A ex-senadora pelo PT faz referência ao processo que tramita no mais alto tribunal da Justiça Eleitoral que questiona a chapa presidencial eleita em 2014. Unificado a partir de quatro ações movidas pelo PSDB, o texto dos tucanos argumenta que tanto Dilma Rousseff quanto seu vice Michel Temer devem ser cassados caso o TSE concorde que infrações cometidas durante a campanha, incluindo a acusação de que fundos desviados da Petrobras foram usados, contaminaram o resultado das eleições. O problema, no entanto, é que a decisão da corte não parece ser uma realidade para agora. O processo, como um todo, é lento, não tem data para começar e pode se arrastar durante 2017 inteiro, o que jogaria a resolução da crise para 2018, ano eleitoral.Desde que se falou pela primeira vez em uma candidatura sua à presidência da República, a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva (REDE), colou-se na ideia da "terceira via". Foi assim em 2010, quando concorreu comJosé Serra (PSDB) e Dilma Rousseff, e foi assim também em 2014, na reeleição da presidenta, quando o outro adversário era Aécio Neves (PSDB). Agora, a recente movimentação da REDE, que inicia nesta terça uma campanha defendendo o afastamento de Rousseff e de Michel Temer (PMDB) em favor da convocação de novas eleições, é a prova de que, mais uma vez, Marina quer colocar a "terceira via" definitivamente na mesa. "O partido acha que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) é a instituição com legitimidade para decidir sobre a cassação da chapa Dilma/Temer", disse a sigla de Marina em comunicado.
O tempo, neste caso, importa e muito. Se uma sentença cassar a chapa ainda em 2016, ou antes da metade do atual período de Dilma, assumiria o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), ele próprio alvo de investigações, que teria de convocar novas eleições presidenciais em até 90 dias. Se a decisão do TSE só acontecer a partir do ano que vem e a chapa for cassada, é o Congresso quem elege, indiretamente, o novo presidente que terminará o atual mandato.
No momento, o que está na mesa é a guerra do impeachment. Se a oposição, ao lado do recém desembarcado PMDB, conseguir os votos necessários no Congresso para afastar a presidenta, Temer assume. E, com planos para seu possível ministério sendo discutidos abertamente na imprensa, ele não parece exatamente aberto a considerar um afastamento voluntário. Salvo uma reviravolta que acelere o TSE ou uma reviravolta igualmente relevante para aprovar uma inédita e controversa legislação no Congresso para mudar a Constituição, a situação, nesse ponto, está assim: só há novas eleições se houver uma renúncia coletiva de Dilma e Temer e, potencialmente, outros na linha de sucessão, ou se o peemedebista deixar o posto após a eventual posse, quer por renúncia ou novo impeachment.
Termômetro popular
Seja como for, a possibilidade tem alimentado alguns debates. Desde o editorial da Folha de S. Paulo, no último domingo, que pedia renúncia de Dilma, a uma proposta de introduzir a figura do recall (referendo de um mandato) na Constituição feita pela Rede e pelo PSOL no mês passado. Nos últimos dias, houve referências na imprensa a conversas nos bastidores para formular uma proposta de mudança constitucional para ter novas eleições. Nesta segunda, foi a vez de Valdir Raupp (PMDB-RO) usar a tribuna do Senado para defender que haja eleições presidenciais antecipadas em outubro deste ano, coincidindo com a votação para a escolha de novos prefeitos.
Na semana passada uma pesquisa telefônica elaborada pela consultoria Ideia Inteligência também aventou a hipótese. Ao serem perguntadas se preferem uma nova eleição ou um Governo peemedebista, 55% das pessoas optaram por um novo pleito, 33% não souberam opinar e apenas 12% expressaram apoio ao vice. Os resultados da pesquisa – elaborada a partir de um pedido do Brazil Institute, ligado ao Wilson Center (think tank de Washington em memória do ex-presidente americano Woodrow Wilson) –, contudo, têm de ser analisados com cuidado.
Apoiando-se em metodologias diferentes das tradicionais, o levantamento ouviu, entre 28 e 29 de março, cerca de 10.000 pessoas via telefone fixo, em 82 cidades brasileiras. Maurício Moura, economista e diretor da Ideia Inteligência explica: “Pegamos informações abertas de bancos de dados para conseguir os telefones, cruzamos endereços com informações do IBGE sobre moradia e faixa de renda e, por fim, usamos uma mensagem eletrônica para os questionamentos”. Para um especialista na área ouvido pelo EL PAÍS, no entanto, apesar da amplitude não é possível ter uma amostragem válida do Brasil com esse método de pesquisa.Para além das questões metodológicas, o estudo levanta a pergunta: e se essa hipótese de novas eleições estivesse em jogo, ela teria mais aceitação popular do que as atualmente na mesa?
Os sinais de que a vida de um possível Governo Temer não seria fácil, e talvez nem longa, vêm de longe. Nas manifestações pró-impeachment, por exemplo, não raro os depoimentos colhidos mostram pessoas sem a noção exata do que esperar depois do impedimento de Dilma Rousseff. Pesquisa do Datafolha de 19 de março revela que, apesar de 68% serem favoráveis a saída da presidenta, apenas 16% acreditam que um eventual Governo peemedebista seria ótimo ou bom. A intensidade dos protestos contrários ao impeachment – que no dia 31 de março colocaram novamente milhares de pessoas nas ruas – são outros indício claros de que o almejado Governo de coalizão sonhado por Temer continuaria sendo questionado. Além de seguir com a ameaça do julgamento do TSE sobre sobre a cabeça, o atual vice também teria, em tese, que lidar com os avanços da investigação da Lava Jato sobre o PMDB e aliados, sem falar de que pode enfrentar processo de impeachment - um novo pedido de afastamento do vice-presidente foi entregue por Cid Gomes na sexta-feira passada.
A aposta de Marina
Essa seria uma eleição solteira, em que só a presidência estaria em disputa. A única vez em que isso aconteceu, acabou ganhando umoutsiderMARIA HERMÍNIA TAVARES (CEBRAP)
Num cenário com novas eleições, Marina Silva seria, de partida, a mais beneficiada. Na pesquisa Datafolha de março, que questionou os eleitores sobre o pleito de 2018, a política do Acre apareceu na frente, com entre 21% e 24% das intenções de voto, dependendo de quem for o candidato do PSDB.
A fortaleza eleitoral da ex-senadora, porém, não é um consenso. Maurício Moura, da Ideia Inteligência, repetiu, em um painel que discutiu o monitoramento telefônico de sua empresa, que a rejeição de Temer é o mais importante dado do levantamento: “Acho que a Marina tem tudo para ser essa terceira via que a sociedade busca, mas como candidata ela já se mostrou fraca. Para mim, o interessante do resultado da pesquisa, na minha opinião, é mesmo o fato de que Temer é rejeitado, principalmente quando a possibilidade de uma nova eleição é aberta”.
Para a cientista política e pesquisadora do Cebrap, Maria Hermínia Tavares, a solução do novo pleito presidencial talvez fosse a menos traumática, já que sobre o impeachment não há consenso nem entre juristas nem na sociedade. "Contudo, essa seria uma eleição solteira, em que só a presidência estaria em disputa. A única vez em que isso aconteceu, acabou ganhando um outsider(Collor), porque esse é um tipo de pleito em que a força partidária conta menos, já que não estão em disputada cadeiras no Congresso", comenta. O perigo para Tavares é que a vitória de um outsider se repita. "Isso é bem possível considerando como os partidos e políticos estão desacreditados. Agora imagine uma figura sem representatividade partidária lidando com os mesmo deputados que já se mostraram tão hostis ao longo dessa crise".
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