domingo, 6 de março de 2016

À sombra do calote Por: Ana Borges

Investir no Brasil tornou-se mais arriscado que no Cazaquistão, Guatemala ou Namíbia, ao menos na avaliação a agência de classificação de risco Moody´s. O país deixou de ser a promessa entre os emergentes e passa a ser alvo de especulações até mesmo sobre se tornar um caloteiro, tal qual a Grécia. Num passado não muito distante, isso já ocorreu (em 1987, sobre a dívida externa, e em 1990, sobre a dívida interna – confisco da poupança) e o custo foi elevado: perda da credibilidade do país e necessidade posterior de elevadíssimas taxas de juros para reconquistar investidores que quisessem especular no país.
A sombra da moratória se aproxima da economia. Mesmo que não seja a hora de pular no precipício, os dados demonstram que, se nada for feito, este será o triste destino no médio prazo. A recessão reduz as receitas do governo e ajuda as contas a não fecharem, a rolagem dos títulos é de curto prazo e a dívida só aumenta. Tudo isso faz com que os papéis soberanos brasileiros sejam agora considerados junk (lixo), no jargão do mercado.
Mas, ao contrário do que é necessário para evitar o calote, ou seja o anúncio de medidas efetivas para reduzir o endividamento e obter o superávit primário, dentre outras, o governo mostra-se perdido, o Congresso não está nem aí e por aí vai. As empresas abertas demonstram fracos resultados e muitas também tiveram a classificação de risco rebaixada. Diante deste quadro e com arrecadação em baixa, alguns estados já demonstram bandeira vermelha, como o Rio Grande do Sul e Rio de Janeiro – o governo fluminense prevê uma receita 23% menor do que o orçamento. O ajuste necessário afeta todas as secretarias e deixa em aberto o pagamento de salários de servidores. As distribuidoras de energia elétrica, por exemplo, registram uma elevada inadimplência por parte de órgãos públicos.
A dívida pública federal recuou 1,54% em janeiro ante o mês anterior, de R$ 2,793 trilhões para R$ 2,749. Mas isso muda nada. É coisa pontual, pois, geralmente, há um volume grande de títulos com vencimento no mês, o que faz o estoque cair temporariamente. Segundo dados do Banco Central, o endividamento do setor público bateu em 66% do Produto Interno Bruto (PIB). Se forem incluídas no cálculo as operações compromissadas, de curtíssimo prazo, cerca de R$ 1 trilhão, o valor supera a casa dos 70% do PIB e pode bater nos 80% no fim do ano. Dá mais nervoso ainda pensar nos juros pagos por este endividamento, pois a taxa é elevada em termos reais (deflacionada). Para se ter uma ideia do impacto, somente os pagamentos dos juros da dívida representam mais de 20% da receita do governo. No ano passado, apenas os juros acrescidos à dívida principal somaram mais de R$ 500 bilhões.
O rebaixamento soa tardio. Quanto maior o risco de calote, mais difícil fica a continuidade da rolagem da dívida. A questão é bem simples: quando as contas não fecham, o governo vende títulos no mercado para honrar os seus compromissos. Para emprestar o dinheiro, os investidores recebem juros. E, diante do maior risco, é preciso juros maiores para atrair capital, tornando a rolagem da dívida mais cara e mais difícil. O endividamento aumenta rapidamente e, na mesma velocidade, piora o perfil do crédito. Nas palavras da Moody´s, “a perspectiva negativa reflete a incerteza em relação à interação entre as dinâmicas política, econômica e financeira no Brasil e em consequência o potencial para a materialização de mais choques, o que iria colocar mais pressão para baixo sobre o perfil do crédito soberano”.
O rebaixamento da nota do país contamina empresas, particularmente bancos, por estarem abarrotados de títulos públicos em suas carteiras. Daí a Moody’s decidir rebaixar também os ratings atribuídos a 29 bancos brasileiros e suas respectivas subsidiárias fora do País, incluindo o Banco do Brasil, Caixa Econômica, Bradesco, Itaú Unibanco e BNDES. Tal fato prejudica a captação externa e piora ainda mais o quadro. Dentre os Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), temos as piores perspectivas. Aliás, tudo parece indicar que sairemos de mãos dadas com a Rússia da sigla. Com os dois postos a serem ocupados por Taiwan e Coreia do Sul, surgem os Ticks.

Ana Borges

Ana Borges é diretora da Compliance Comunicação. Atuando como jornalista, vem acompanhando nos últimos 15 anos o dia a dia do mercado financeiro. Também é graduada em Economia pela UFRGS e pós graduada em Finanças pela FIA. Leciona no as disciplinas Estratégias Econômicas Empresariais, Finanças Internacionais, Políticas Econômicas e Administração Financeira, no Senac-SP. 
Acesse: http://www.compliancecomunicacao.com.br

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