quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Tolerância da sociedade faz corrupção ser grande, diz desembargador Adriano Brito Da BBC Brasil em São Paulo

O desembargador federal Fausto de Sanctis (Foto: Divulgação/TRF)Image copyrightTRF
Image captionFausto de Sanctis atuou no caso Banco Santos e nas operações Satiagraha e Castelo de Areia
Ao receber a reportagem da BBC Brasil em seu gabinete no Tribunal Regional Federal da 3ª região, em São Paulo, o desembargador Fausto de Sanctis conta que esteve, dias antes, na Conferência Internacional Anticorrupção, realizada na Malásia no início deste mês.
O evento, relata, teve uma votação para eleger os casos de corrupção "do momento" no mundo. "Foram três: o do primeiro-ministro da Malásia (US$ 600 milhões foram descobertos em sua conta), o da Fifa e... o da Petrobras."
Como juiz federal, De Sanctis foi responsável por duas ruidosas operações sobre crimes financeiros na década passada: a Castelo de Areia, que tinha como alvo o grupo Camargo Corrêa – citada na Lava Jato – e a Satiagraha. Na última, foi acusado por Gilmar Mendes, então presidente do Supremo Tribunal Federal, de afrontar a corte ao determinar prisão do banqueiro Daniel Dantas pouco depois de o ministro ter acolhido habeas corpus.
Hoje desembargador, ele diz não poder falar dos casos que lhe tornaram famoso. Mas externa suas críticas ao sistema jurídico, principalmente no tratamento a crimes econômicos, citando a possibilidade de anulação de processos – o fim das duas operações.
Autor de livros sobre corrupção, De Sanctis falará na semana que vem sobre o papel de empresas no combate na Conferência Ethos 360°, realizada pelo Instituto Ethos, em São Paulo. Defensor da delação premiada e da alienação de bens, ele afirma ver, na sociedade, tolerância com a corrupção. "Sonegação não passa de corrupção", exemplifica.
Leia os principais trechos da entrevista.
BBC Brasil - A relação nociva entre empresários e o poder foi cerne da Satiagraha e da Castelo de Areia, e está no centro da Lava Jato. O país está avançando no combate a esse tipo de ligação?
Fausto de Sanctis - O Brasil vive um aparente aperfeiçoamento institucional. O que foi realmente inovador, um marco, foi a criação das varas especializadas em lavagem. Em alguns países se defende a criação de varas de corrupção, o que talvez esteja faltando aqui. Ela é tão sistêmica, não tem sentido não ter mais casos correntes em um país em que se vê corrupção em todo lugar.
Havia um sentimento absoluto de impunidade. E o início das varas, aquele protagonismo, incomodou muito. Houve uma reação da criminalidade econômica, com ajuda de setores do Congresso Nacional.
O banqueiro Daniel Dantas, na Câmara, em 2009 (Foto: Rodolfo Stckert/Ag. Câmara)Image copyrightAg. Camara
Image captionDaniel Dantas foi alvo de polêmica ao De Sanctis mandar prendê-lo após habeas corpus do STF
Vimos, com a criação das varas, não só um injustificado repúdio ao seu funcionamento pelo próprio Judiciário. Teve o Legislativo querendo rever legislação já aplicada para o crime comum há muitos anos, mas que, quando aplicada para o econômico, passou a ser revista. Para ele continuar acima da lei.
(Houve) a releitura sobre a prisão, sobre monitoramento telefônico... que existe em tudo quanto é país – quando é necessário, não é que você grampeia todo mundo. Houve um movimento até de acabar com as varas.
BBC Brasil - Foi preciso surgirem essas varas especializadas (no combate à corrupção) para os casos virem à tona?
De Sanctis - O problema sempre existiu, obviamente. A corrupção existe em todo lugar. No país desenvolvido, os agentes corruptos usam de maneira indevida o sistema. Nos subdesenvolvidos, o sistema é fraco.
Em todo o Brasil, o sistema é fraco. É uma luta inglória para conseguir dar a sentença porque, até certo momento atrás, os processos eram parados por habeas corpus sem sentido. Eram paralisados, quando não declarados nulos. Tudo era nulo, não importa o quê.
E tem um sistema legal com punições brandas. No caso da corrupção, a literatura mundial diz que tem de haver prisão. As pessoas têm de sentir que a corrupção não vale a pena, que o crime econômico não vale a pena. Não tem sentido aplicar multa porque isso entra nos custos do delito. Suspender alguns contratos? Não vai bastar.
Há esse problema de legislação, o mau funcionamento do sistema procedimental, que permite recursos ad aeternum, quando não habeas corpus a todo instante, inclusive de réus soltos. Um sistema único e particular, que faz com que os processos não cheguem à execução da pena.
(Foto: TV Brasil)Image copyrightDivulgacao l TV Brasil
Image captionDe Sanctis diz esperar que prisões de políticos e empresários não seja "movimento político"
BBC Brasil - O que mudou para hoje vermos empresários e políticos irem presos?
De Sanctis - Espero que não seja um movimento político. Ou seja, porque se deseja asfixiar as pessoas que estão no poder. Que seja resultado de um aperfeiçoamento, ou da conscientização das autoridades judiciárias de seu papel de atender às expectativas sociais.
Se há indício forte de corrupção, tem que haver resposta rápida, eficiente, e não passar a mão na cabeça. O Poder Judiciário é um Poder de reafirmação de valores. E esses valores só são reafirmados quando tem a resposta da lei. E a lei prevê prisão, apesar de ser uma pena baixa, que começa com dois anos. A corrupção pode ser de R$ 500 milhões ou de R$ 1, (o que, aliás) não tem sentido.
BBC Brasil - Muito se discute o financiamento empresarial de campanhas nesse contexto.
De Sanctis - O que se falou nesses debates na Malásia é que o financiamento partidário dos políticos é um elemento para ser bem regrado pelo Estado, porque é um campo profícuo de corrupção.
Mas olha, não se combate a corrupção olhando do povo em direção ao governo. Se o particular não for honesto, não vai ter um governo honesto. A nossa tolerância é que faz com que a corrupção seja grande. E não porque os corruptos estão lá, como se fosse algo dissociado da cultura em que estão inseridos.
Só vou sentir aperfeiçoamento quando, ao andar na (av.) Paulista, não houver comerciantes que vendem sem nota fiscal e todo mundo achar isso tolerável. As pessoas sonegam como se fosse um fato da vida, quando não passa de corrupção. É o dinheiro público que não vai para o Estado.
E a resposta legítima do Estado só vai vir quando houver sustentação na sociedade. As manifestações de 2013 deram sustentação aos políticos para aprovar a Lei Anticorrupção. Nunca se pensou que essa lei fosse passar.
BBC Brasil - E o foro privilegiado? O senhor é um crítico...
De Sanctis - A seletividade dos juízes (nos julgamentos) é a primeira (ação) a ser combatida e isso não está entre as dez propostas do Ministério Público Federal de combate à corrupção, o que me causa estranheza.
(Foto: TSE)Image copyrightTSE
Image captionApós Gilmar Mendes devolver ação, STF voltou a discutir veto a doações eleitorais de empresas
Porque uma das marcas (necessárias) são a imparcialidade e a independência, de todos que têm o ônus e o dever de apurar crimes graves. E têm que ser garantidas com critérios objetivos.
E isso não é só para juízes. Do que adianta termos tribunais de contas cujos membros são indicados por conveniências políticas? Não pode ter apadrinhamento nos setores que cuidam de licitações públicas. Esses setores não podem ter cargos comissionados, senão perdem a razão de existir. É melhor ter auditorias independentes.
BBC Brasil - Na Lava Jato, advogados criticam o que chamam de concatenação entre o juiz Sergio Moro, o Ministério Público e a PF. E essa é uma crítica que já foi feita ao senhor no passado. Como vê isso?
De Sanctis - É uma crítica muito superficial. Esquecem que a polícia se qualificou muito, agregou conhecimento das investigações no passado. Está mais difícil ludibriá-la. As varas especializadas permitiram um ganho que levou a investigações cada vez mais eficazes. Isso vale também para o Ministério Público e para o juiz.
Sendo bem feito pela polícia, o trabalho provavelmente será ratificado pelo Ministério Público e reconhecido pelo Judiciário. Não adianta achar que houve concatenação ou ligação indevida.
Muitos delegados, quase todos, só conheci trabalhando. O relacionamento era meramente profissional. Um trabalho que acredito que deva ser como o do Paraná (Lava Jato).
(Foto: Reinaldo Ferrigno/Ag. Câmara)Image copyrightAg. Camara
Image captionPara Fausto de Sanctis, polícia avançou na investigação de crimes de corrupção
BBC Brasil - Outras críticas são que prisões seriam usadas para obter delações e que o próprio instituto da delação premiada poderia levar pessoas a cometerem crimes planejando um acordo caso sejam pegas...
De Sanctis - Quando temos uma lei falando que a confissão é um atenuante, ela está estimulando a pessoa a confessar. Está exercendo uma pressão psicológica. Quando estabelece que a desistência voluntária de um crime ou arrependimento posterior tem diminuição de pena, está fazendo uma pressão psicológica, que é legítima. Com a delação premiada não é nada diferente.
A prisão, por si só, exerce pressão psicológica. A pessoa vai presa porque requisitos são preenchidos. E é óbvio que, ao delatar, vai esperar a soltura. O juiz, ao soltar, nada mais faz do que cumprir a legislação.
Agora, isso não significa que o delatado não é digno de ser ouvido. A palavra do delator não vale, em hipótese alguma, como prova absoluta. É só um caminho para a revelação do fato. Deve ser confirmada com outros meios, senão não basta.
BBC Brasil - O sr. foi um dos primeiros a atuar na apreensão de obras de arte....
De Sanctis - Quando falei para a Polícia Federal, em 2004, "vocês estão apreendendo bens, veículos e imóveis e se esquecem de obras de arte", todo mundo me olhou como se isso fosse menos importante. Agora não se discute mais isso, por conta da Lava Jato.
Vi traficantes negociando obras para pagamento de advogados. E conseguindo adquiri-las de maneira muito fácil, nessas casas de leilões internacionais, que não têm nenhum compromisso com a prevenção à lavagem. O processo penal não é só condenar e absolver. Inclui a relação de bens e o tratamento deles porque sem apreensão não há o asfixiamento do crime organizado.
(Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Ag. Brasil)Image copyrightAg. Brasil
Image captionSergio Moro, juiz da Lava Jato, é alvo de críticas de advogados por causa de prisões preventivas
Falando nisso, a pessoa jurídica tem de ser responsabilizada. No Brasil, historicamente, pessoas físicas são responsabilizadas. Mas elas são substituídas, e as jurídicas continuam. Por isso o problema de empresas que reiteram na prática criminosa, principalmente aquelas que financiam campanhas políticas.
BBC Brasil - Como o sr. vê os acordos de leniência (feitos pela Controladoria-Geral da União, geralmente permitindo às empresas que confessem continuar prestando serviços ao governo)?
De Sanctis - A impressão que se tem é que os acordos estão sendo feitos para se acomodar o crime econômico. Isso não pode acontecer. Tem de ser sério, com a primeira empresa a falar. (Ela) não pode trazer fatos já conhecidos. Não pode ser um acordão que fique conveniente para as empresas e que dê sobrevida a quem não pode dar. A lei estabelece até a dissolução se for o caso.
O Brasil tem que realmente passar a limpo, com seriedade. E não usando a legislação para benefício do crime organizado. Espero que não seja isso que esteja acontecendo por parte da Controladoria-Geral da União.
BBC Brasil - O sr. foi um dos primeiros juízes a adquirir fama por casos de corrupção. Os ministros do STF viveram isso com o mensalão, e hoje o Moro. Fama colabora ou atrapalha?
De Sanctis - Quando eu ia dar palestra, juízes me colocavam em um pedestal. Eu saía do palco e dizia: "olha, nós somos colegas". A pessoa colocada nesse pedestal pode perder o chão. Isso não é bom, a autoridade nunca pode perder o chão. Tem que fazer o exercício da humildade o tempo todo. Estou só cumprindo com o meu dever.
O que me marcou é que o sistema está de tal forma ineficiente que faz com que certas pessoas que estão atuando conforme a lei virem heróis. Isso é péssimo. Não é a pessoa física que precisa ser valorizada. É preciso ter instituições fortes que sejam valorizadas.

ANNA MUYLAERT | CINEASTA » “Não há Oscar que pague sentir que seu filme muda a vida de pessoas” Para a diretora de ‘Que horas ela volta?’, o sucesso se mede nas reações das pessoas



gina Casé e Anna Muylaert na pré-estreia do filme em SP. / DIVULGAÇÃO (FACEBOOK)
A carreira de Que horas ela volta?, o filme brasileiro que maior boca a boca gerou nos últimos tempos, já começou promissora. Premiado em dois importantes festivais internacionais – Sundance e Berlim –, foi muito além do que a grande maioria costuma ir em sua busca por espectadores. Mas não parou por aí. Com críticas elogiosas e declarações de amor à cineasta Anna Muylaert (Durval Discos e É proibido fumar) e à protagonista Regina Casé, o filme extrapolou a panela do audiovisual e caiu nas graças do povo assim que chegou ao circuito comercial. E por “povo” entenda-se não só as massas menos abastadas, mas também a elite, ambas postas na tela pelo filme.
Com a história de uma empregada, Val (Regina Casé), que cuida do filho de sua patroa, enquanto alguém mais cria sua filha Jéssica (Camila Márdila), o longa já fez 150.000 espectadores, ganhando público a cada semana de exibição. Para atender a demanda crescente, expandiu seu circuito brasileiro em 90%, e a distribuidora Barbara Sturm, da Pandora Filmes, também responsável pela programação do cinema Belas Artes, em São Paulo, já declarou que fará de tudo para que lá ele fique ao longo de um ano.
Colecionando cartas de espectadores tocados pela obra, Anna Muylaert nem precisaria de mais um troféu, mas já o conquistou:Que horas ela volta? foi indicado para a corrida pelo Oscar estrangeiro de 2016. Ela é a primeira mulher a representar o país às portas da Academia em 30 anos (antes dela, Suzana Amaral fez isso, com A hora da Estrela). Mas está mesmo feliz com o fato de que ninguém fica indiferente à dupla Val e Jéssica. “Sentir que seu filme está mudando a vida das pessoas não tem Oscar que pague”, garante.No exterior, a recepção tem sido igualmente calorosa, graças à sua qualidade técnica e, sobretudo, artística. O site Rotten Tomatoes, que ranqueia produções do mundo todo a partir das críticas de usuários, tem Que horas? com 96% de aprovação. Mas o que fica, especialmente para o público brasileiro, a quem o filme se destina em primeiro lugar, é a provocação amorosa que ele faz ao questionar a torta relação família-empregada com compaixão e sem julgamentos fáceis.
Pergunta. Seu filme escancara uma realidade negativa que é latino-americana, mas ao mesmo tempo é amável. Como você chegou a esse resultado? O que teve em mente para buscar esse equilíbrio?
Resposta. Eu estava buscando falar de um jogo, um conjunto de regras que todos jogamos, todos somos cúmplices, mas individualmente não somos culpados. Não queria julgar ninguém. Apenas queria expor o jogo, e, neste jogo, embora exista muita perversidade e violência, há também muito afeto. Eu queria falar da complexidade dessa nossa cultura de um modo sutil e não panfletário, justamente para que não gerasse rejeição, que as pessoas pudessem ver os próprios erros com compaixão.
P. Ele ia se chamar A porta da cozinha. Até quando, a seu ver, teremos essa separação entre o espaço da elite e o popular, no Brasil?
R. Acho que isso ainda está muito atrasado no Brasil, onde a mente escravocrata está durando tempo demais. Não se trata de uma questão partidária – como pode parecer agora –, mas sim de contemporaneidade. Na Europa, quando termina o filme, eles perguntam chocados: “Mas isso existe?”. Eles não acreditam que exista. Acho que isso persiste, em primeiro lugar, porque há um problema de educação enorme no Brasil. A educação pública não é boa, e, se o aluno não for excepcional, vai sair da escola sem preparo. E a segunda questão é que nossa elite, além de preguiçosa, é retrógrada. Acha chique ir para Europa, mas não quer abrir mão de seus privilégios em nome de uma nação mais democrática socialmente.
P. Como foram as sessões que aconteceram em São Paulo e no Rio de Janeiro com empregadas domésticas na plateia?
R. A sessão das empregadas em São Paulo foi especialmente forte. Eu não consegui sentir tão bem as reações na hora, porque elas estavam muito chocadas. Depois, soube que um grupo saiu dali e passou a tarde numa espécie de terapia, falando de coisas que estavam presas há muito tempo…
P. Você teve, de pequena, uma empregada que participou intimamente da sua criação. Essa história nasce de algum processo seu de compreensão das relações que aconteciam na sua própria casa? E de que maneira sua babá inspira a personagem de Regina Casé e você, o personagem Fabinho [filho da casa onde trabalha a personagem de Regina]?
R. Comecei a escrever o roteiro há 20 anos, logo depois de ter meu primeiro filho. Eu, que sempre dei muita ênfase na carreira profissional, de repente percebi que o trabalho da mãe não era apenas o trabalho mais importante do mundo, era um trabalho sagrado. Ao mesmo tempo, atentei para o fato de que – no meu meio social – era um trabalho desvalorizado e que muitas mulheres preferiam entregar cotidianamente seus filhos aos cuidados de babás com baixos salários. E, muitas vezes, essas mulheres tinham que largar seus próprios filhos para poder cuidar dos filhos dos outros. Percebi que na figura da babá estavam contidos grandes paradoxos da sociedade brasileira: paradoxos sociais, afetivos e culturais que circundavam todos em relação à questão da educação. Me inspirei na história de Edna, que foi babá de meu caçula anos atrás e, para criar a personalidade de Val, na Dagmar, que trabalhou na casa de minha mãe quando eu era criança.
Grupo presente na sessão especial para domésticas em São Paulo. /DIVULGAÇÃO (FACEBOOK)
P. Quem precisa de ajuda em casa pode sentir culpa ao ver o filme, se puder se colocar no papel da mãe e sentir a tristeza do filho ao perguntar “Que horas ela volta?”. Sob que perspectiva você quis construir essa relação mãe e filho?
R. Esse título aconteceu pelo ponto de vista da criança. Eu entendia que tínhamos ali o Fabinho, que estava sempre longe da mãe – e também a Jéssica, na mesma situação. Ambas crianças estavam esperando pela mãe. Que horas ela volta? é um título que se refere ao buraco causado pela ausência da mãe. Não acho que o filme gere culpa. O que gera culpa é ficar longe dos filhos, porque num mundo ideal acho que toda mãe gostaria de ficar perto de seus filhos. Por outro lado, nós, mulheres, conquistamos um espaço no mercado de trabalho e não vamos perdê-lo. E essa nova situação histórica – mães que trabalham fora – está trazendo novas questões e dúvidas. Outro dia, eu estava dando uma entrevista pra uma jornalista inglesa e, no meio da entrevista, ela me perguntou: “Anna, estou com um bebê de sete meses e preciso trabalhar, o que faço?”. Eu ri e disse que não sabia, que cada um tinha que dar o seu jeito. Hoje mesmo aqui nos Estados Unidos, de onde respondo esta entrevista, uma americana veio com a mesma questão. Acho que temos que começar a debater isso e encontrar soluções. A ajuda dos pais com certeza será um próximo passo. Mas quando me deparo com isso não consigo deixar de pensar no modo de vida dos indígenas do Xingú, onde todas as crianças são criadas por todos os pais. Talvez, no futuro, tenhamos que voltar a uma situação similar.
P. O elenco do filme conta com uma atriz pop (para o público brasileiro) e experiente e outra que é um rosto novo e é iniciante – ambas muito talentosas. De que maneira essa combinação de atrizes potencializou o roteiro e a história como um todo?
R. Escolhi a Regina, antes de tudo, porque a considero uma atriz fascinante. Segundo, porque o tema do filme tem tudo a ver com o trabalho antropológico que ela vem fazendo na TV há muitos anos e que me faziam ver que ela, assim como eu, tinha – além de interesse – muito respeito pela figura da empregada doméstica. Também a escolhi por causa do seu tipo físico: ela tem ou parece ter essa mistura de raça, branca, negra e índia que a torna uma figura muito brasileira, além de ser uma atriz que não fez plástica e tem uma aparência de gente normal. Ao escolher a Regina, que é tão famosa, decidi que todo mundo em volta seria não-famoso. Comecei procurando atrizes pernambucanas, mas elas apresentaram nos testes um certo grau de sensualidade que não achei adequado para a Jéssica [filha do personagem de Regina no filme]. A Camila [Márdila, que interpreta Jéssica] surgiu através de testes de elenco. No começo, inclusive, eu não a queria, pois ela era muito “branquinha”. Acabei vendo que isso era um tipo de preconceito meu, e depois me surpreendi. A Camila tem uma feição mais fechada, sorri pouco e acaba causando estranhamento. Isso ficou muito rico no filme, porque isso era importante para o entendimento da personalidade livre e rebelde da Jéssica. Como as duas atrizes mal se conheciam e foram se conhecendo ao longo das filmagens, esse estranhamento foi pra tela.
Não acho que o filme gere culpa às mães. O que gera culpa é ficar longe dos filhos. Por outro lado, nós, mulheres, conquistamos um espaço no mercado de trabalho e não vamos perdê-lo"
P. Que horas ela volta? é o candidato brasileiro ao Oscar de 2016. O que isso significa para você: representar o cinema do país num prêmio de grande visibilidade?
R. Da minha parte, não existem expectativas. Sei que o filme tem uma carreira internacional linda, e, como fomos os escolhidos do Brasil para representar o país no Oscar, agora faremos o trabalho necessário para tentar uma nominação entre os cinco finalistas. Mas ainda está muito cedo. Meu maior objetivo hoje é fazer o filme chegar a mais pessoas no Brasil, porque o filme aqui, além de ser um filme, é um espelho. Meu maior objetivo é que ele gere debate no país.
P. E se o filme ganhar: o que isso representaria para o cinema do Brasil, na sua opinião?
R. Essa é uma hipótese sobre a qual ainda não me debruço, porque não sou pessoa que alimenta esperanças. Mas, se isso acontecesse, acho que seria muito positivo tanto para mim, quanto para o cinema brasileiro – já que se trata de um filme muito simples, cujas qualidades estão baseadas mesmo na ideia e no trabalho artístico. Não há superprodução, é um filme que qualquer pessoa poderia fazer, e isso condiz com o nosso cinema. Além disso, ele discute ideias, o que o cinema brasileiro andou meio esquecido de fazer. Acho que acenderia no nosso cinema a vontade de dizer coisas, o que me parece positivo.
P. O filme está sendo muito comentado dentro e fora do país. Qual foi o elogio mais bacana a ele que você escutou e, por outro lado, a crítica mais acertada?
R. Desde o início, no Festival de Sundance, as críticas sempre foram muito positivas. Na Itália, diziam que “a melhor comédia social italiana do ano era brasileira”. Depois, veio a Espanha, com o EL PAÍS dizendo coisas lindas e francas, etc. Mesmo assim, acho que as críticas americanas foram as melhores. Eles não pouparam elogios em textos enormes e interpretativos. Teve uma que disse que eu era, um passo à esquerda, Almodóvar, e, um passo à direita, Bergman. Eu me divirto muito com todas. Mas, sinceramente, o que mais me comove mesmo são as mensagens que recebo do público diariamente. Ali estão depoimentos emocionados de histórias reais. Sentir que seu filme está mudando a vida das pessoas não tem Oscar que pague!
P. Mesmo depois de estrear em tantos lugares, Que horas ela volta?tem previsão de estreia ainda em poucos países da América Latina. O que você opina a respeito dessa circulação cultural latino-americana tão limitada?
R. É um retrato da sociedade de um continente e entendo que não o comprem. Para que comprar algo que irá causar mal-estar? No Brasil não têm outra escolha, porque é meu país [risos]. A maioria dos países que comprou nosso filme foi entre Sundance e Locarno em janeiro e fevereiro de 2015. Nosso agente de vendas ficou impressionado que os compradores latino-americanos chegavam lá, olhavam e não compravam. Mas agora, cerca de um mês conseguimos distribuição na Argentina, Uruguai e Paraguai no começo de 2016.
P. Há um filme chileno, La nana (Sebastián Silva; 2009), que trata da relação entre patrões e empregados, mas com uma personagem bem diferente, mais ácida, no lugar de Val. Você se inspirou nele, de alguma maneira, ou em outras obras sobre o mesmo tema?
R. Cheguei a ver o filme, mas não até o final, porque não tinha legendas, e meu espanhol é ruim. Não me inspirei nele, mas em outros filmes sul-americanos como Cama Adentro [2004; Argentina] e, mais ainda, El Custodio, de Rodrigo Moreno [2006; Argentina]. E também num conto do [escritor argentino] Julio Cortázar, A casa tomada.

DESCRIMINALIZAÇÃO DAS DROGAS » Abramovay: “Rico é tido como usuário de droga e o pobre como traficante” Ex-secretário de Justiça diz que votação no STF definirá padrões e evitará discriminação

Pedro Abramovay, em uma imagem de 2012. / WILSON DIAS (ABR)
O debate sobre a descriminalização das drogas no Brasil estacionou, temporariamente, no Supremo Tribunal Federal. Na semana passada, depois que os ministros Edson Fachin e Luiz Roberto Barroso defenderam a liberação da maconha para consumo próprio, o ministro Teori Zavaschi pediu vista no processo e a discussão foi suspensa. Mas apenas dentro do plenário do Supremo. Fora, os ativistas que apoiam uma política mais oxigenada sobre o assunto aproveitam o momento para defender suas posições. Pedro Abramovay, advogado e ex-secretário da Justiça do governo Lula, defende que o uso de drogas seja tratado como questão de saúde pública e não como crime. É essa posição que ele defende na América Latina, como diretor para a região da Open Society Foundations, do bilionário americano George Soros, que já entrou neste debate das drogas no Uruguai, por exemplo. Por telefone, ele falou com o EL PAÍS sobre o tema.
Pergunta. A sua posição é pela descriminalização de todas as drogas, como defende o ministro Gilmar Mendes, e não apenas damaconha, como defendem os ministros Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. Por quê?
Resposta. Primeiro é importante diferenciar de maneira bem clara a descriminalização da regulamentação. A descriminalização olha para o usuário não como uma pessoa que deve passar por um sistema de justiça criminal, como acontece hoje, mas por um sistema de saúde. Esse é um conflito que se aplica ainda mais aos que usam drogas mais pesadas. Mas deveria ser o contrário: pelo fato dessas substâncias causarem mais danos às pessoas, é mais um motivo para ele precisar passar por um sistema de saúde. Em vez de um usuário de crack ser pego e levado pela polícia, ele deveria passar por um tratamento de saúde. Já a regulamentação, tanto da produção quanto do uso, é uma outra discussão, que entra, inclusive, na autorização do uso dessas substâncias.
P. Mas essa política de encaminhar alguém para o tratamento de saúde quando for pego também não fere os princípios da liberdade individual, que tem sido defendido pelos ministros do Supremo?
R. Sim. O ideal é que o indivíduo não seja obrigado a passar pelo sistema de saúde, mas que esse sistema esteja à disposição dele. A questão não é forçar todo mundo que usa droga a um tratamento, mas permitir que estejam à disposição profissionais e atendimento para quem queira se tratar.
P. Descriminalizar o uso da droga, mas não garantir o acesso a essa substância resolve a questão?
R. Não. Falando especificamente da maconha, estabelecer uma forma de produção [como defendeu o ministro Barroso no Supremo, na semana passada] é algo muito positivo. No caso das outras drogas, como o crack, o que se diz não é que você pode comprar crack, mas que a resposta que a lei tem que dar não pode ser penal. Se ela for pega, tem que passar por um sistema de saúde e não pela Justiça.
R. Para cada droga, a gente tem que ter uma resposta adequada. Mas tratar como crime só produz efeitos negativos para todo mundo. É preciso implementar políticas de redução de danos, quando isso é possível, e em outros casos, partir para a regulamentação. Todos os países que tiraram a questão da droga do âmbito penal tiveram mais êxito do que fracasso. Por isso acho que o patamar mínimo, quando falamos de drogas, é a descriminalização.P. É correto misturar a maconha com outras drogas nesse debate, quando outras substâncias, como o crack e a cocaína, podemrepresentar um risco maior para a saúde do usuário?
P. Esse debate não deveria então vir juntamente com algum programa de tratamento para viciados?
R. Temos que entender que não precisamos melhorar a saúde para depois descriminalizar. O fato de [fazer uso de drogas] ser crime é uma das principais barreiras para oferecer a saúde hoje. Um dos programas mais aclamados mundialmente é o Braços Abertos [desenvolvido pela Prefeitura de São Paulo para tratamento de usuários de crack], que não prega a abstinência. Para tratar uma pessoa que tem vício em crack, você precisa tratá-la no ambiente dela. Se você a tira de lá, realiza um tratamento e depois devolve para aquele mesmo contexto, ela vai voltar a usar a droga. Uma das maiores dificuldades do programa é o fato de o uso do crack ser crime. Inclusive um deputado chegou a pedir impeachment do Haddad por isso, alegando que ele estava sendo conivente com o crime.
P. Como a Justiça deveria diferenciar o traficante do usuário? É pela quantidade da droga que a pessoa está portando?
O patamar mínimo, quando falamos de drogas, é a descriminalização
R. Essa é uma questão fundamental. A aplicação da lei hoje é que quem é rico, é usuário, e quem é pobre, é traficante. Não tem critério. Independente de legalização ou não, é preciso ter um critério que não seja o endereço e a cor da pele da pessoa. E aí existem exemplos em diversos países. O México, por exemplo, estabeleceu uma quantidade [permitida] muito baixa, que não resolve essa questão. Por isso, o fundamental é fazer uma pesquisa, uma análise para saber o quanto um usuário consome por dia de consumo e estabelecer a quantidade permitida. E eu considero fundamental que o Supremo estabeleça isso. Mais ainda nesse caso, deveria valer para todas as drogas. Uma pessoa com 5 gramas de cocaína é considerada traficante porque ela mora na favela. Não se trata de dizer se uma droga é perigosa ou não.
P. Faz sentido liberar seis plantas e 25 gramas de maconha? Essa é uma média comum de consumo mundial? De onde vem esses números propostos pelo Barroso?
R. Não existe um padrão mundial. O certo seria fazer uma pesquisa, acompanhando um usuário de cada tipo de droga para saber o quanto ele consome e, a partir daí, estabelecer a quantidade permitida.
P. Descriminalizar o uso, permitindo portar alguns gramas da droga para consumo pessoal, resolve o problema da violência causada pelo tráfico?
R. Não resolve, mas interrompe esse processo perverso de prender pessoas que não têm a ver com a violência só porque são pobres. Porque quando elas saem da prisão, elas são membros de organizações criminosas porque é o que sobra para ela. O crescimento brutal da quantidade de presos é baseado nisso. 
De todos os países que descriminalizaram as drogas, em nenhum deles aumentou o consumo
P. Quem é contra a descriminalização das drogas argumenta, entre outras coisas, que haverá uma explosão de usuários, se for liberada. Isso faz sentido?
R. É intuitivo isso. De todos os países que descriminalizaram as drogas, em nenhum deles aumentou o consumo. Existem estudos que concluem que não aumenta o consumo. Esse é um problema muito sério para a gente tratar com intuições. Se a gente entende que a descriminalização não aumenta o consumo, todos os outros argumentos contra a descriminalizado caem por terra.
P. Existe algum exemplo criado por algum país que o Brasil deveria seguir?
R. Existem vários exemplos, mas acho que o certo é menos importar um modelo completo e mais entender as vantagens e desvantagens dos outros modelos e implementar aqui o que funciona. Portugal é um ótimo exemplo, porque a descriminalização diminuiu a morte por overdose, não houve aumento no consumo, a polícia pôde se preparar melhor para lidar com o usuário. Os países que estão trabalhando com a maconha medicinal e os que liberaram o cultivo da maconha também têm exemplos positivos.
P. No Uruguai, o processo de legalização da maconha parece ter esfriado, desde que o presidente Tabaré Vázquez classificou como “absurda” a venda da droga nas farmácias, uma das medidas mais polêmicas anunciadas por seu antecessor, José Mujica, na época da legalização.
R. Não concordo com a avaliação de que a regulação da maconha tenha esfriado no Uruguai com Tabaré. Ele nomeou para a área de drogas Milton Romani, maior defensor da nova Lei dentro do governo uruguaio, e bem próximo a Mujica. Romani é também bastante responsável e está implementando a lei com o cuidado e a responsabilidade necessários. A partir do ano que vem haverá venda nas farmácias.
P. Algo deu errado no programa uruguaio? Quais pontos negativos poderiam servir de “não-exemplo” para o Brasil?
R. Ainda é difícil avaliar o processo, justamente porque ele ainda não foi totalmente implementado. Já há autocultivo e também os clubes, que funcionam como cooperativas de usuários. Mas a venda está sendo preparada com cuidado. A Open Society está financiando, atualmente três avaliações independentes do processo uruguaio, justamente para que possamos aprender com erros e acertos. Mas a principal virtude do processo uruguaio tem sido a responsabilidade de se evitar o açodamento. É fundamental fazer as coisas de forma cuidadosa e eles têm seguido este passo.
P. Quando o Uruguai anunciou a legalização da maconha, a expectativa era que a iniciativa do país influenciasse o debate nos países vizinhos. Como você avalia?
R. Desde que o Uruguai aprovou a lei, Chile, Colômbia, Equador e Jamaica avançaram muito no debate legislativo. A OEA aprovou uma resolução afirmando que as convenções de drogas devem se submeter às convenções de direitos humanos e a Unasul está articulando uma posição conjunta dos países da região para questionar, na ONU, as atuais convenções. Sem mencionar o debate que vemos no STF, no Brasil, onde o Uruguai tem sido referência. Então acho que podemos dizer que a influência do processo uruguaio sobre a região foi enorme.
P. Esse debate está maduro também nos Estados Unidos. O Brasil está ficando para trás?
R. O Brasil certamente está ficando para trás. Estamos à espera da decisão do STF, mas o fato é que hoje estamos apenas na companhia de Guiana e Suriname como países que ainda criminalizam o porte de drogas para consumo pessoal. Mesmo se vier a decisão positiva do Supremo, ainda estaremos atrás de vários países, como a Colômbia, que está avançando, por exemplo, no tema da maconha medicinal. Mas acho importante avançar. E ir medindo esses avanços aos poucos para criar nossos próprios caminhos.
P. Você acha que a descriminalização vai passar pelo STF?
R. Eu confio que o papel do Supremo não é o de jogar para a plateia. É de dizer se há direitos sendo violados, injustiças sendo cometidas. E não da pra dizer que a Constituição está sendo cumprida do ponto de vista da lei antidrogas. Por isso, acredito que o Supremo tem esse papel de fazer valer os direitos.

Fifa afasta Valcke após denúncia de esquema ilegal de ingressos da Copa Entidade diz que tomou decisão após ter conhecimento das denúncias envolvendo o francês, acusado de lucrar indevidamente com a venda de uma parcela dos bilhetes

A Fifa anunciou que Jérôme Valcke foi afastado do cargo de secretário geral da entidade. A federação divulgou uma nota nesta quinta-feira para comunicar o afastamento e informou também que o dirigente francês será investigado. Ele é acusado de participação em um esquema ilegal de venda de ingressos no Mundial de 2014. Cornel Borbely, chefe do braço investigativo do Comitê de Ética da Fifa, será o responsável pela investigação. 
"A Fifa anunciou hoje (quinta-feira) que o seu secretário-geral, Jérôme Valcke, foi afastado e liberado de suas funções efetivas com efeito imediato e até um novo posicionamento da Fifa. A Fifa tomou conhecimento de uma série de denúncias envolvendo o secretário-geral e solicitou uma investigação formal pelo Comitê de Ética."
Mais cedo, o "Estado de S. Paulo" e jornais de outros nove países publicaram uma reportagem com denúncias feitas pelo empresário americano-israelense Benny Alon. Dono da empresa JB Marketing, que negocia entradas de mundiais desde a Copa de 1990, ele acusa o francês de lucrar indevidamente com a comercialização de uma parcela das entradas para a Copa do Mundo no Brasil.
Jerome Valcke sorteio das eliminatórias da Copa de 2018 (Foto: Reuters)Jerome Valcke deixa cargo de secretário-geral da Fifa após denúncia (Foto: Reuters)
A denúncia
Segundo as denúncias feitas por Benny Alon e publicadas pelo "Estado de S. Paulo", Valcke teria montado um esquema para ficar com 50%¨dos lucros da comercialização de 11 mil bilhetes da edição do Mundial de 2014 (os demais veículos falam em 8.750 bilhetes). Os tíquetes seriam negociados por um preço até quatro vezes maior em relação ao valor de face. O dirigente teria arrecadado € 2 milhões (R$ 8,83 milhões, na cotação desta quinta-feira) com a operação, acusou Alon.
O acordo teria sido firmado em março de 2013, meses após os primeiros contatos entre as duas partes. Ainda segundo o "Estadão", que ao lado dos outros nove jornais teve acesso a e-mails confidenciais trocados entre Benny Alon e Valcke, eles definiram que ingressos para jogos de muito apelo, como a final no Maracanã e todos aqueles envolvendo a seleção brasileira, teriam essas cotas com valores quatro vezes maior. 
Ainda segundo o jornal, "desapareceram" 8,3 mil ingressos da Copa de 2014 que seriam vendidos pela JB Marketing, de Benny Alon. Outros 2,4 mil ficariam com a Fifa. A empresa de Benny Alon tinha também um acordo com a Fifa para comercializar pacotes de bilhetes VIPs a partir da Copa das Confederações de 2013. Só que os lucros, divididos entre a companhia de Benny Alon e Valcke, sairiam principalmente do Mundial no Brasil.

De acordo com The Guardian, que foi um dos 10 veículos de mídia a divulgar o conteúdo, Valcke nega as irregularidades. O jornal britânico também diz que os mails não são conclusivos e não provam, a priori, as denúncias.
- Jérôme Valcke inequivocadamente nega as fabricadas e ultrajantes acusações feitas por Benny Alon de alegadas irregularidades em conexão com o a venda de ingressos da Copa do Mundo. O senhor Valcke nunca recebeu ou concordou em receber qualquer dinheiro ou outra coisa de valor do senhor Alon - disse Barry Berke, advogado de Valcke, em comunicado enviado ao jornal "New York Times".
Comunicado da Fifa contra Jérôme Valcke (Foto: Reprodução / Fifa)Fifa divulga comunicado para anunciar afastamento de Jérôme Valcke (Foto: Reprodução / Fifa)
O dirigente
Valcke iniciou a carreira como jornalista, passando por algumas das principais emissoras da França, e chegou à Fifa em 2003 para assumir o cargo de diretor de Marketing e TV. Três anos depois ele foi afastado do cargo, acusado de ter mentido na negociação de patrocínio com duas grandes empresas de cartões de crédito. O escândalo custou US$ 60 milhões à Fifa.
Mesmo com a polêmica, Joseph Blatter o nomeou secretário geral da Fifa em 2007. Lá, o francês ganhou um papel de protagonista, esteve à frente das organizações dos Mundiais de 2010, na África do Sul, e 2014, no Brasil, e foi até mesmo cotado para a vaga do suíço quando deixasse a presidência da federação. No entanto, ele já havia anunciado que deixaria a Fifa em fevereiro de 2016.
Jerome Valcke; Fonte Nova (Foto: Carol GarcIa/GOVBA)Jerome Valcke na Fonte Nova; francês esteve à frente do Mundial do Brasil (Foto: Carol GarcIa/GOVBA)