POLÍTICA INVESTIGAÇÃOHÁ 57 MINSPOR FOLHAPRESS
Três anos depois de deflagrada a Operação Lava Jato, brechas legais e a falta de transparência na origem do escândalo continuam intocadas, ampliando as chances de um esquema parecido de desvio de recursos públicos voltar a se repetir.
A Folha de S.Paulo ouviu alguns dos principais envolvidos na investigação (força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, o órgão de inteligência financeira do Ministério da Fazenda, a Petrobras e o Banco Central) para apontar o que mudou desde março de 2014.
Um dos buracos que persistem, por exemplo, é a relação de congressistas com lobistas, que funciona sem qualquer controle.
O lobby no Congresso é uma caixa-preta. Mesmo após a Lava Jato, Senado e Câmara não chegaram a qualquer iniciativa para alterar procedimentos sobre o comportamento dos parlamentares.
As investigações mostraram que lobistas como Fernando Baiano e Cláudio Melo Filho, da Odebrecht, tinham acesso livre às dependências da Casa e estavam desobrigados de declarar para quem trabalhavam, o local das reuniões, qual a matéria específica do seu trabalho (como projeto de lei ou medida provisória) e com quais parlamentares tratavam.
Da mesma forma, todos os parlamentares brasileiros são desobrigados de informar com quais lobistas se reúnem e o objetivo das conversas.
Para o coordenador da Lava Jato no Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol, esse ponto é apenas uma das mudanças que o Congresso deixou de fazer.
Ele menciona as penas para os casos de corrupção, que considera "piada de mau gosto". "As penas são inadequadas e mais, raramente se chega a essas penas. O sistema recursal é um cipoal, praticamente infinito, que permite perpetuar o processo até que aconteça a prescrição", diz.
Desde que a Lava Jato foi às ruas, também continua baixa a transparência dos atos do presidente, diretores e executivos da Petrobras, cujos compromissos não eram divulgados pelo menos até a semana passada.
A Lava Jato mostrou que gestores da companhia, como Paulo Roberto Costa e Pedro Barusco, mantinham conversas frequentes com parlamentares sem que fossem obrigados a informar esses contatos publicamente.
O diretor de Governança, Risco e Conformidade da Petrobras, João Adalberto Elek Junior, menciona "assuntos estratégicos" para contemporizar sobre a falta de transparência das agendas.
"Estamos trabalhando em como fazer um uso melhor de agenda. Existe um regramento para isso", disse. "Agora, a gente sempre tem aquela preservação da agenda quando a gente trata de um assunto de natureza estratégica".
No tema da contratação de obras civis, a Petrobras continua seguindo regramentos internos próprios, como um decreto de 1998, para tocar seus processos de contratação. A empresa se recusa a adotar a lei das licitações, praticada pela administração pública em todo o país.
Em depoimento à Lava Jato, Paulo Roberto Costa explicou que, como diretor, tinha poderes extremos de convidar ou desconvidar empreiteiras para entrar no "clube", o cartel que pagava milhões de reais em propina.
Assim, um diretor tinha a capacidade de prejudicar empreiteiras que não quisessem pagar o suborno, bastando que as retirasse da lista de possíveis convidados.
A Petrobras argumenta que houve um reforço no sistema interno desse tipo de decisão. "Esse grau de flexibilidade que um diretor poderia ter no passado, de tomar decisões em caráter individual, foi fortemente combatido", disse Elek. "Agora as decisões são submetidas a um comitê."
Sem amarras
No âmbito do sistema financeiro, continua sem qualquer amarra o sistema de remessa de dólares para o exterior por meio de contratos de câmbio. O doleiro Alberto Youssef enviou pelo menos US$ 234 milhões sem ser incomodado, em cinco anos. Os contratos eram fictícios.
O sistema não mudou e, para Banco Central e Coaf (órgão do Ministério da Fazenda), deve continuar como está.
Ambos entendem que o mercado não deve sofrer restrições mas, uma vez detectada a irregularidade, a ação punitiva deva ser dura. O BC diz em nota que "mantém permanente monitoramento e fiscalização do mercado de câmbio" e que detectou em 2014 "operações suspeitas" que foram atacadas em 2015. Com informações da Folhapress (Rubens Valente)