A pedido do
Ministério Público Federal (MPF), a
Petrobras informou à Justiça Federal do Paraná que 10 pessoas suspeitas de intermediar pagamentos de propina no esquema de corrupção que atuava na estatal fizeram 2.226 visitas à sede da empresa, no Rio de Janeiro, entre 2000 e 2014. De acordo com os registros da petroleira entregues na última quinta-feira (30), os operadores que mais circularam pela companhia ao longo de 14 anos foram Luis Eduardo Campos Barbosa (727 visitas) e Zwi Skornicki (532).
Campeão de visitas à Petrobras, Barbosa é apontado pelo MPF como sócio de Júlio Faerman, representante da empresa holandesa SBM Offshore, suspeita de pagar propina a funcionários da estatal do petróleo para obter contratos. O ano em que Barbosa mais visitou a empresa foi 2009, quando ele foi 139 vezes à sede da companhia para se reunir, entre outras pessoas, com o ex-diretor de Serviços Renato Duque e com o ex-gerente Pedro Barusco.
Duque e Barusco são réus em processos da Operação Lava Jato que tramitam na Justiça Federal do Paraná. Acusado de receber propina de fornecedores da empresa, o ex-diretor
está preso desde março, em Curitiba. Já Barusco, um dos delatores do esquema de corrupção, está em liberdade.
Em seu acordo de delação premiada,
Barusco acusou o PT de receber entre US$ 150 milhões e US$ 200 milhões em propina oriunda de contratos da estatal. O ex-gerente afirmou que os valores se referem a propina em 90 contratos da Petrobras com grandes empresas fechados entre 2003 e 2013, durante os governos Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff.
Registros das visitas dos operadores da Lava Jato à Petrobras
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OPERADOR
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Nº DE VISITAS
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Luis Eduardo Campos Barbosa
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727
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Zwi Skornicki
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532
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Augusto Amorim Costa
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451
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Shinko Nakandakari
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175
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Guilherme Esteves de Jesus
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135
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Cesar Roberto Santos de Oliveira
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116
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Milton Pascowitch
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60
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Atan de Azevedo Barbosa
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16
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Mario Frederico Mendonça Goes
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13
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Bernardo Schiller Freigurghaus
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1
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O segundo lobista que mais visitou a Petrobras de 2000 a 2014 é o engenheiro Zwi Skornicki, que era o representante oficial no Brasil do estaleiro Keppel Fels. Os procuradores da República afirmam que Skornicki era responsável por repasses ao PT por meio do ex-tesoureiro do partido João Vaccari Neto, preso pela Lava Jato.
Os registros da estatal demontram que Skornicki tinha acesso franqueado aos gabinetes da cúpula da Petrobras. Entre 2006 e 2014, o engenheiro se reuniu com os ex-presidentes da empresa Graça Foster e
José Sergio Gabrielli, com os ex-diretores Renato Duque (Serviços),
Nestor Cerveró (área internacional) e Jorge Zelada (Internacional), além do ex-gerente Pedro Barusco.
No acordo de delação premiada, Barusco afirmou que Skornicki continuou pagando suborno a Duque mesmo depois de o ex-diretor ter saído da Petrobras. Ao todo, contou o ex-gerente, o representante da Keppel Fels teria pago US$ 14 milhões.
Os outros oito operadores que registraram entrada na Petrobras entre 2000 e 2014 foram Augusto Amorim Costa, Atan de Azevedo Barbosa, Bernardo Schiller Freiburghaus, Cesar Roberto Santos Oliveira, Guilherme Esteves de Jesus, Mario Frederico Mendonça Goes, Milton Pascowitch e Shinko Nakandakari.
Amorim Costa é suspeito de ser operador financeiro da construtora Queiroz Galvão. Azevedo Barbosa, de acordo com as investigações, desempenhou o papel de operador de subornos pagos pela Companhia Brasileira de Dragagem.
Freigurghaus, conforme o MPF, representava os Bancos PBK, Royal Bank, Pictec e HSBC em um escritório no Brasil. Dono da empresa GDK, Santos Oliveira é acusado de ser responsável por operacionalizar os pagamentos de propinas a Pedro Barusco.
Esteves de Jesus é suspeito de viabilizar pagamento de vantagens indevidas a Vaccari Neto. Mendonça Goes, conforme os procuradores da República, era o operador das empresas Andrade Gutierrez, Mendes Júnior, Carioca, Bueno Engenharia, MPE/EBE, OAS, Schain, Setal e UTC.
Pascowitch teria atuado como operador financeiro da construtora Engevix e do estaleiro Rio Grande. Nakandakari, segundo o MP, atuou em favor da Galvão Engenharia, da EIT Engenharia e da Contreiras.
Dos nomes apontados pelo Ministério Público como intermediários de pagamentos de propinas na Lava Jato, apenas não há registro, nos documentos entregues pela Petrobras, de visitas de João Vaccari Neto à estatal. Ele é réu em dois processos da Lava Jato e está preso em Curitiba.
Outras visitas
Além dos operadores da Lava Jato, a planilha apresentada pela Petrobras à Justiça Federal também registra, ao longo de 14 anos, a visita à estatal de outros personagens investigados na operação policial, entre os quais o ex-deputado Pedro Corrêa (sem partido-PE). Ele se reuniu na petroleira, entre outros, com o ex-diretor de Refino e Abastecimento Paulo Roberto Costa, demonstram os documentos.
Um dos condenados no processo do mensalão do PT, o ex-parlamentar de Pernambuco está preso em Curitiba por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção que agia na Petrobras. Costa declarou às autoridades que Pedro Corrêa recebeu R$ 5,3 milhões em propinas.
De acordo com os dados fornecidos pela estatal, Corrêa foi nove vezes à Petrobras entre 2003 e 2012. A última visita ocorreu no ano em que o ex-congressista foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por envolvimento no mensalão do PT. Ele foi
condenado a 7 anos e 2 meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-representante comercial da SBM Offshore no Brasil Júlio Faerman também está incluído na lista de pessoas que visitaram a Petrobras na última década e meia. A empresa holandesa admitiu pagamento de suborno a funcionários da petroleira brasileira para fechar contratos de fornecimento de plataformas e outros equipamentos. No ano passado, a multinacional aceitou acordo, com o Ministério Público holandês, para pagar mais de US$ 200 milhões por negociações irregulares que fez no Brasil e em outros dois países africanos: Guiné Equatorial e Angola.
As planilhas de entrada e saída da estatal mostram que Júlio Faerman foi 152 vezes à empresa entre 2003 e 2011. Nessas visitas, ele se encontrou com os ex-diretores Renato Duque (Serviços), Nestor Cerveró (Internacional) e Guilherme Estrella (Exploração e Produção).
O ex-diretor de Gás e Energia Ildo Suer também recebeu visita de um operador da Lava Jato. Ele se reuniu com o Mário Goes.
Funcionário do doleiro Alberto Youssef e apontado pelo MPF como um dos entregadores das propinas, Rafael Ângulo também consta na lista de registros da Petrobras. Os dados mostram que, em 2006, ele entrou duas vezes na empresa para falar com funcionários da companhia de petróleo.
A relação também mostra uma visita do ex-ministro José Dirceu à Petrobras. Em 31 de janeiro de 2003, ano em que assumiu a chefia da Casa Civil do governo Lula, ele se reuniu com o então presidente da Petrobras, José Eduardo Dutra. Conforme os registros, a visita à petroleira durou 5 horas e 35 minutos.
Dirceu é investigado em inquérito da Lava Jato por suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro. Os investigadores querem saber se a JD Consultoria, empresa de Dirceu, prestou serviços a empresas que desviaram dinheiro da Petrobras ou se os contratos eram apenas uma maneira de disfarçar repasses de dinheiro desviado da estatal.
A Petrobras, por meio de sua assessoria, informou que não iria comentar a reportagem.
O advogado Edson Ribeiro, que defende Nestor Cerveró, disse que faz parte da função de um diretor da Petrobras receber visitas institucionais. Com relação ao conteúdo dos encontros, disse que seria preciso verificar com o próprio Cerveró.
Ildo Sauer disse não lembrar ter recebido Mário Goes em seu gabinete na Petrobras, porém, não descartou ter ocorrido a visita. Segundo o ex-diretor de Gás e Energia, ele não negava audiências a ninguém.
O ex-dirigente afirmou ainda que não conhece Goes, mas destacou que, se ele chegou a se reunir com o suposto operador da Lava Jato, o assunto tratado "certamente" não envolveu nenhum "ilícito", pois afirma nunca ter tratado de ilícitos na vida.
A defesa de Pedro Barusco reiterou todas as declarações prestadas no acordo de delação premiada.
O advogado Roberto Podval, que faz a defesa de José Dirceu, disse desconhecer o motivo da visita do ex-chefe da Casa Civil à estatal, contudo, ressaltou que o registro de uma única visita desde 2003, no período em que seu cliente era ministro, prova que o petista não tem relação alguma com o esquema de corrupção.
"Isso só serve para demonstrar a absoluta ausência de qualquer participação nisso", destacou Podval.
O advogado Renato de Moraes, que representa Renato Duque, afirmou em nota que todas as visitas recebidas pelo ex-diretor da estatal para reuniões na Petrobras se deram para tratar de assuntos de interesse e em benefício dos negócios empresa.
Moraes também defende o ex-diretor da Petrobras Jorge Zelada. Em nota, ele disse que o ex-diretor não se recorda de ter recebido Shinko Nakandakari na Petrobras e afirma que todas as visitas recebidas na Petrobras foram realizadas para tratar de assuntos lícitos e de interesse da empresa.
O advogado Antonio Pitombo, que representa Luis Eduardo Campos Barbosa no processo, disse que, como engenheiro especializado em óleo e gás, é "evidente" que Luis Eduardo tinha que ir à Petrobras com frequência. "Quanto mais vezes ele foi, mais ele trabalhou. Essa lista de visitas citada na matéria mistura pessoas de atividades diferentes e sem ligação com o caso", disse.
A defesa de Shinko Nakandakari declarou que o cliente é engenheiro e que é natural que ele tenha ido à Petrobras para reuniões de trabalho.
Em nota, a defesa de Cesar Roberto Santos Oliveira, dono da GDK, afirmou que a empresa presta serviços regularmente à Petrobras há mais 20 anos. Na nota, a defesa explica que a GDK deixou de ser convidada para participar de algumas obras e deixou de receber pagamentos devidos por alguns serviços prestados, "fato que culminou com o pedido de recuperação judicial". "Diante disso, é natural que representantes da GDK se dirigissem à sede da Petrobras para resguardar, dentro da estrita legalidade, os direitos da empresa".
A defesa também diz que a GDK não foi beneficiada por qualquer funcionário da estatal e por qualquer esquema de corrupção.
O advogado Breno Melaragno Costa argumentou que Atan de Azevedo Barbosa foi funcionário da Petrobras durante 18 anos, e que retornou à empresa por conta de amizades que fez por lá. Ressaltou que, em nenhum momento, seu cliente tratou de assuntos ilícitos nessas visitas.
À TV Globo, Zwi Skornicki confirmou as visitas à Petrobras e disse que realizou centenas de reuniões técnicas e comerciais como representante comercial mas que essas reuniões jamais envolveram ator ilícitos.
O G1 e TV Globo entraram em contato com Guilherme Estrella e Paulo Roberto Costa, mas até a última atualização desta reportagem não haviam obtido resposta.
A reportagem não conseguiu localizar Sérgio Gabrielli,
Graça Foster, José Eduardo Dutra, Augusto Amorim Costa, Bernardo Schiller Freiburghaus, Guilherme Esteves de Jesus, Mario Goes e Milton Pascowitch.