A Polícia Federal, que prendeu o peemedebista na semana passada, acredita que a operação tenha sido usada para disfarçar o repasse de propinas.
27/10/2016 - 09h02
Alvos de investigação da Operação Lava Jato, anúncios comprados pela Gol Linhas Aéreas em dois
sites do ex-deputado Eduardo Cunha (PMDB) custaram ao menos cem vezes mais do que os valores
normalmente praticados no mercado publicitário, segundo levantamento feito pela Folha com
empresas e profissionais do setor.
A Polícia Federal, que prendeu o peemedebista na semana passada, acredita que a operação tenha sido usada para disfarçar o repasse de propinas. O ex-deputado teria recebido para defender no Congresso medidas que beneficiassem empresas da família Constantino, que controla a Gol.
A empresa diz que está realizando auditoria para apurar se houve irregularidades.
Para veicular quatro banners (imagens publicitárias) em cada endereço ligado ao ex-deputado, a companhia aérea gastou R$ 200 mil (R$ 250 mil em valores atuais) por mês entre 2012 e 2013.
O investimento total foi de R$ 2,2 milhões (R$ 2,7 milhões em valores atuais), segundo documentos fornecidos à PF pela agência AlmapBBDO, que atende a Gol.
O maior desses sites, o portal evangélico Fé em Jesus, tinha audiência média de 150 mil "page views" por mês, segundo a ferramenta de medição de tráfego Similarweb. Isso significaria hoje um custo de R$ 416 a cada mil visualizações (chamado no mercado de CPM, custo por milhar de impressões).
O editor de um dos maiores sites evangélicos no país, que pediu para não ter seu nome publicado, diz que seu site cobra um CPM de R$ 3 — 0,72% da taxa paga pela Gol a Cunha.
Se esse valor fosse aplicado para os banners comprados pela Gol, o valor recebido pelo ex-deputado seria apenas cerca de R$ 1.800 reais mensais.
Grandes portais, como UOL (do Grupo Folha, que edita a Folha) ou o 'G1', adotam CPM de até R$ 30 na tabela de preços, mas, por prática de mercado, os descontos nesses valores costumam passar de 70%.
No total, segundo os registros da AlmapBBDO, a Gol pagou 11 parcelas de R$ 200 mil a Cunha. Sete foram em nome do Fé em Jesus e outras quatro para um site chamado Bom Mercatto, que funcionaria como plataforma de comércio eletrônico.
Esse valor pago pela companhia, atualizado pela inflação, também seria suficiente para fechar pacotes mensais com grandes portais citados.
O valor de R$ 250 mil é o preço, por exemplo, de uma "cota master" na homepage do 'G1', com audiência cerca de 3.250 vezes maior que o Fé em Jesus, segundo o Similarweb.
Um publicitário especialista em compra de anúncios na mídia que atende grandes empresas brasileiras confirmou à Folha, sob condição de anonimato, que o investimento é descabido para o porte dos sites de Cunha.
Ele disse que, caso se tratasse de um cliente seu, recomendaria um investimento de no máximo R$ 9.000 por mês em um veículo segmentado com a audiência do Fé em Jesus.
O publicitário diz, porém, que só aprovaria os anúncios se o público atingido pelo site fosse relevante para o anunciante. No caso da Gol, diz, anunciar em um site evangélico "não faz sentido algum".
OUTRO LADO
Procuradas, Gol e AlmapBBDO repetiram o que disseram no dia da prisão de Cunha. A defesa do ex-deputado não respondeu.
A companhia aérea afirma "que está em processo de apuração" e que contratou "auditorias internas e independentes para a total elucidação dos fatos".
Já a agência de publicidade alega que adquiriu os anúncios a pedido da Gol. O plano de mídia da campanha desenvolvida em 2012, diz a empresa, contou com publicidade veiculada "em mais de 50 websites".
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