Governador defende pacto para evitar pauta-bomba no Congresso e quer transformar a Terracap numa grande imobiliária nacional
Depois de um conturbado primeiro semestre, o governador Rodrigo Rollemberg parece ter encontrado serenidade. Recebeu o Correio na residência oficial de Águas Claras após um dia de reuniões, uma delas com a presidente Dilma Rousseff e governadores, aparentando uma tranquilidade pouco vista desde que assumiu o governo com um rombo de R$ 3 bilhões. Em quase duas horas de conversa, indicou os caminhos percorridos em busca de recursos para o DF, disse que é preciso levantar o astral de Brasília e afirmou que não há espaço para a aprovação de projetos que contrariem os interesses econômicos do país, a chamada pauta-bomba. Pregou a paz na política, mas foi categórico ao afirmar que a atual crise significa o fim de um ciclo no Brasil. Daí vão emergir novas lideranças e será inviável eleger um novo presidente petista, acredita. Sobre aliados, elogiou a ajuda do tucano José Serra. Já o senador José Antônio Reguffe, do PDT… “É um bom amigo, mas tem um jeito muito particular de fazer política. Faz muito a política sozinho.”
Como foi a reunião com a presidente Dilma, alguma notícia boa para o Distrito Federal?
Tem uma coisa em que estou bem interessado, o projeto que permite utilizar os depósitos judiciais para pagamento de precatórios. A maioria dos governadores foi a favor, ela disse que está disposta a sancionar. Mas alguns governadores, especialmente os da Bahia e da Paraíba, fizeram leis estaduais mais abrangentes. A tese inicial era vetar e aprovar uma medida mais ampla. Mas viu-se que não era possível porque se trata de uma lei complementar. Então, ela falou: vocês decidam até 5 de agosto. Ficamos de fazer uma comissão, Brasília vai participar.
Quer dizer, será possível usar esse dinheiro para outras coisas, é isso?
A proposta de José Serra diz que pode usar depósitos judiciais para pagamento de precatórios em primeiro lugar. Só pode pagar outras coisas e pagar todos os precatórios. O que Bahia e Paraíba querem fazer? Eles querem pagar outras coisas logo. Aprovaram leis estaduais nesse sentido e estão em dúvida, achando que é melhor a presidente vetar esse projeto. Eles queriam que ela vetasse e encaminhasse imediatamente um projeto ou uma medida provisória ampla, que eu toparia. O problema é que não dá para ser medida provisória, porque é um projeto de lei complementar. Minha expectativa é a de que ela sancione. Isso para nós é importante.
Quanto tem para o DF?
Em torno de R$ 20 milhões por mês, que é quanto pagamos de precatório.
No fim do ano, haveria então R$ 120 milhões a mais para pagar a folha, por exemplo?
Faltam cinco meses para terminar o ano. Acredito que, sancionado, para começar a usar, talvez consigamos em três meses. Tem que ver que, se tem que regulamentar internamente, no máximo uns quatro meses. Mas é ótimo. Para quem está fazendo conta todos os meses, tudo é bom, ontem estivemos com Nelson Barbosa (ministro do Planejamento) e foi uma conversa boa.
Alguma perspectiva de mais recursos?
A gente foi discutir Terracap. Temos uma tese de que estamos ganhando na Justiça uma lei que aprovamos na Câmara, que o Levy insistiu em vetar e vetou, a imunidade tributária recíproca. Na Terracap, a gente tem 51%, a União, 49%. Não cobramos impostos da Terracap, IPTU, por exemplo. Mas a União cobra Imposto de Renda. Queremos imunidade recíproca. Se a gente não tiver que pagar imposto da Terracap, 2014 e 2015 juntos dão algo em torno de R$ 300 milhões. Outra coisa é que a gente soube que a União vai vender um conjunto grande de imóveis. Queremos que a Terracap seja a operadora dessas vendas porque isso traz um percentual para a Terracap.
São imóveis só em Brasília?
Não, no Brasil todo. Ele está entre Caixa Econômica Federal e Terracap. O ministro disse que uma parte deixaria para a Terracap vender. A empresa tem expertise e competência para atuar no Brasil todo. Quanto mais para a gente, melhor. É uma empresa da qual o governo tem uma parte, e ela é feita para isso. Receberia uma corretagem.
E o pedido da diferença do fundo constitucional?
Está sendo analisado pela equipe técnica da Secretaria do Tesouro. Tenho certeza de que temos direito. É muito claro que temos direito. Não sei se o governo tem capacidade de pagar, porque a União está com dificuldades de fato. Estão com dificuldades de fazer 0,15% de superavit primário. A lei é clara: diz que você recebe um percentual da Receita Corrente Líquida efetivada. E estamos recebendo pela previsão de receita corrente líquida, quando o Orçamento é feito. O efetivado nos últimos anos tem sido maior do que o previsto, então aquela diferença teria que ter sido acertada ano a ano.
E o pagamento seria retroativo?
Sim, isso é um fundo. Dá R$ 1 bilhão nesse período todo. Corrigido, R$ 1 bilhão e 300 milhões.
Essa crise deste segundo semestre estaria resolvida?
Se tivéssemos todas essas coisas aí, resolveria nosso problema deste ano e a gente chegaria ao fim do ano com tranquilidade, pagando salário, fornecedor, prestador de serviço, as despesas de 2015 equilibradas. Teríamos o passivo de 2014 e 2016. Mas, nesse ambiente (de crise econômica), sabemos que não vamos ter isso. O fundo é uma discussão importante, porque, a partir do ano que vem, ou de algum momento, podem vir parcelas dele, já que temos o direito. Essa questão da Terracap pode ensejar uma negociação. Buscamos acordos em várias frentes, essa lei dos depósitos judiciais é mais uma em que estamos trabalhando, securitização, venda de terrenos, vamos encaminhar o projeto. Uma das ideias é que, em parte desses terrenos do GDF, o comprador possa pagar com a sua dívida. Por exemplo, ele tem um dinheiro a receber do GDF, paga parte (abatendo) da dívida e parte em dinheiro.
No almoço da Lide, perguntaram em quanto tempo dava para equilibrar as contas. O senhor respondeu: “depende da Câmara Legislativa”. O que vai de projeto para a Câmara, além de obras e edificações no sentido de ampliar a arrecadação?
Estamos trabalhando algumas alternativas, como a permissão para vender o conjunto de terrenos. Não é uma coisa simples, não sei se vai imediatamente, alguns têm que fazer audiência pública, que é o da cobrança de preço por ocupação de área verde, de área pública. Então, são alternativas capazes de fazer mais recursos.
E aqueles que foram retirados no primeiro semestre, aumento do IPTU?
Aumento do IPTU, em algum momento, a gente quer voltar. Na verdade, não é aumento. É correção do valor venal. Há algo que a gente precisa refletir: todo mundo com quem você conversa, de fora, deputados, governadores, prefeitos, as pessoas ficam impressionadas como se paga pouco IPTU no DF. Outro dia, o (José) Serra (senador do PSDB de São Paulo) me ligou. Ele esteve comigo, conversando sobre a situação do DF. Examinou a composição do Orçamento, me ligou e falou: aqui vocês recolhem muito pouco de IPTU. Brasília tem 100 mil imóveis a menos do que Belo Horizonte. Arrecadamos R$ 500 milhões e pouco por ano de IPTU, enquanto Belo Horizonte arrecada R$ 2 bilhões e pouco.
Por que essa diferença tão grande?
Porque a nossa alíquota é pequena e há muitos anos não se atualiza o valor venal dos imóveis. Então, você tem imóvel de R$ 1 milhão que está pagando por R$ 200, 300 mil.
O Serra analisando o Orçamento, governador? O senhor pediu que ele desse uma olhada?
O Serra tem sido uma pessoa muito próxima dos governadores, porque tem se debruçado sobre essa questão do pacto federativo. Essa lei de que a gente está falando, dos depósitos judiciais, quem fez foi ele. Ele me fez uma visita no gabinete, supergentil. Foi aquela em que eu disse que ele tinha sido o melhor ministro da saúde e ele respondeu que até hoje tem medo de sangue e não sabe a diferença de um vírus para uma bactéria. Aí, eu falei da situação financeira do DF, ele se interessou e se colocou à disposição. Falei das nossas ideias. Temos R$ 625 milhões de compensação previdenciária a receber do Ministério da Previdência. O governo reconhece, o Gabas (ministro da Previdência) reconhece, mas não paga por causa da situação. Na reunião dos governadores com Renan Calheiros e Eduardo Cunha, surgiu a ideia de fazer um projeto que permitisse a utilização desses recursos para o pagamento do serviço da dívida (juros), para ir amortizando. Serra pediu que levasse à assessoria dele, para que fosse preparado. Ele tem sido muito interessado.
Ele te convenceu a aumentar o IPTU?
No início do ano, tínhamos mandado uma proposta que não é de aumento, a gente não mexe na alíquota do IPTU. É de atualização do valor venal dos imóveis.
Esse projeto vai voltar para a Câmara Legislativa?
Estamos avaliando. A cidade tem que fazer esse debate.
Essa conversa com Serra influenciou ainda na escolha do secretário de saúde, com perfil mais gestor, menos político?
Não assim… diretamente. Isso estava dentro da discussão que a gente já vinha fazendo, da necessidade de um gestor que pode ser até um médico. Desde que seja um gestor, que é algo importante. A saúde precisa de um avanço significativo na gestão. Na verdade, o Serra, nesse dia, recomendou um médico, que tem nos ajudado muito desde o início do governo, que ele (Serra) considera uma pessoa brilhante e que eu considero um dos melhores do Brasil, o doutor Renilson, do Hospital da Criança. Hoje, há três médicos que têm ajudado a pensar a saúde no DF, muito qualificados: Dr. Renilson, hospital da Criança; Dr Armando Raji, secretário de Saúde de Curitiba; de Sorocaba; foi diretor do HUB, e o dr. Sadi, que criou o fundo nacional de saúde. São os conselheiros da saúde.
É a área que mais preocupa?
A Saúde é o grande desafio, porque é uma área muito grande. Quando a gente começa a compreender a Saúde, percebe que ela tem peculiaridades que nenhuma outra tem. A escola, 7h da manhã abre e fecha às 6 da tarde. Se tiver expediente à noite, fecha às 22h, fecha sábado e domingo, tem férias. Hospital é 24 horas por dia, 365 dias por ano. Então, quando a gente começa a pensar em 5 mil médicos, escalas, tem que ter médico o dia todo, todos os horários e especialidades, sábado, domingo. É um sistema extremamente complexo. A crise na saúde é muito grave. Além dos problemas concretos do dia a dia, temos uma necessidade orçamentária de R$ 400 milhões para cobrir o custeio até o fim do ano. Estamos falando de orçamento para comprar remédios, insumos, para fazer funcionar UTIs, para manter equipamentos, para salvar vidas”.
Fonte: Correioweb – 02/08/2015