Foi na relativa segurança do campo de refugiados de Khanke, no Iraque, que duas jovens da etnia Yazidi relataram aoMailOnline como foram feitas prisioneiros pelo Estado Islâmico e o que viveram antes de conseguirem fugir.
Quando são retiradas das suas casas, as mulheres yazidi - minoria religiosa que tem sido perseguida pelo Estado Islâmico (EI) - são vendidas, sobretudo para servirem de escravas sexuais a combatentes do EI. Reehan (nome ficítico), uma das jovens, de 19 anos, foi vendida a um combatente iraquiano de origem turca de 50 anos. Tornada escrava, ficou presa durante 10 meses. Ao início tentou resistir às violações mas quando o homem bateu no seu filho, de um ano, desistiu de o fazer.
"Eu concordei com tudo o que aquele homem queria de mim pelo bem-estar do meu filho", recorda, ao MailOnline, com o bebé no colo. E acrescenta que quando tentou questionar a crença do agressor ele gritava, dizendo que "o comércio sexual das mulheres yazidi é permitido de acordo com o Islão".
Durante dez meses de constantes abusos, Reehan foi perdendo a esperança de conseguir fugir. Sem vontade de viver, conta, só não acabou com a própria vida por causa do filho. Seria vendida mais duas vezes, tendo ido para Mossul e, depois, para Raqqa - proclamada capital do EI na Síria. Ficou 20 dias nesta nova casa com mais duas escravas yazidi, uma jovem de 22 anos e outra de 15. Pouco tempo depois uma mulher mais velha e a sua filha de cinco anos juntaram-se ao harém de escravas sexuais. Foi aqui que teve lugar o episódio que a convenceria de que tinha de arriscar tudo e fugir: "Ele entrou em casa e apontou primeiro para a mãe e depois para a filha", descreve. "Depois levou-as para o quarto e violou a mãe antes de abusar da filha."
Quando decidiu fugir, Reehan roubou um nikab (véu usado por algumas mulheres muçulmanas) e nunca mais voltou àquela casa. Um sírio deu-lhe abrigo durante uns dias e concordou levá-la, com o filho, além da fronteira a troco de 15 mil dólares (mais de 13,5 mil euros). A mãe, a partir do campo de refugiados, com ajuda de organizações de auxílio humanitário, conseguiu o dinheiro. O homem cumpriu o acordo e levou-os para Fish-Khabur na fronteira do Iraque com a Síria. Mas o pesadelo continua, agora de outra forma: O seu marido, o seu pai e as suas duas irmãs continuam reféns do EI.
No campo de refugiados de Khanke, vivem dezenas de milhares de desalojados, sobretudo em fuga das barbaridades levadas a cabo pelo autoproclamado Estado Islâmico. Muitas mulheres deste campo já foram escravas sexuais dos jiadistas. Barfo, nome fictício para proteção da sua identidade, foi mais uma das muitas mulheres vítimas dos soldados do califado. Tem 25 anos, vive ao lado de Reehan em Khanke e partilhou a sua história também com o MailOnline.
Foi no dia 3 de agosto que um grupo de homens de preto invadiu Sinjar, cidade no norte do Iraque, e a levaram de sua casa. Consigo foram raptadas outras centenas de mulheres. Tudo para um único fim: O mesmo de Reehan, o leilão de Tal Afar. Passou pela mesma vergonha, humilhada perante os soldados que estão ali para as levarem para casa. Querem as yazidi mais bonitas. Estas são as mais caras e as mais novas fazem o preço disparar. Tiram-lhes as medidas e quando estão interessados pela "propriedade", oferecem o que têm. Às vezes até armas servem de moeda.
Barfo foi vendida a um iraquiano de 35 anos que a levou para sua casa no noroeste do Iraque. "Quando ele queria tocar-me eu chorava", relembra. Ela tentava resistir, mas nunca conseguiu impedir que ele a violasse. "Ele era demasiado forte e atou-me à cama. Injetou-me morfina para eu me manter quieta e calada", acrescentou.
A jovem seria depois comprada por um árabe de 30 anos. "Este homem obrigou-me a dormir com ele e depois batia-me. Uma vez bateu-me tanto, que eu só consegui voltar a andar dois meses depois", contou a jovem ao MailOnline.
Quando Barfo esteve na Síria, foi vendida a quatro jiadistas que a usaram como escrava sexual. Foi para a prisão porque houve uma vez que resistiu fortemente. "Era subterrânea. Não conseguia ver nada". Barfo conseguiu fugir quando um vizinho de um soldado do EI teve pena dela. Este vizinho escondeu Barfo e mais duas raparigas yazidi em sua casa. Depois levou-as para Afrin, perto de Aleppo, cidade ocupada pelo EI, onde as yazidi ficaram umas noites antes de irem em direção à fronteira. Agora a salvo, no campo de refugiados, Barfo espera pela sua família que está também ainda nas mãos do EI. Não tem para onde ir, não tem passaporte.
Segundo Zainab Bangura, das Nações Unidas, as yazidi chegam a ser vendidas 20 vezes. "Quando os homens se cansam delas, as mulheres voltam para o mercado. O preço baixa quando são muito usadas", explica.