Miller é acusado de receber vantagens indevidas para ajudar grupo J&F, de Batista. Eles negam. Também foram denunciados a advogada Esther Flesch e o ex-diretor da JBS Francisco de Assis e Silva.
Por Renan Ramalho e Mariana Oliveira, G1 e TV Globo, Brasília
O Ministério Público Federal apresentou nesta segunda-feira (25) à Justiça Federal do Distrito Federal uma denúncia contra o ex-procurador da República Marcello Miller, a advogada Esther Flesch, o empresário Joesley Batista e o ex-diretor jurídico da JBS Francisco de Assis e Silva.
A acusação foi apresentada em segredo de justiça, segundo a assessoria de imprensa da Justiça Federal (leia ao final desta reportagem versões dos denunciados).
O Ministério Público Federal afirmou que o ex-procurador Marcello Miller recebeu vantagem indevida de R$ 700 mil para ajudar o J&F (grupo do qual a JBS faz parte) a obter informações para fechar acordo de delação premiada.
Antes de sair da Procuradoria-Geral da República, Miller atuou na Operação Lava Jato, que tem o grupo J&F entre os investigados.
Conforme a acusação do MPF, "Joesley Batista e Francisco de Assis ofereceram promessa de vantagem indevida a Marcello Miller Ester Flesch, para que o primeiro, ainda que potencialmente, praticasse atos de ofícios em seu favor".
Para que eles virem réus, a denúncia precisa ser analisada pela Justiça. O MP pediu que os acusados sejam notificados a apresentar suas versões.
Na semana passada, a Polícia Federal indiciou os quatro por suposta prática de corrupção. Segundo a PF, Joesley e Francisco de Assis, junto com Esther Flesch e a advogada Fernanda Tórtima corromperam Marcelo Miller para obter ajuda no acordo de delação premiada de executivos da J&F – Tórtima, embora investigada, não foi denunciada.
Em depoimento ao MPF em setembro do ano passado, Joesley disse que Marcello Miller não orientou na elaboração de anexos da delação premiada da empresa nem na produção de provas. Joesley também disse que Miller "jamais vendeu facilidades" por ter sido do Ministério Público.
A denúncia
Na denúncia, o MP afirma que Joesley e Francisco de Assis sabiam que Marcello Miller ainda era procurador e que integrou a equipe de Rodrigo Janot. Por isso, diz a denúncia, ofereceram vantagem indevida a Miller.
De acordo com a acusação, Marcello Miller usou conhecimentos e acesso que tinha à Procuradoria Geral da República para obter informações privilegiadas.
Ele teria começado a receber pelo trabalho em fevereiro de 2017, mas só deixou o cargo oficialmente em abril. O valor de R$ 700 mil, conforme o MP, foi caculado pelo pagamento das estratégias de negociação e revisão dos anexos.
Para o MP, Marcello Miller foi o "estrategista" da delação da J&F. "O preço desse auxílio, calculado pelo escritório TRW (R$ 700.000,00), abrangeu aconselhamentos acerca de estratégias de negociação e revisão dos anexos, além da redação final da proposta que foi apresentada, sob a ótica de um Procurador da República que atuava, justamente, nessa atividade de assessoria do PGR e, portanto, tinha nas suas atribuições a celebração de minutas e outros atos no âmbito das tratativas para celebração de acordo de colaboração premiada".
Isso, segundo o texto, "certamente, na visão dos corruptores, constituiu um fator determinante nessa contratação. Portanto, um procurador da República integrante do grupo da Lava Jato foi o estrategista dos acordos de colaboração".
Para o MP, o ex-procurador "serviu a dois senhores" entre fevereiro e abril, a PGR e a J&F.
"No período compreendido entre fevereiro e 05/04/2017, serviu a dois senhores: mantendo-se no cargo de Procurador da República e valendo-se da confiança do Procurador-Geral da República e membro auxiliar do Grupo de Trabalho Lava Jato, orientou a confecção de acordo de colaboração entre o MPF e seus 'clientes', em razão de promessa de pagamento ofertada pelos denunciados Joesley e Francisco."
Conforme o MP, a J&F considerou que a "compra da orientação de alguém com acesso aos integrantes" da Lava Jato, significava um "diferencial necessário para um excelente acordo de colaboração.
A proposta de trabalho da J&F para Marcelo Miller, em 22 de fevereiro, foi condicionada à saída dele do MPF.
No dia seguinte, Miller aceitou a proposta e pediu exoneração do cargo com eficácia a partir de 5 de abril.
Em encontro, ficou acertado que MIller não trabalharia diretamente para a J&F, mas sim para o escritório Trentch Rossi Watanabe, que enviaria fatura de R$ 700 mil para a empresa.
Versões dos denunciados
- Marcello Muller - A defesa do ex-procurador Marcello Miller divulgou a seguinte nota: "A defesa de Marcello Miller esclarece que: 1. A denúncia não consegue especificar que vantagem financeira teria sido oferecida a Miller. Não consegue porque essa oferta simplesmente não existiu. 2. O que Miller recebeu da J&F foi uma oferta de emprego, sem quantificação de valores, e mesmo assim não a aceitou, conforme evidenciado em mensagens de áudio entre Wesley e Joesley Batista, as quais são de domínio público. Miller estranha que esse diálogo não seja mencionado na denúncia. 3. A denúncia não consegue descrever um único ato de solicitação, aceitação ou recebimento de vantagem indevida por Miller. Não consegue porque isso simplesmente não aconteceu. 4. Miller nunca determinou a emissão de nenhuma fatura e não foi sequer informado da emissão de fatura de 700 mil reais à empresa J&F. 5. A denúncia tenta qualificar como relativos à função pública atos que qualquer advogado com alguma experiência poderia praticar. E desconsidera a prova dos autos, que aponta em uma única direção: Miller não utilizou a função pública, da qual já estava em notório desligamento, para nenhuma finalidade privada".
- Joesley Batista - Em nota divulgada nesta segunda-feira (25), a defesa de Joesley afirmou que o empresário jamais ofereceu ou pagou vantagens indevidas a Marcelo Miller e que o escritório do ex-procurador está sendo processado por "má prática profissional nesse episódio". "A denúncia despreza todos os depoimentos e documentos aportados ao inquérito pela própria defesa, utilizando-se de majoritariamente de um procedimento administrativo conduzido de forma açodada pela PGR em setembro do ano passado. Agora, sob o contraditório e ampla defesa, será demonstrado que a acusação não só é descabida, como também descolada de qualquer elemento probatório", disse na nota o advogado André Luís Callegari.
- Esther Flesh - Em setembro de 2017, a advogada Ester Flesch declarou que sempre se pautou pelos mais altos padrões de ética e transparência e que sempre seguiu as orientações do escritório onde trabalhava.
- Francisco de Assis - O escritório Bottini & Tamasauskas, que defende Francisco de Assis, divulgou a seguinte nota: "A defesa do advogado Francisco de Assis reafirma que a J&F contratou o escritório Trench, Rossi e Watanabe - banca até então referência em integridade - para assessorá-la no acordo de leniência. Francisco de Assis não tinha motivos, portanto, para suspeitar de qualquer irregularidade na atuação de Marcelo Miller, sócio do escritório na área de ética e compliance. A defesa de Francisco de Assis reitera ainda que ele colaborou efetivamente com a investigação, deixando claro que jamais discutiu honorários ou pagamentos com ou para Marcelo Miller, tampouco procurou obter qualquer vantagem ou benefício indevido no Ministério Público Federal por meio de Marcello Miller ou por qualquer outra pessoa, exatamente como consta do relatório da Polícia Federal".
Ministro
Nesta segunda, o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, comentou em entrevista a jornalistas a denúncia contra Miller e Joesley.
Segundo ele, se as investigações continuarem, outros ex-integrantes da “antiga cúpula” da PGR também serão denunciados.
"Tenho a convicção que mais gente da antiga cúpula da Procuradoria Geral da República deve explicações e que, se as investigações se aprofundarem, provavelmente eles também serão denunciados”, declarou.
Questionado sobre a quem se referia, Marun afirmou que defende que sejam investigados o ex-procurador-geral da República, Rodrigo Janot, e seu antigo chefe de gabinete, Eduardo Pelella.
Segundo Marun, a denúncia reforça que a delação dos executivos da J&F foi uma “trama sórdida” com objetivo de envolver o presidente Michel Temer.
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Por Aguiasemrumo: Romulo Sanches de Oliveira
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