segunda-feira, 4 de julho de 2016

PT "esquece" ex-deputado gaúcho preso na Operação Custo Brasil

Colegas de partido têm mantido distância do ex-tesoureiro Paulo Ferreira

Por: Carlos Rollsing e Guilherme Mazui e de Brasília
04/07/2016 - 03h03min | Atualizada em 04/07/2016 - 03h19min
PT "esquece" ex-deputado gaúcho preso na Operação Custo Brasil Alexandra Martins/Agência Câmara
Paulo Ferreira está detido há 11 dias na carceragem da Polícia Federal, em São PauloFoto: Alexandra Martins / Agência Câmara
Preso na Operação Custo Brasil, o ex-tesoureiro do PT e ex-deputado federal Paulo Ferreira tornou-se um constrangimento para o partido no Estado. Dos oito parlamentares do PT-RS, nenhum saiu de forma espontânea, na tribuna ou pelas redes sociais, em defesa do companheiro, tampouco o visitou na carceragem da Polícia Federal, em São Paulo, onde está detido há 11 dias.
O diretório estadual ignorou Ferreira nas manifestações oficiais sobre a Custo Brasil, que investiga fraude com empréstimos consignados que teria desviado R$ 100 milhões do Ministério do Planejamento, operação na qual ficou preso por seis dias o ex-ministro do Planejamento Paulo Bernardo (PT-PR), casado com a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). O gaúcho é apontado como parte do suposto esquema.
No dia em que foi deflagrada a Custo Brasil, a executiva do PT-RS publicou nota intitulada "dois pesos e duas medidas". O texto criticou a "pirotecnia" da operação, destacou que nenhum dos citados do PMDB em outros escândalos foi preso, lembrou que Eduardo Cunha (PMDB-RJ) segue solto e citou um "golpe" em curso no país. Não houve menção a Ferreira.
— Soltamos uma nota com uma crítica pesada sobre o episódio, sem pessoalizar a situação. Temos posição clara: quem tem culpa tem de ser punido. O problema é que ninguém foi julgado, ninguém teve direito de defesa — afirma Ary Vanazzi, presidente do PT-RS.
A situação do ex-tesoureiro também ficou em segundo plano nas manifestações das bancadas no Congresso e da executiva nacional, críticas da prisão de Bernardo e das buscas na sede do PT. Líder da sigla na Câmara, Afonso Florence (BA) afirmou em nota que a bancada "também registra a sua solidariedade a todos os cidadãos que tiveram o seu direito de defesa cerceado por motivações claramente políticas", sem citar Ferreira. Já a executiva nacional registrou que "a respeito das acusações assacadas contra filiados do partido, é preciso que lhes sejam assegurados o amplo direito de defesa e o princípio da presunção de inocência".
Classificado como "individualista" e "marrento" dentro da bancada gaúcha, Ferreira não recebe a solidariedade dos antigos colegas. Deputados de outros partidos deixam escapar sorrisos irônicos quando comentam a prisão do ex-parlamentar e não demonstram surpresa. Já petistas tentam evitar falar no assunto. Se questionados, suspiram, arregalam os olhos ou erguem as sobrancelhas. As falas têm caráter institucional.
— Em todos os casos, defendemos que as investigações sejam feitas e que as pessoas tenham o direito de se defender, dentro do devido processo legal — afirma o deputado Pepe Vargas (PT-RS).
Nos bastidores, a estratégia de manter distância é considerada "natural", diante das acusações e do histórico do gaúcho. Seria uma forma de se defender de eventuais "respingos". Amigo de José Dirceu e próximo de Lula, o ex-deputado tem relação direta com o grupo que comanda o PT há décadas, dominado por paulistas. Essa confiança lhe fez ser o escolhido para suceder Delúbio Soares no auge da crise do mensalão. Ferreira assumiu a secretaria de finanças em 2005, ficou no cargo nas campanhas de 2006 e 2008. No início de 2010, passou o posto a João Vaccari Neto e investiu em sua campanha de deputado federal.
— Ferreira nunca foi um cara orgânico do PT gaúcho, envolvido nas discussões do partido no Estado. Se reportava à turma de São Paulo e não ligava muito para o Estado — descreve um ex-colega.
Com trânsito entre as grandes empreiteiras do país e ligado ao carnaval gaúcho, Ferreira apostou em campanhas agressivas. Em 2010, arrecadou R$ 1,48 milhão, teve 77,3 mil votos e ficou como suplente, exercendo mandato entre 2012 e 2014. Petistas reclamavam que ele avançou, sem cerimônia, nas regiões de companheiros. Em Pelotas, base do ex-deputado Fernando Marroni, ajudou a financiar campanhas de vereador e viabilizou patrocínio para o Brasil de Pelotas.
Nas eleições de 2014, o ex-tesoureiro gastou R$ 1,3 milhão, arrecadou R$ 594 mil e recebeu 43,7 mil votos. Encerrada a disputa pela cadeira de deputado, gostava de dizer que era "um ex-candidato com dívidas". Sem mandato, ocupou cargos de confiança do PT na Câmara. Em 2015, foi assessor do líder Sibá Machado (AC) e neste ano foi nomeado na Comissão de Fiscalização e Controle, presidida por Leo de Brito (AC).
— O ex-deputado tem muita experiência em questões orçamentárias, por isso o escolhi. Quando tomei conhecimento da prisão, sem entrar no mérito ou condenar alguém, exonerei o Ferreira. Foi uma medida cautelar, que vale até que os fatos sejam esclarecidos — explica Brito.
Desafetos ironizavam sua "liberdade"
Secretário de finanças do PT entre 2005 e 2010, Paulo Ferreira sabia que corria o risco de ser preso. Repetiu a sina de outros dois tesoureiros do partido, Delúbio Soares e João Vaccari Neto, implicados no mensalão e na Lava-Jato.
A situação do gaúcho não provocou surpresas em Brasília. Quando viam Ferreira pelos corredores da Câmara, seus desafetos ironizavam sua "liberdade", pois não acreditavam em retidão nas contas petista apenas na gestão do gaúcho. Já aliados do ex-tesoureiro, que elogiavam sua eficiência na função, o alertavam que ele era o "próximo alvo" diante de uma "tentativa de criminalizar o PT". Ao analisar o histórico de Delúbio e Vaccari, Ferreira demonstrava confiança.
— Não acharam nada nas contas do partido porque não tem nada fora do lugar. Doações legais, contas declaradas e aprovadas pela Justiça.
O receio do gaúcho cresceu a partir da prisão de Alexandre Romano, o Chambinho, ex-vereador do PT de Americana (SP). Ao firmar acordo de delação premiada, Romano citou Ferreira, o colocando entre os alvos da Polícia Federal. Segundo investigadores da Custo Brasil, o ex-tesoureiro teria atuado na contratação da empresa Consist pelo Ministério do Planejamento, responsável por gerir a folha de pagamento da pasta e envolvida na suposta fraude com empréstimos consignados. Em troca, Ferreira receberia propina, o que ele nega.
Depois de se apresentar à Justiça em 24 de junho, o ex-deputado foi levado para a carceragem da Polícia Federal em São Paulo. Até o dia 29 de junho, tinha a companhia de outros presos, quando o ministro do STF Dias Toffoli mandou soltar Paulo Bernardo. À noite, o juiz Paulo Bueno de Azevedo liberou outros investigados — entre eles o advogado gaúcho Daisson Portanova —, mas manteve Ferreira detido. Na decisão, o magistrado justificou que haveria uma suposta ingerência do gaúcho para acertar versões de depoimentos de Milton Pascowitch.
Na tentativa de liberar o cliente, a defesa de Ferreira pediu a Toffoli a extensão do efeito da decisão que libertou Paulo Bernardo. O advogado do ex-tesoureiro é José Roberto Batochio, que defende Lula na Lava-Jato e já atuou para Antonio Palocci e Paulo Maluf.
Batochio mantém contato frequente com a mulher de Ferreira, a ex-ministra Tereza Campello (Desenvolvimento Social). Ela tem relatado receio de que o marido tenha o mesmo destino de Vaccari, preso há mais de um ano e já condenado na Lava-Jato. Alvo de palavras de conforto em conversas reservadas, Tereza evita comentários sobre o caso e mantém, em suas falas, as críticas ao governo interino de Michel Temer.

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