Polícia Militar bloqueou uma das ruas de acesso ao local, por temer protestos contra e a favor do ex-presidente
POLÍTICA LAVA JATOHÁ 7 HORASPOR FOLHAPRESS
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP) chegou por volta das 10h desta terça-feira (14) à Justiça Federal de Brasília para ser ouvido em audiência na 10ª Vara Federal sobre a acusação de que teria tentado impedir o acordo, durante a Operação Lava Jato, de uma delação premiada do ex-diretor da área internacional da Petrobras, Nestor Cerveró.
A Polícia Militar bloqueou uma das ruas de acesso ao local, por temer protestos contra e a favor do ex-presidente. Porém, não houve aglomeração de militantes e nenhum incidente havia sido registrado até as 10h.
Será a primeira vez que um juiz ouvirá Lula na condição de réu em processo aberto desde o início da Lava Jato, em março de 2014. Além desse caso, ele é réu em mais duas ações penais na 10ª vara de Brasília e em outras duas em Curitiba (PR), na vara do juiz federal Sérgio Moro.
Lula prestará depoimento ao juiz federal substituto Ricardo Augusto Soares Leite, que proibiu fotografar ou filmar o réu, tanto na sala de audiências quanto na sala em que a imprensa a acompanhou por dois monitores de vídeo.
Lula será acompanhado na audiência pelo seu advogado, José Roberto Batochio, ex-presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil).
O ex-presidente é acusado de infringir o artigo 2º da lei 12.850/2013 ("promover, constituir, financiar ou integrar, pessoalmente ou por interposta pessoa, organização criminosa"), no parágrafo 1º ("nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa").
A pena prevista para o crime é de 3 a 8 anos de reclusão, mais multa.Lula se tornou alvo do processo após ser citado em depoimentos prestados pelo ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT-MS) e Cerveró em acordos de delação premiada.
Em abril do ano passado, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, fez ao STF (Supremo Tribunal Federal) um aditamento à denúncia original que ele havia apresentado em dezembro de 2015, para incluir na acusação Lula, seu amigo e pecuarista José Carlos Costa Marques Bumlai e o filho do fazendeiro, Maurício Barros Bumlai.
A primeira denúncia fora feita sobre o mesmo assunto, a suposta compra de silêncio de Cerveró, contra Delcídio, o banqueiro André Santos Esteves, o advogado Edson de Siqueira Ribeiro e o assessor de Delcídio, Diogo Ferreira Rodrigues.
Com a cassação do mandato de Delcídio, pelo Senado, o processo foi distribuído à Justiça Federal de Brasília, que acolheu a denúncia e deu início à ação penal.Segundo a denúncia da PGR, de 11 de abril de 2015 a 29 de setembro do mesmo ano, Lula e os Bumlai "concorreram para impedir e embaraçar investigação de organização criminosa".
Para tanto, segundo Rodrigo Janot, eles pagaram R$ 250 mil à família de Cerveró "por intermédio" de Delcídio, Ribeiro e Rodrigues.Como contrapartida, segundo Janot, Cerveró não deveria celebrar o acordo de colaboração premiada com o Ministério Público ou deveria pelo menos omitir "parte das condutas criminosas, relacionadas à citada organização criminosa, de que tinha ciência".
Para formular essas acusações, Janot se baseou principalmente no depoimento de Delcídio, que fez um acordo de delação premiada com a PGR meses após ter sido preso, no final de 2015, quando tentava comprar o silêncio de Cerveró por meio de seu filho, Bernardo.
Na sua delação, Delcídio afirmou que tudo começou em janeiro de 2015, quando recebeu um e-mail de Bernardo para pedir um contato com o parlamentar.
A família Cerveró, segundo Delcídio, pediu ajuda para que a Petrobras ajudasse a pagar o advogado de Nestor, Edson Ribeiro. O senador disse ter conseguido, junto ao então presidente da Petrobras, Aldemir Bendini, que a petroleira fizesse dois pagamentos ao escritório do advogado, no valor total de R$ 747 mil.
Mas a família também pediu ajuda financeira, segundo o ex-senador. Nesses contatos, conforme Delcídio, ele percebeu que "uma delação de Cerveró poderia acontecer". Depois disso, "provavelmente em meados de maio de 2015", o então senador do PT, que era o líder do governo Dilma Rousseff no Senado, "manteve diálogo com o ex-presidente Lula no Instituto Lula", em São Paulo.
Segundo Delcídio, nessa reunião "Lula manifestou grande preocupação com a situação de José Carlos Bumlai em relação às investigações da Lava Jato", pois temia que o fazendeiro fosse preso "em razão das colaborações premiadas que estavam vindo à tona", em especial a de Cerveró e a do lobista Fernando Baiano.
Depois dessa conversa, sempre segundo Delcídio, o parlamentar chamou o filho de Bumlai, Maurício, também em maio, para "transmitir o recado e as preocupações de Lula". Delcídio também disse ter comentado o problema da "situação financeira da família de Cerveró".
O ex-senador disse à PGR que "pode dizer que o pedido de Lula para auxiliar José Carlos Bumlai, no contexto de 'segurar' as delações de Nestor Cerveró, certamente visaria o silêncio deste último e o custeio financeiro de sua respectiva família, fato que era de interesse de Lula".
Delcídio afirmou que, depois da conversa com Maurício, os Bumlai fizeram à família Cerveró cinco pagamentos, em parcelas de R$ 50 mil cada uma, de maio a setembro de 2015.No final daquele ano, porém, Bernardo procurou a PGR e denunciou o plano para calar o seu pai.
Delcídio foi preso por ordem do STF e depois se tornou colaborador.A investigação conseguiu comprovar que Lula se reuniu com Delcídio, no Instituto Lula, em 8 de maio de 2015, mais duas vezes em abril, uma em junho e outra em agosto, "precisamente no curso das tratativas da compra do silêncio de Cerveró", diz a PGR.
A PGR também apontou que logo após a reunião de maio, Lula e Bumlai conversaram "diversas" vezes. Em 23 de maio de 2015, um dia após o pagamento da primeira parcela de R$ 50 mil aos Cerveró, conforme a PGR, Lula e Bumlai falaram ao telefone por duas vezes.Janot afirmou, na petição ao STF: "O interesse de Lula em preservar José Carlos Bumlai decorria de vários fatores. Conforme declarou Delcídio, a relação entre os dois iniciou-se com a gravação de um programa eleitoral em 2002, em uma das fazendas de José Carlos Bumlai, para tratar do tema do agronegócio (setor em que o então candidato Lula buscava adentrar). Referida relação estreitou-se. Conforme afirmou Delcídio, José Bumlai gozava de total intimidade com Lula e era uma espécie de conselheiro ('consigliere') seu. Inclusive, em razão desta proximidade, Bumlai prestou diversos serviços de confiança. Dentre os quais o mais conhecido estava o empréstimo fraudulento que José Carlos Bumlai, Cristiane Dodedo Bumlai e Maurício de Barros Bumlai obtiveram junto ao banco Schahin mesmo com irregularidades na sua concessão, no valor total de R$ 12,1 milhões para quitar uma dívida do PT".
Para saldar essa dívida, segundo a PGR, um braço do banco Schahin, a empreiteira Schahin Engenharia, foi "favorecida nas negociações para a contratação da operadora do navio-sonda Vitória 10.000 pela Petrobras, ao custo de aproximadamente US$ 1,6 bilhão", com a participação de Cerveró, então diretor da área internacional da Petrobras.
Esse caso é tratado na Justiça Federal do Paraná, aos cuidados do juiz Moro.Dois sócios da Schahin, Salim e Fernando, disseram ter ouvido de José Bumlai que "Lula interveio na contratação da Schahin pela Petrobras".
OUTRO LADO
No decorrer da apuração aberta pela PGR, Lula foi ouvido pelos investigadores. Ele reconheceu sua amizade com Bumlai e confirmou que se reuniu com Delcídio para discutir "aspectos da Operação Lava Jato porque este [Delcídio] tinha preocupação com as pessoas que estavam presas", mas negou ter ordenado ou tido conhecimento de pagamentos à família Cerveró.
Lula disse ainda que "não conversou com ninguém e nem tinha razão para conversar" sobre o anúncio de que Cerveró havia feito um acordo de colaboração premiada na Lava Jato.
Em depoimento à PGR no dia 7 de abril de 2016, Lula afirmou que era "mentira" a versão de Delcídio de que eles discutiram a delação de Nestor Cerveró e também negou ter mantido conversas com Bumlai sobre "a possibilidade de prisão" do fazendeiro.Os dois Bumlai também negaram participação na compra do silêncio de Cerveró. Com informações da Folhapress.
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