Apesar de ter ganhado projeção nacional graças à publicação no Instagram de fotos a bordo de jet-skis ou em boates com taças de champanhe, a ex-prefeita de Bom Jardim (MA), Lidiane Rocha, não terá seus perfis em redes sociais investigados.
"A presença dela nas redes sociais não foi levada em conta em nenhum momento na investigação, nem é citada no inquérito", disse à BBC Brasil o delegado da Polícia Federal Ronildo da Silveira, responsável pelo caso. "O Instagram da prefeita, para nós, é irrelevante."
Depois de passar 39 dias foragida, a ex-prefeita se entregou à Superintendência da Polícia Federal(PF), em São Luís, na última segunda-feira (28). Atualmente sem partido (ex-PP), Rocha é indiciada por crimes de associação criminosa, peculato e fraude em licitações para reformas de escolas.
Para o delegado, a importância dada às publicações da "prefeita ostentação" seria "mais uma criação da mídia do que de fato a investigação da polícia".
Magno Linhares, juiz responsável por determinar o destino da ex-prefeita e de seu ex-namorado e ex-secretário de Articulação Política, Beto Rocha, e do ex-secretário de Agricultura Antonio Gomes da Silva, concorda com o delegado da Polícia Federal.
"Eu não avalio pelo aspecto moral, mas pelo aspecto jurídico", diz Linhares, da 2ª Vara do Tribunal Regional Federal (TRF).
"(O foco na ostentação) é interessante, porque mostra que a sociedade está atenta a seus gestores. Mas também mostra um aspecto negativo, porque pode ensejar em pré-julgamento contra os supostos desvios que estão sendo apurados."
Os advogados da ex-prefeita não responderam aos pedidos de entrevista.
Verbas da Educação
Segundo o Ministério Público Federal e a PF, a ex-prefeita e seus assessores teriam participado de fraudes em licitações para a reforma de escolas públicas.
Também teriam sacado, em espécie, R$ 300 mil destinados à merenda escolar do município. "A estimativa é que os supostos desvios cheguem a R$ 15 milhões", diz o juiz responsável pelo caso.
Com IDH de 0,538 (a média nacional é 0,730), o município de Bom Jardim está entre os lanterninhas nos rankings de educação e qualidade de vida de todo o Brasil.
Nas palavras de um morador, pela internet, os cidadãos bonjardinenses convivem com "escolas sem nenhuma condição, ruas sem asfalto, bairros sem água, energia que toda hora falta".
Por isso, segundo os responsáveis pela investigação, os supostos crimes que teriam sido cometidos têm "total prioridade" sobre as imagens de luxo publicadas pela ex-prefeita nas redes sociais.
'Compro o que quiser'
Para o criminalista David Rechulski, especializado em administração pública e crimes de internet, as contas da "prefeita ostentação" na internet são "irrelevantes" na investigação.
"A partir do momento em que se descobre algo efetivo, o comportamento extravagante dela se torna secundário", diz. "Teria relevância maior se ela tivesse cometido algum crime usando meios eletrônicos" - o que, segundo os responsáveis pela investigação, não faz parte do inquérito.
O advogado associa a reação da opinião pública às fotos da ex-prefeita a bordo de jet-skis e em boates com joias e taças de champanhe com a crise política no governo federal.
"As pessoas estão vivendo um desgaste tão grande em relação ao comportamento dos agentes públicos e ao uso do dinheiro público que a forma de usar o dinheiro desviado acaba gerando mais indignação do que o próprio desvio em si."
Pelo Instagram, respondendo a uma crítica em uma foto de sua caminhonete (cujo preço estimado é de R$ 115 mil), a ex-prefeita disse: "Devia era comprar um carro mais luxuoso porque graças a Deus o dinheiro está sobrando".
"Eu compro é que eu quiser. Gasto sim com o que eu quero. Tô nem aí pra o que achem. Beijinho no ombro pros recalcados", afirmou, também pelo Instagram.