domingo, 30 de outubro de 2016

Em Barra Longa, população reclama que cidade virou canteiro de obras

30/10/2016 07h50 - Atualizado em 30/10/2016 07h50

Eles dizem que vai e vem de caminhões e poeira acabaram com sossego.
Um ano após a lama, alguns comerciantes ainda não reabriram as portas.

Cida AlvesDo G1, em Barra Longa

Destruída pela lama no ano passado, a praça da cidade mineira de Barra Longa será reinaugurada com festa neste domingo (30). Mas para alguns moradores, o clima não é de comemoração. Segundo eles, quase um ano depois do rompimento da barragem da Samarco, comerciantes ainda não conseguiram reabrir as portas, casas atingidas não foram totalmente reconstruídas e o barulho das obras e do vai e vem de caminhões tirou o sossego da comunidade.
Na véspera da reinauguração, havia movimento de caminhões e funcionários trabalhando. Caminhões circulavam jogando água na rua para tirar a poeira. Homens pintavam as fachadas das casas e a sinalização ao redor da praça e na entrada da cidade.
“Há um ano nós estamos convivendo com esse barulho de pi-pi-pi, de máquina o tempo todo, que não tem psicológico que aguente”, diz Simone Maria da Silva, de 39 anos. Ela afirma que as obras aconteciam até de madrugada.
“Começou em setembro, para acelerar a reinauguração da praça [...] Pessoa que trabalha durante o dia não podia dormir à noite.” A empresa afirma que o horário foi acordado com a população. (veja abaixo)
Edivania de Oliveira, de 36 anos, mora na entrada da cidade e diz que até duas semanas atrás caminhões paravam para descarregar pedras em frente à casa dela das 18h às 21h. “A gente não tinha sossego durante o dia, e à noite não podia nem assistir televisão por causa do barulho.”
Praça de Barra Longa pronta para ser reinaugurada quase um ano depois de destruída pela lama (Foto: Wagner Santos/G1)Praça de Barra Longa pronta para reinauguração 1 ano após ser destruída pela lama (Foto: Wagner Santos/G1)
Dona de uma loja, ela afirma que as obras também impactaram nos negócios. “Meu comércio não foi atingido pela lama, mas desde novembro que eu sofro com a poeira. Todo dia preciso fechar a loja para pedir que joguem água na rua. Tem mercadoria que não consigo mais vender nem a preço de custo porque a poeira estragou”, diz.
Alguns estabelecimentos próximos à beira-rio, que foram tomados pela lama há um ano, ainda não reabriram as portas. Na fachada do armarinho de Geraldo Magela Carneiro, de 55 anos, há uma faixa que diz: “Esta loja está fechada desde 5 de novembro de 2015. Motivo: ‘lama’ descaso ‘Samarco Mineração’”.
Geraldo Magela Carneiro diante de seu armarinho em Barra Longa, que ele diz estar fechado desde a lama da Samarco (Foto: Cida Alves/G1)Geraldo Carneiro diz que armarinho está fechado
desde a passagem da lama (Foto: Cida Alves/G1)
Carneiro diz que perdeu móveis e parte das mercadorias. E que ainda não foi ressarcido pela empresa. “Do meu bar, que fica do outro lado da rua, eu recebi. Do armarinho, não.”
Maria Aparecida Mol, de 69 anos, tem três irmãs que moram na praça destruída pela lama. Segundo ela, a casa de uma já foi reconstruída. A de outra foi pintada por fora, mas a reforma do interior só começou agora.
Maria da Conceição Severino Trindade, de 38 anos, tem casa e comércio na praça, atingidos pela lama. Apenas o restaurante, que fica no segundo pavimento, voltou a funcionar. A pizzaria só será reaberta neste domingo, porque antes as obras da praça impediam o acesso, afirma.
Já a casa, ela diz que a Samarco entregou pela metade. “Minha vida estava ali dentro e perdi tudo. Agora dizem que o resto vai ser por acordo de indenização, mas quando?”
Lama
 Todo o rejeito que foi retirado da cidade de Barra Longa foi depositado na área onde antes ficava o campo de futebol e o parque de exposições, a poucos metros de casa e de animais criados pelos moradores dali. Do outro lado da montanha de lama, está o Rio do Carmo, que ainda tem água barrenta.
Em agosto, a empresa foi multada em R$ 1 milhão pelo Ibama por omitir em um documento oficial o depósito temporário de rejeitos em Barra Longa - e recorreu. Na ocasião, a empresa afirmou que foi uma das soluções encontradas para reestabelecer os acessos urbanos e a limpeza da cidade, e que era de conhecimento dos órgãos ambientais, que teriam vistoriado o local.
Ana Paula Gouveia, de 32 anos, diz que até 15 dias atrás tinha uma pilha de lama a poucos metros de sua casa. Segundo ela, não houve consulta aos moradores do lugar sobre o depósito dos rejeitos. “Teve muito barulho e mau cheiro também, na época, porque a lama estava molhada. Hoje ainda incomoda porque não tem horário de mexer. De madrugada tem caminhão descendo aí.”
Segundo ela, a empresa ainda não informou quando a lama vai ser retirada do local. “Antes aí tinha muito mato, mas eu prefira a isso. Sem comparação”, diz.
Samarco
O diretor-presidente Samarco, Roberto Carvalho, diz que a entrega da praça de Barra Longa “não é um motivo para comemoração”. “Estamos cumprindo com os compromissos assumidos de devolver a cidade de Barra Longa a sua tranquilidade”. A previsão da Samarco é de que o evento de reinauguração dure todo o dia e que cerca de 3 mil pessoas circulem por Barra Longa neste domingo.
“Sabemos que ainda há muita coisa para ser feita, como parque de exposições, conclusão de reformas de imóveis e quintais. Caberá, a partir de agora, à Fundação Renova dar continuidade às demais ações de reparação e reforma de Barra Longa”, afirmou Carvalho.
Sobre as obras à noite, a empresa afirma que realizou serviços de pavimentação de ruas após às 21h e que o horário “foi definido em conjunto com a comunidade e com a prefeitura”. O objetivo era “reduzir o transtorno gerado pelo trânsito de veículos, já que as ruas da cidade são estreitas.”
Monte de lama retirada de Barra Longa e depositada pela Samarco as margens do Rio do Carmo, em Barra Longa (Foto: Wagner Santos/G1)Lama retirada de Barra Longa e depositada às margens do Rio do Carmo (Foto: Wagner Santos/G1)
Sobre a reparação dos imóveis atingidos pela lama e a pintura das fachadas, a empresa, que é controlada pela Vale e pela BHP, afirmou que “90% das casas em Barra Longa já foram totalmente reconstruídas e recuperadas”. “Como as obras de pavimentação das ruas da cidade, que só terminaram essa semana, continuaram a gerar alguns impactos, a empresa continua com os trabalhos de reparo das fachadas das casas.”
Sobre a lama na área do parque de exposições, a Samarco diz que, no bairro Morro Vermelho, foi instalado um muro de 278 metros de comprimento e quatro metros de altura feito com caixas de pedras para conter o processo de erosão no Rio do Carmo.
Afirmou ainda que “está construindo um campo de futebol ao lado do parque de exposições” e que o projeto foi concebido para garantir a contenção de todo o material, “que será devidamente compactado, evitando-se carreamentos para o rio do Carmo”.
Segundo a empresa, a comunidade foi consultada e o projeto foi protocolado pela secretaria estadual de Meio Ambiente. O campo de futebol deverá ser inaugurado no primeiro semestre de 2017, ano em que também está previsto o início da reconstrução do parque de exposições, disse a Samarco.
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De volta rio doce caminho lama mariana Dia 6 (Foto: Editoria de Arte/G1)

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