As autoridades cubanas prenderam ao menos 30 dissidentes, entre eles a artista Tania Bruguera, para impedir uma performance pública em Havana, em uma onda de repressão que provocou nesta quarta-feira o primeiro atrito entre Cuba e Estados Unidos após sua histórica reconciliação.
A artista de 46 anos e os demais ativistas foram detidos ou colocados sob prisão domiciliar na terça-feira para impedir que desafiassem o governo comunista com uma performance artística que Bruguera faria na Praça da Revolução de Havana, mas a maioria já foi libertada, segundo o dissidente Elizardo Sánchez.
"O número de detidos supera os 30 (...), mas a maior parte deles já foi libertada", disse à AFP Sánchez, líder da Comissão Cubana de Direitos Humanos, que é ilegal, embora tolerada pelo governo.
"Bruguera encontra-se presa na unidade policial de Acosta, no município de Diez de Octubre, em Havana", indicou o site de notícias 14ymedio, dirigido pela blogueira opositora Yoani Sánchez, que esteve sob prisão domiciliar na terça-feira, mas que já foi libertada.
O marido de Yoani Sánchez e editor geral do 14ymedio, Reinaldo Escobar, que esteve detido por várias horas e que foi libertado na noite de terça-feira, afirma ter visto Tania vestindo "um uniforme cinza de presidiária" neste mesmo centro policial, indicou o site.
Bruguera e ao menos outros seis ativistas seguiam detidos nesta quarta-feira, segundo Elizardo Sánchez, após a primeira onda repressiva depois do acordo entre Cuba e Estados Unidos para restabelecer relações diplomáticas, anunciado em 17 de dezembro simultaneamente pelos presidentes Barack Obama e Raúl Castro.
"O governo cubano respondeu com uma onda de repressão preventiva por esta performance (...). Todas foram detenções arbitrárias sem cumprir com nenhuma formalidade legal", afirmou Elizardo Sánchez.
Nos últimos anos, era comum que os dissidentes presos fossem libertados horas depois sem acusações.
Os meios de comunicação oficiais cubanos, que descreveram a performance artística que Bruguera pretendia fazer como uma provocação política, não informaram sobre estas detenções, que levaram os Estados Unidos a declarar estar profundamente preocupados.
"Estamos profundamente preocupados com as últimas informações de detenções por parte das autoridades cubanas de membros pacíficos da sociedade civil e de ativistas", disse nesta quarta-feira o departamento de Estado americano em um comunicado.
"Condenamos fortemente a perseguição contínua do governo cubano e a utilização reiterada da detenção arbitrária, às vezes com violência, para silenciar os críticos, perturbar as reuniões pacíficas e a liberdade de expressão, e intimidar cidadãos", acrescentou.
Agentes em apartamento de Bruguera
Os ativistas foram presos para impedir a performance na emblemática Praça, coração político de Cuba, onde Bruguera colocaria um palco e um microfone para que qualquer cubano dissesse o que quisesse durante um minuto.
Vinte opositores e muitos correspondentes estrangeiros se dirigiram à praça na terça-feira no horário indicado, às 15h00 locais (18h00 de Brasília), mas a artista não estava no local e não conseguia ser contactada, já que seu telefone celular estava fora de serviço e seu apartamento tomado por policiais à paisana que impediam o acesso, constataram jornalistas da AFP.
Bruguera - que se divide entre Cuba, Estados Unidos e França - havia promovido sua atividade através das redes sociais, à margem dos meios de comunicação da ilha, que estão sob controle estatal.
O site 14ymedio é o único meio de comunicação independente de Cuba, mas quase não é lido na ilha devido à pequena cobertura de internet e porque às vezes é bloqueado.
Provocação política e reality show
Bruguera havia convocado os cubanos a expressarem livremente suas ideias sobre o futuro da ilha neste palco público, mas era pouco provável que esta atividade fosse tolerada pelo governo comunista.
"O projeto era fazer uso da liberdade de expressão", reconhecida na própria Constituição cubana, destacou Elizardo Sánchez.
A Praça é palco de grandes manifestações do governo e à frente dela encontram-se a casa de governo, a sede do Comitê Central do Partido Comunista (único) e o poderoso Ministério das Forças Armadas Revolucionárias.
A performance havia sido rejeitada de antemão pela governista União de Escritores e Artistas de Cuba, que a classificou de provocação política, e pelo Conselho Nacional de Artes Plásticas, dependente do Ministério da Cultura, que afirmou que se tratava de um reality show, e não de uma obra de arte.
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