Nem o inverno trava a fuga de refugiados: todos os dias 4 mil pessoas cruzam o Mediterrâneo para chegar à Grécia.
Se há imagens que ao longo deste ano ficaram na memória de milhões de pessoas, elas estão relacionadas com o drama dos refugiados que, para fugir da guerra, das perseguições e da miséria extrema, tentaram alcançar a Europa em embarcações sem um mínimo de condições de segurança.
Muitos perderam a vida, outros foram separados das suas famílias. Aquela que já foi considerada como a maior crise de refugiados após a II Guerra Mundial, esbarrou, no entanto, na indiferença dos responsáveis políticos dos Estados-membros da UE que em vez de encontrar soluções para resolver este drama humanitário, optaram por erguer muros ao longo das suas fronteiras e adotar um discuro onde a lógica securitária se sobrepôs à solidariedade.
Os números-divulgados pelas Nações Unidas e pela Organização Internacional das Migrações são impressionantes pela sua dimensão e dão-nos conta que ao longo do ano cerca de um milhão de pessoas oriundas sobretudo da Síria, Afeganistão, Iraque Eritreia e, e menor escala, do Paquistão, da Gâmbia, do Sudão, do Mali e da Nigéria, abandonaram os seus países que, mergulhados em conflitos de vária natureza, deixaram de garantir as condições mínimas de estabilidade e perspectivas de futuro aos seus habitantes.
“ Se não fugisse, mais cedo ou mais tarde era morto”, disse um refugiado sírio que hoje vive num centro de acolhimento algures na Europa.
A miséria que é uma forma de morte lenta, é a única coisa que nos resta. Eu e a minha família queremos viver com alguma dignidade
“No meu país, o Afeganistão, não resta nada. A miséria que é uma forma de morte lenta, é a única coisa que nos resta. Eu e a minha família queremos viver com alguma dignidade. Por isso arriscámos à espera que nos deixem entrar”, afirmou, por seu turno, uma jovem.
Manipulação da opinião pública
Estes relatos, espécie de apelos desesperados à compreensão dos decisores europeus, não teve uma resposta objetiva. Antes pelo contrário, os líderes dos países da UE, numa clara tentativa de intoxicar a opinião pública optaram por adiar a resolução do problema com discursos de natureza xenófoba pondo o acento tónico na defesa dos valores ocidentais que poderiam ser postos em causa pela “islamização do continente” e por atos terroristas daqueles que, aproveitando-se deste fluxo para cruzar as fronteiras da Europa, tinham como única intenção levar a cabo atos de natureza terrorista.
Diga-se a este propósito, que após os atentados de novembro em Paris, o primeiro-minstro francês, Manuel Valls afirmou ao jornal alemão “Süddeutsche Zeitung” que “a Europa não pode aceitar mais refugiados", acrescentando "ser necessário um controlo mais rigído das fronteiras europeias.”
Nessa entrevista, Valls disse ainda que “a opinião pública está consciente de que pelo menos dois dos terroristas de Paris entraram na Europa com os refugiados."
Este tipo de comentários que vai pontuando as intervenções dos responsáveis europeus, ao invés de servir uma estratégia comum para pôr fim a esta situação, leva ao extremar de posições por parte de quem, não estando isento de responsabilidades no autêntico “barril de pólvora” em que se transformaram muitos países, pretende somente abrir espaço para um férreo controlo das fronteiras que pode inclusivamente colocar em causa a livre circulação de pessoas no espaço europeu.
Olhar para o lado
Com ficou referido no início do texto, o número de refugiados é avassalador e carece de ações urgente que evitem que esta tragédia ganhe contornos ainda maiores.
a chegada de um milhão de pessoas ao continente europeu durante 2015 significa que este fluxo aumentou cinco vezes em relação ao ano anterior cujo número foi de 216 mil tendo-se registado também mais 400 mortes do que em 2104
Para se ter uma ideia basta atentar uma vez mais nos números divulgados pelas Nações Unidas: a chegada de um milhão de pessoas ao continente europeu durante 2015 significa que este fluxo aumentou cinco vezes em relação ao ano anterior cujo número foi de 216 mil tendo-se registado também mais 400 mortes do que em 2104.
Perante esta situação, e apesar do fluxo de refugiados continuar, aumentando ainda mais o perigo da travessia por mar por causa do inverno, os responsáveis dos 28 países da UE estiveram reunidos em cimeira no passado dia 19 de dezembro tendo-se limitado a manifestar a sua “preocupação” com este problema. As decisões foram adiadas uma vez mais para o início do segundo semestre de 2016.
Nessa reunião, houve, no entanto, um aspeto que mereceu a concordância de todos os responsáveis dos Estados-membros. Esse ponto está relacionado com a necessidade do reforço das fronteiras externas da Europa, única forma, segundo o presidente da Comissão Europeia, Jean Claude Junker de “garantir o espaço de livre circulação na UE criado pelos acordos de Schengen.
Estamos assim perante a criação de uma Europa fortaleza que se fecha perante si própria e aposta na criação de uma polícia de fronteira com cerca de 1500 efectivos com poder para intervir num país mesmo antes de este pedir a sua intervenção o que é considerado como “um passo essencial” para “presevar” a liberdade de movimentos na Europa.
Neste quadro, a Frontex, agência europeia que é responsável pelo controlo de fronteiras da UE, viu já reforçado o seu orçamento para o próximo ano, para recrutar mais guardas e adquirir mais equipamentos para “proteger” as fronteiras externas de Schengen.
Enquanto isso, milhares de refugidos continuam acantonados em diversos pontos da Europa e também no Líbano e na Jordânia com a vida “suspensa”, uma situação que alguns observadores qualificam como uma “hipocrisia” dado que a entrada a conta-gotas não passa de uma “estratégia” que usa o sistema de quotas e uma burocracia infernal para impedir a entrada da maioria destas homens, mulheres e crianças que acabarão por ser repatriados.