Mais uma vez a situação política nacional exibe o “decifra-me ou devoro-te” da esfinge. A interminável lista multicolor de políticos que governam para os capitalistas citados acrescenta incertezas ao acontecer à véspera de votações importantes para os empresários no congresso, em especial a reforma da previdência. Isso também às vésperas de um novo dia de paralisação nacional chamado pelas centrais sindicais. Para onde vai o Brasil? Primeiras reflexões.
Rio de Janeiro | @leandrolanfrdi
Sob o impacto de tantos ministros com inquérito pode o governo Temer ficar paralisado e não conseguir aprovar seus ataques? Como reagiriam seus “votantes” da FIESP, da mídia, do imperialismo que o colocaram no poder para realizar sua “Ponte para o Futuro”? A Lava Jato avançará até o fim? Será cortada pela “casta política” com o aval do STF para garantir os ajustes? Como reagirá a classe trabalhadora com seus direitos trabalhistas e previdenciários ameaçados por uma casta de políticos mais sujos que pau de galinheiro?
Com as limitadas pretensões do que é possível pensar nas primeiras horas de publicada a lista Janot-Fachin, é bom traçar hipóteses sobre a política dos diferentes agentes na crise nacional e traçar alguns cenários, mesmo que de curto prazo. Entender o terreno é fundamental, pois a renovada crise política abre maiores possibilidades de derrotar os ataques e Temer.
Mudanças bruscas, marca da instabilidade de uma crise orgânica prolongada
Todo o centro da conjuntura estava marcado pelas ofensivas contra os direitos trabalhistas e a possibilidade de uma efetiva resistência dos trabalhadores. A entrada em cena dos trabalhadores no dia 15 de março, mesmo com todos os limites colocados pelas direções sindicais que deram, previamente, meses de trégua, e deram outros 45 dias de trégua depois, apontava e segue apontando nesse caminho e possibilidade.
Temer e os congressistas sentiram essa ameaça e dia atrás dia buscam oferecer novas maneiras de passar a reforma da previdência, garantindo duas premissas fundamentais: trabalhe mais anos e ganhe menos. Enquanto essa que é a “mãe de todas as batalhas” está com duras escaramuças, vem aplicando outros ataques, como a terceirização irrestrita e a iminente votação da reforma trabalhista.
Toda a política prévia ao dia 15 de março parecia marcada pelos jogos do palácio, das redações e da toga. Aquele momento até o dia 28 de Abril parecia marcado pela força que teria as mãos sujas de giz e graxa. Agora eis que novos problemas surgem.
Há meses a Lava Jato e toda ala do regime que quer algo como uma “mãos limpas” nacional parecia acuada. Moraes nomeado ao STF, Janot sendo obrigado a barganhar uma ressalva no projeto de “abuso de autoridade”, não podendo manter uma relação de forças favorável às “dez medidas” de seu MPF e da “República de Curitiba”. Ontem a imagem mostrada é outra. De FHC a Lula, 12 governadores, mais de um terço dos senadores, quase um terço do gabinete de Temer todos tendo que se explicar.
Ainda não se sabe o impacto nas “reformas”. Por enquanto o único impacto que já ocorreu foi o adiamento do pacote de ataques aos estados, do qual Pezão depende para avaliar sua situação no Rio.
Quanto os processos e os vazamentos cuja mídia escolhe que ocorram impactarão no que a classe trabalhadora processa de sua visão sobre os ataques e sobre os partidos políticos? E qual relação disso com o clima e contundência do dia 28? Certamente, o fosso entre representantes e representados só aumenta. E, não se vislumbra uma nova hegemonia terminada a lulista, do consumo, crédito, e conciliação de classes, do “todos podem ganhar aos poucos”, que explodiu em junho de 2013 quando essas expectativas “gradualistas” se chocaram com a situação da economia. Com tantos ataques, com golpe institucional, com o Lula trazendo algumas marcas de recuperar força, mas ainda muito debilitado nas classes médias, com delações sem fim, qual hegemonia é possível? Nessa instabilidade, como já pontuamos outras vezes, cada ator fundamental tem o poder da dar novas marcas na conjuntura. Determinadas decisões do STF, de Moro, de Temer, do Congresso, de Janot, do tucanato, de Lula, mudam “tudo” da noite para o dia.
Mais do que nunca, quando tudo isso se combina com a possibilidade e necessidade da luta contra os ajustes, entender a política desses variados atores é chave. Em meio à renovada crise política aumenta a possibilidade dos trabalhadores derrotarem os ataques, e mais, dos trabalhadores se oferecerem como sujeitos e portadores de uma resposta independente.
Lava Jato, o desejo Mãos Limpas e a relação não tão secreta com os ajustes
A República de Curitiba se imagina redentora do país. Com sua seletividade, estampa qual político, qual partido e qual empresas, são idôneas e quais não. Enquanto salvam as empresas imperialistas citadas na Lava Jato, vão afundo em outras, o mesmo vale para distintos processos. Apesar dessa seletividade declaram repetidas vezes como se veem em uma cruzada da probidade. Eleitos por ninguém, com supersalários e privilégios, seriam os redentores? Às vezes falam em voz alta, gostariam de fazer como na Itália, afetar profundamente todo regime político.
O STF e a mídia, no entanto, nem sempre compactuam com esse interesse, e dão corda e tiram corda conforme jogos políticos determinados, via de regra, conforme esses jogos ajudam a garantir os avanços dos ataques à classe trabalhadora. Cunha foi sistematicamente blindado até o impeachment, para que um governo de ajustes mais duros que o de Dilma fosse colocado no poder. Terminado isso, foi punido. Renan, ameaçado incansavelmente enquanto havia demoras e dúvidas na PEC 55, ao garantir sua votação sumária foi mantido no poder do Senado. Outra “prova” da relação Lava Jato e ajustes, está no Rio de Janeiro. No estado com a crise econômica mais aguda e com os governantes enfrentando as piores dificuldades para aprovação dos ajustes, é justamente aquele onde mais corda foi dada ao judiciário para atacar os políticos. E não só o entorno Pezão-Cabral é atacado, Picciani, o poderoso líder da ALERJ também é mais ameaçado quando desafia os ditames do pacote de privatização e sequestro de direitos.
A nova ofensiva da Lava Jato com a lista Janot-Fachin justamente agora, não estaria sincronizada com as dificuldades da aprovação da Reforma da Previdência? Não poderia ser um “aviso”, um “chamado de atenção” para que aprovem rapidamente os ataques? Com essa hipótese deve-se esperar um foco nas manchetes: as delações de Renan e outros neo-opositores no PMDB, ou de ministros que estejam “cedendo” demais nos ataques.
Outra hipótese, não excludente, aventada por setores ligados ao PT é que a Lava Jato, com anuência do STF [vejamos – digo eu – Jobim não é pouco influente no STF], ao atingir todos partidos diminuiria sua aparência de seletividade e poderia ter maior credibilidade para condenar Lula. De condenar Lula a impedir sua candidatura corre um mundo de apelações jurídicas e cenários na crise nacional, sem esquecer que importantes políticos (o mais recente sendo Jobim) e empresários gostariam de tê-lo à disposição para conduzir os ajustes, mesmo que em outro ritmo e forma que os defendidos por Temer.
Ou, como terceira hipótese, não havendo os ataques que desejam, seriam as feras de Janot e Curitiba autorizadas a ter um andor mais “Mãos Limpas” de verdade?
De todo modo, do ponto de vista da FIESP, da grande mídia e do imperialismo, as três hipóteses dependem mais que tudo dos ataques e da correlação de forças, e não de nenhuma consideração do que é justo ou constitucional, e o STF tem se especializado em interpretar, curvar, entortar e rasgar a própria constituição desses podres poderes.
A mídia, mesmo de posse de tantas delações, tem repetido pelos cotovelos que o que se diz em Brasília é “tudo bem vamos seguir as votações”. Nenhuma matéria sobre a reação popular, os temores, querem com essa “normalidade-ameaça” passar o recado aos políticos: sua prioridade são as aposentadorias e a CLT.
Reações da “casta política” contra a “casta da toga”?
Um novo ingrediente no cardápio da crise política nacional pode se mostrar. Uma renovada reação do que viemos chamando da casta política (pluripartidária) contra a casta da toga (pluri-institucional), da anistia ao caixa dois a medidas mais drásticas.
Ambos “partidos” patronais contam com membros nos dois poderes, com parlamentares pró-Lava Jato e um Gilmar Mendes sempre propenso a ajudar a casta. Em um conflito onde pouco importa as leis, o combate à corrupção e o abuso de autoridade, renovados conflitos institucionais poderiam agregar dificuldades na aprovação dos ataques de Temer.
Os patos da FIESP andam silenciosos. Skaf delatado e as tropas de choque, MBL e consortes tem servido para tentar amedrontar professores em suas salas de aula, mas pouco para colocar massas nas ruas. Se os ajustes estiverem em risco, a mídia voltará a lhes dar um apoio?
Maiores dificuldades e possíveis crises no governo Temer
Temer, sem popularidade e sem voto popular, depende do sufrágio do “voto” dos que querem a Reforma da Previdência, fim da CLT, etc. Não garantir seu programa, a “Ponte para o Futuro”, colocará em risco seu governo. O primeiro passo foi colocar 9 de seus ministros em risco com os inquéritos. Basta Janot transformar os inquéritos em processos, que Temer deveria afastá-los do cargo, segundo promessa, ou enfrentar novo desgaste se não fazer isso.
Sem dúvida uma certeza da conjuntura é o aumento da debilidade do governo, podendo evoluir a verdadeiras crises de agonia, o cenário “Sarney” do qual tantos analistas falam na grande mídia. Frente “vossa excelência a rua” como disse o colunista do Globo Bastos Moreno, e as ameaças-riscos da toga e mídia, ao mesmo tempo.
Maiores possibilidades de derrotar os ataques e Temer e enfrentar todo esse podre regime
A raiva dos ataques e a disposição de luta se fizeram sentir no dia 15 de março. As grandes centrais sindicais, no entanto, concederam uma trégua de 45 dias para que o governo seguisse outros ataques e instalaram uma “ressaca” na classe trabalhadora. A Força Sindical faz isso porque negocia os ataques, e tem seu presidente na lista Janot-Fachin por ter recebido propina para garantir nada menos que o fim de uma greve. A CUT e CTB limitam as ações para se encaixar em seus planos eleitorais com Lula. Uma verdadeira auto-organização, e uma ação forte e coordenada da esquerda, como proposto por Marcelo Pablito nesse chamado pode ser o que libere algumas forças na classe trabalhadora para impor a essas mesmas centrais que o dia 28 seja uma efetiva paralisação, e que dela se depreenda um plano de lutas para uma verdadeira greve geral que derrote os ataques e traga abaixo o governo Temer, o que os renovados aspectos de crise política facilitam. A vitória nesse plano “econômico” e do governo exigiria avançar a maiores questionamentos.
Como sempre os capitalistas tratam de encontrar manobras para impedir tal desenvolvimento, eleições entre elas. Com tanto desgaste dos políticos, não podemos deixar nas mãos da elite, reacionários do Estadão e similares o questionamento à Constituição e seus podres poderes. O Estadão a questiona para retirar tudo que dela tenha cheiro de progressista e impor da forma mais antidemocrática possível uma nova constituição ao sabor dos interesses dos ataques que defendem, chegam a colocar na pena de seus analistas a proposta de “reforma política” e “constituinte” por notáveis, e não feita pelo povo, como rezam as cartilhas burguesas sobre a democracia burguesa.
Por isso o MRT defende impor com a força da mobilização uma Constituinte completamente democrática e soberana para que todos grandes temas nacionais possam ser debatidos e assim contribuir para que a classe trabalhadora imponha nesse processo um programa para que os capitalistas paguem pela crise e avance na perspectiva de um governo operário de ruptura com o capitalismo.
A conjuntura coloca novos desafios, muitas dúvidas, mas também uma renovada possibilidade e necessidade de que a classe trabalhadora tenha uma intervenção independente.