sábado, 17 de janeiro de 2015

Amigo relembra prisão com brasileiro condenado à morte na Indonésia

Amigo relembra prisão com brasileiro condenado à morte na Indonésia

'Vai aliviar uma dor dele', diz Rogério Paez sobre execução.
Surfista ficou oito anos preso por porte de 3,8 gramas de haxixe.

Janaína CarvalhoDo G1 Rio
Rogério Paez três anos e dois meses após sair da cadeia na Indonésia. (Foto: Janaína Carvalho / G1)Rogério Paez três anos e dois meses após sair da cadeia (Foto: Janaína Carvalho/G1)
Sem dormir direito há três dias e com a voz embargada, o fluminense Rogério Paez acredita que a execução da pena de morte será uma forma de aliviar a dor de Marco Archer Cardoso, brasileiro preso na Indonésia e cujo fuzilamento está previsto para este domingo (18). O surfista e empresário, que atualmente vive em Niterói, contou ao G1 nesta sexta-feira (16) que o instrutor de voo, de quem ficou amigo quando ficaram presos juntos na Indonésia entre 2006 e 2011, chegou a pedir para ser morto antes, tamanho o desespero de esperar sua sentença.
“Se acontecer o que estão falando que vai acontecer, vai ser uma coisa muito triste, muito dolorosa, mas eu tenho certeza que vai aliviar uma dor dele. Esse processo vai dia após dia minando a sua autoestima, você acaba comendo qualquer porcaria, acaba vestindo qualquer coisa”, declarou Paez.
Archer foi preso ao tentar entrar na Indonésia em 2004 com 13 quilos de cocaína escondidos nos tubos de uma asa delta. A droga foi descoberta pelo raio-X, no Aeroporto Internacional de Jacarta. O brasileiro conseguiu fugir do aeroporto, mas foi preso duas semanas depois. O país pune com pena de morte o tráfico de drogas.
Marco dentro da cadeia na Indonésia (Foto: Rogério Paez / Arquivo pessoal)Marco dentro da cadeia na Indonésia, em foto tirada por Rogério Paez (Foto: Arquivo pessoal)
Paez foi preso com um cigarro de haxixe de 3,8 gramas e ficou oito anos em presídios no país, cinco deles com Archer. Os dois já se conheciam do Brasil, mas foi na cadeia que se aproximaram. Como não foi condenado à pena de morte, pouco antes de ganhar liberdade, em novembro de 2011, ele lembra que o amigo chegou a ter um momento de desespero.
“Ele virou para o diretor do presídio e disse: ‘Posso pedir um favor ao senhor? Já tive dois pedidos de clemência negados, eu sei que vou morrer mesmo, então me mata logo’"
Rogério Paez
“Ele virou para o diretor do presídio e disse: ‘Posso pedir um favor ao senhor? Já tive dois pedidos de clemência negados, eu sei que vou morrer mesmo, então me mata logo’. O diretor olhou para ele, rindo, e falou: ‘Marco, adoraria te matar amanhã, mas o homem lá de cima (o presidente) ainda não assinou. Espera mais um pouquinho’”.

Ajuda do budismo 
Segundo Rogério, o budismo foi fundamental para a sua sobrevivência na cadeia. “Por mais que estivesse preso, estava em contagem regressiva para sair. Se eu estivesse condenado à pena de morte acho que estaria muito pior que os dois juntos. O Marco buscou na droga a fuga daquele inferno e o Rodrigo surtou”, afirmou Rogério, referindo-se também a Rodrigo Gularte, outro brasileiro condenado à morte que aguarda o julgamento do pedido de clemência por tráfico de drogas.
Marco durante um dos momentos descontraídos na cadeia, quando fingia ser mulher.  (Foto: Rogério Paez / Arquivo pessoal)Marco durante um dos momentos descontraídos
na cadeia. (Foto: Rogério Paez / Arquivo pessoal)
Apesar de saber que só sairia da prisão para ser executado, Marco era considerado um sujeito bem-humorado e responsável por alguns momentos de diversão para os presos. “O Marco é um showman. Ele faz graça, faz o prisioneiro que tem vontade de matar todo mundo rir. Ele é uma pessoa incrível”, lembra.

Rogério foi solto no dia 9 de novembro de 2011 e, apesar da felicidade, garante que deixou a prisão chorando. “Ele [Marco] ficava usando aquele negócio lá, a tal da metanfetamina, que é a praga das prisões, e ficava falando a noite toda, contando piada, ficava nu, pegava comida dos outros. No final, ele virou um personagem da prisão. Na hora da contagem todo mundo perguntava: ‘Cadê o Marco?' 'Simples, conta um a menos. Ele tá em alguma cela’.”
Risco assumido
Rogério morava havia dois anos em Bali, na Indonésia, quando foi preso. Segundo ele, o mais difícil no começo foi aceitar o fato de ter sido preso e saber qual seria a sua sentença. “Fui preso com 3,8 gramas de haxixe, sabia que poderia dar muito errado e realmente deu. Fui roubado pelo advogado e fiquei oito anos no presídio (...) A maior dor, que não dá para descrever, era pensar na minha família, principalmente na minha mãe, na dor que ela vivia.”
Rogério diz que se manteve de pé na cadeia graças ao budismo (Foto: Arquivo pessoal)Rogério diz que se manteve de pé na cadeia
graças ao budismo (Foto: Arquivo pessoal)
Segundo ele, na cadeia apenas os presos que não têm boa condição financeira passam necessidade e não se alimentam direito. “Os indonésios recebem muito mal, os guardas são muito mal remunerados, não têm como resistir ao suborno”, diz, lembrando regalias. "Se você pagar consegue ter telefone, xampu, DVD e outras coisas consideradas de luxo dentro da cadeia. Lá a gente tem antena de TV a cabo, televisão, DVD. Os mafiosos lá têm coisas que você nem acredita, tem computador, tem tudo."

Após uma tentativa de fuga frustrada e uma briga com um guarda que desrespeitou sua namorada após uma visita, Rogério foi levado para um presídio de segurança máxima com cerca de 3,5 mil presos, entre indonésios e estrangeiros, a maioria presa por tráfico e até mafiosos. “Foi lá que eu conheci a máfia chinesa, a máfia nigeriana, um monte de assassinos, viciados de tudo quanto é jeito. Foi lá que eu vi o que é a escória da sociedade”, lembra.
De acordo com Paez, apesar da pena de morte para traficantes de drogas na Indonésia, outros crimes muito graves têm penas mais brandas. “Lá tinham dois irmãos que foram presos por matar um idoso de 65 anos. Eles chutaram o homem até a morte. Um foi condenado a três anos e o outro a dois anos de prisão. Depois soube que um teve pena maior porque foi o que deu o primeiro chute”, conta o brasileiro.

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