependendo do quadro de saúde, os agentes são encaminhados para tratamento na policlínica.
Mais importante do que cuidar das consequências é estabelecer as causas dos problemas e evitá-las. Estamos fazendo o diagnóstico da corporação e criando políticas de prevenção"
Giovanna Bembom/Metrópoles
GIOVANNA BEMBOM/METRÓPOLES                                                                                                                                                                                                   
Zildenai de Oliveira, diretora da Policlínica da Polícia Civil do DF
A diretora ressalta que os dados sobre o nível de estresse dentro da corporação ainda estão sendo elaborados e, segundo ela, no ano passado, dois policiais tiraram a própria vida. “Oferecemos um tratamento continuado com apoio, suporte e prevenção. Trabalhamos para que esse índice seja de zero”, explica.

Polícia Militar
Na PM, os casos de adoecimento por questões psicológicas também não são exceções. A Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares do DF (Aspra) oferece atendimento psicológico aos militares. Apesar de não fazer levantamento da quantidade de casos, o vice-presidente, Manoel Sansão, afirma que a demanda é crescente.
O serviço é estressante, tenso, a escala é puxada. Além dos policiais, oferecemos o tratamento aos familiares e percebemos que eles precisam cada vez mais, pois vivemos em uma segurança pública abandonada em todo o país"
Manoel Sansão, vice-presidente da Aspra
Procurada, a Polícia Militar informou que não se pronunciaria sobre o tema por “ser este um assunto ainda tratado com sigilo médico”.
“Por que os policiais se matam”
Há poucas pesquisas sobre os problemas psicológicos enfrentados por policiais no país. Uma das mais recentes foi realizada em 2015 pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). A instituição elaborou um diagnóstico sobre suicídios de policiais militares do estado.
A pesquisa “Por que os policiais se matam” mostrou que, de 224 PMs ouvidos, 22% afirmaram já terem pensado em suicídio. O estudo foi realizado por cinco psicólogos da PMRJ e pesquisadores da universidade com a proposta de elaborar um plano de prevenção do comportamento suicida.
Facebook/Reprodução
Douglas Vieira, policial militar que se matou no Rio e transmitiu o suicídio pela internet

No dia 29 de janeiro, um caso ocorrido no Rio de Janeiro chocou o país. O PM Douglas Vieira, 28 anos, transmitiu o suicídio ao vivo pela internet. Antes, ele havia relatado que estava passando por dificuldades financeiras por conta da falta de pagamento de salários pelo governo do Rio.
Integrante do Departamento de Psicologia Clínica da UERJ, o professor Ademir Pacelli Ferreira garante que policial é uma profissão de risco e com tendência a levar os profissionais à depressão. Ele ressalta que o acompanhamento psicológico dentro das corporação não deve ser obrigatório, mas é essencial que seja oferecido.
Eles (policiais) são vítimas de si mesmo. É importante ter o trabalho dentro das unidades para melhorar as condições psíquicas de cada um e, consequentemente, das famílias e da sociedade"
Ademir Pacelli Ferreira, pesquisador da UERJ

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