quinta-feira, 16 de abril de 2015

Homenagem aos índios no Senado é marcada por reclamações contra PEC 215 Proposta transfere demarcações de áreas indígenas do Executivo para o Legislativo

O Senado realizou nesta quinta-feira (16) uma sessão especial para homenagear os Povos Indígenas, pelo Dia do Índio, que será comemorado no próximo domingo (19). A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 215, que transfere do Executivo para o Legislativo as demarcações de áreas indígenas, foi apontada nos discursos como símbolo das injustiças históricas cometidas contra esses povos no Brasil.
Diversas lideranças indígenas de todo o país foram recebidas no plenário do Senado durante a sessão especial, que antecipou as comemorações do Dia do Índio.
“Nós, povos indígenas do Brasil, não queremos essa PEC. Ela é uma cobra grande. Vamos matar a cobra. Vamos matar a cobra antes que ela cresça. Vamos matar, vamos enterrar e vamos queimar essa cobra grande, para não nascer mais a raiz. Não pode engavetar, porque depois vem de novo para a nossa futura geração”, declarou Davi Kupenawa Yanomami, considerado uma das principais lideranças indígenas do país.
Uma camiseta onde se lia Fora PEC 215 foi entregue aos parlamentares e autoridades presentes pelo líder dos Povos Indígenas do Brasil, Neguinho Truká. Em discurso, Truká lembrou que essa PEC é simbólica, mas não é uma proposta isolada de intervenção negativa sobre as demarcações de terras indígenas. “A PEC nº 215 é um instrumento que se tornou mais atrevido por parte da Câmara de Deputados, mas nós temos aqui no Senado a PEC nº 038, que tem o mesmo conteúdo e que muda simplesmente o número e a Casa. Um é na Câmara e outro no Senado. Nós temos a Portaria nº 303, da AGU, que é no mínimo absurda, também, tentando intervir na demarcação, na regularização fundiária do nosso Território”, disse o líder indígena.
Além da preocupação com a política de demarcação de terras indígenas, os representantes dos índios também chamaram a atenção para outras questões relevantes. Truká lembrou que o país precisa desenvolver uma política de educação que seja inclusiva e que respeite a cultura e as peculiaridades de cada etnia.
“A busca que nós temos, de fato, hoje, no País afora, na prestação de serviços essenciais, é o modelo que a gente lutou aqui nesta Casa em 2000, que foi a aprovação da Lei Arouca, criando o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena. Nós defendemos o subsistema também para a educação indígena em todo o País, mas um subsistema que respeite as especificidades e respeite as diferenças”, disse Truká.
A coordenadora da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Sônia Guajajara, também aproveitou a oportunidade para criticar o projeto do novo Marco da Biodiversidade, que foi aprovado ontem (15) no Senado. Sônia lembrou que o projeto, que trata diretamente dos interesses dos povos indígenas, foi aprovado na Câmara sem que eles fossem ouvidos. Quando chegou ao Senado, segundo ela, os representantes dos índios apresentaram emendas ao texto, mas elas foram desconsideradas, como a que propunha a modificação do termo “populações indígenas” por “povos indígenas”.
“Ontem, o Senado aprovou o texto, desconsiderando-nos, simplesmente nos negando nossa identidade, quando retirou desse projeto de lei a palavra povos, colocando-nos como população. O conceito de povos já é garantido na Constituição Federal. Então, quero lamentar esse fato acontecido aqui ontem”, disse. Logo após o discurso, Sônia seguiu para encontro com o vice-presidente da República e novo articulador político do governo, Michel Temer.
As queixas sobre a forma como os índios foram tratados no Marco da Biodiversidade se reproduziram ainda em outros discursos de lideranças indígenas e foram apoiadas pelo senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP). “Vocês são povos diferentes, não são população, como querem denominar na marra, na força, porque população é um conceito demográfico, está na geografia. Povo é um conceito da história que cada um de vocês construiu muito antes de os brancos aqui chegarem, muito antes”, disse o senador ao plenário repleto de indígenas.
O presidente dos trabalhos foi o senador João Capiberibe (PSB-AP), autor do requerimento para que a sessão solene ocorresse. Ele comemorou que os índios tenham tido acesso aos microfones do Senado. “Muito importante participar deste momento, um momento fantástico de ver um descendente assumir da tribuna do Senado essa condição de indígena. Isso é muito forte e pedagógico. Este é o povo brasileiro. Somos nós, povo brasileiro”, disse Capiberibe.
No entanto, apesar de ainda haver espaço no plenário, parte dos índios que estavam acampados no gramado em frente ao Congresso Nacional não pode entrar no prédio. A Polícia Militar fez um cordão de isolamento para garantir que o grupo não entrasse.

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