Líder do governo na CLDF também deu emprego
para dono de açougue, proprietário de estacionamento e vendedora de
produtos de beleza
16/01/2018 5:21 , atualizado em 16/01/2018 10:12
Do ponto de vista técnico, uma das áreas de maior apelo
social do governo é a Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus). A pasta
é responsável por elaborar e executar políticas de direitos humanos,
antidrogas, de enfrentamento ao tráfico de pessoas e relacionadas ao
direito do consumidor. Todos assuntos delicados, que requerem
profissionais alinhados e, sobretudo, preparados para lidar com os
temas. Mas o responsável por dezenas de indicações no órgão abriu mão de
ocupar as vagas da secretaria com especialistas nesses assuntos e
empregou apadrinhados.
Líder do governo na Câmara Legislativa do Distrito Federal
(CLDF), o deputado distrital Agaciel Maia (PR) indicou para a Sejus um
ex-jogador da seleção brasileira de futebol. Josimar Higino disputou a
Copa do Mundo de 1986. Escalado como lateral direito, ele fez o primeiro
gol daquela edição, defendendo a camisa verde-amarela. Jogou por
Flamengo, Internacional, Fortaleza e Sevilha (Espanha), e encerrou a
carreira no Baré, de Roraima, em 1996. Mas o clube que o projetou no
futebol foi o Botafogo.
Na Secretaria de Justiça, Josimar foi lotado como assessor especial do
gabinete. Ocupa um cargo em comissão DFA-16, cujo salário é de R$
3.554,63. A nomeação do ex-jogador foi publicada no Diário Oficial do
Distrito Federal (DODF) em 8 de dezembro do ano passado. A indicação
dele pelo líder do governo é política, campo em que o ex-atleta tentou
se aventurar em 2014, quando se lançou a deputado estadual por Roraima,
com o nome de guerra “Josimar da Seleção”. Nas redes socais, o ex-craque
demonstra intimidade com seu padrinho no DF e exibe fotos em peladas ao
lado de Agaciel Maia.
Assim como Josimar, Agaciel também se tornou um personagem
conhecido pela Nação. No caso do deputado, pela bola-fora no escândalo
dos atos secretos. Ele foi acusado de, entre 1995 e 2009, ter mantido
sob sigilo despachos administrativos do Senado Federal, a fim de
favorecer servidores e atender a interesses políticos, como encobrir
casos de nepotismo e nomear apadrinhados de políticos.
De açougueiro a vendedora de produtos de beleza
Josimar Higino não é o único convocado para o time da
Secretaria de Justiça e Cidadania, aparentemente, sem afinidade com os
assuntos da pasta. Dono de açougue, sócio de estacionamento, vendedora
de produtos de beleza e proprietária de empresa de câmeras de
monitoramento estão entre os escalados para a equipe de formulação das
políticas públicas da Sejus.
Eles integram a lista de 86 nomeados para diversos cargos
na pasta em 8 de dezembro de 2017, ainda na gestão de Zélio Maia da
Rocha, que ficou na função apenas 37 dias.
O atual secretário é Francisco de Assis da Silva. Ele assumiu o posto
em 28 de dezembro. Ambos tiveram as bênçãos de Agaciel Maia, que atua na
Câmara Legislativa como um guardião dos interesses do governo.
Entre os casos que chamam atenção, está o de uma sócia da
empresa Recarga Real Web Serviços Ltda. Rosilene Pereira da Costa é dona
da firma, a qual exibe capital social de quase R$ 1 milhão. Mesmo
assim, acabou nomeada para a pasta com um DFA-14, cujo salário para
exercer a função de assessora jurídico-legislativa é de R$ 2.937,71.
Ao
Metrópoles, ela admitiu a indicação, mas
afirma nem sequer ter chegado a tomar posse. “Entre ser nomeada e tomar
posse, existe uma distância muito grande”, disse Rosilene. Como se
fosse o movimento mais natural do mundo – ter o nome publicado em diário
oficial para cargo de confiança –, a empresária conta que, mesmo
nomeada, rejeitou o cargo porque queria continuar à frente de sua
empresa.
Questionada por que teve o perfil cotado para a função,
já que atua em campo absolutamente distinto das necessidades da
secretaria, Rosilene se calou: “Não sou obrigada a falar sobre isso”.
Conversa para boi dormir
Ainda segundo a avaliação de quem toma as decisões na Sejus, um
açougueiro também reúne credenciais para tratar do escopo de assuntos
sob o guarda-chuva da Secretaria de Justiça, como, por exemplo, o
enfrentamento ao tráfico de pessoas.
Lúcio Henrique de Moraes era, até pouco tempo, proprietário
de uma boutique de carnes com capital de R$ 60 mil, em Sobradinho. Ele
foi nomeado para um DFA-14. A reportagem ligou no estabelecimento
comercial e não conseguiu contato. Mas, segundo um homem que preferiu
não se identificar, Lúcio recentemente vendeu o açougue para o cunhado.
O cabide de empregos da Secretaria de Justiça e Cidadania
serviu ainda para acomodar Geraldo Cordeiro Lopes Filho. Ele é sócio de
um grande estacionamento e um lava jato na QI 5 do Lago Sul, o JK. Mas,
segundo a nova configuração do organograma do Governo do Distrito
Federal (GDF), vai conciliar seu negócio na iniciativa privada com a
função de assessor especial do gabinete, em que os vencimentos são de R$
2.937,71 (DFA-14).
Na tarde desta segunda (15/1), a reportagem foi ao estacionamento de Geraldo e confirmou que ele é o dono do estabelecimento.
Para lidar com vítimas de violência e o combate às drogas no
DF, o líder do governo na Câmara Legislativa indicou quatro mulheres.
Em comum, elas exibem uma excentricidade. Colocaram como foto principal
de suas contas pessoais no Facebook uma mensagem de apoio ao deputado
distrital, com os seguintes dizeres: #SomosTodos Agaciel Maia.
Kelly Abrantes Santos, Rita Pereira de Jesus e Neila
Damasceno Abadio recebem proventos de R$ 2.241,74 como assessoras na
Subsecretaria de Políticas para Prevenção ao Uso de Drogas e Vítimas de
Violência.
Beleza de cargo público
Já Letícia dos Santos Marques é estudante de direito e foi
nomeada na Gerência Psicossocial, da Subsecretaria de Políticas para
Justiça, Cidadania e Prevenção ao Uso de Drogas. Para a função, a jovem
recebe R$ 2.241,74. Nas redes sociais, no entanto, ela informa que
trabalha como consultora de beleza da Mary Kay.
Assim como colegas, Letícia foi nomeada no dia 8 de dezembro
de 2017. Antes da indicação política, a jovem usava o Facebook para
exibir postagens pessoais. A partir de 23 de novembro, dias antes de sua
nomeação, a estudante passou a publicar sistematicamente posts
relacionados às atividades de Agaciel Maia, até mensagens de “Feliz
Natal” vinculadas ao deputado.