A Proposta de Emenda Constitucional nº 51, que já comentamos aqui no blog,
está gerando muito debate entre os policiais brasileiros. A PEC prevê
uma reforma profunda nas polícias e no sistema de Segurança Pública,
propondo mudanças quase consensuais (como a instalação do Ciclo Completo) e outras que encontram resistências, principalmente no alto escalão das corporações.
Primeira mensagem:
Caros policiais militares,
Como
é de conhecimento de todos, o Senado Federal postou ontem, no site
www.senado.gov.br, uma enquete sobre a proposta que desmilitariza o
modelo policial, convertendo as atuais polícias Civil e Militar em uma
só, de natureza civil (PEC 51/2013).
Penso
que nossos valores de civismo, patriotismo, hierarquia e disciplina
sempre foram exemplos e motivos de orgulho para o povo brasileiro.
Sabendo que estes valores são os alicerces de uma sociedade ordeira, que
contribui um progresso de uma nação, concito a todos os nossos
valorosos policiais militares, que diuturnamente não têm medido esforços
para garantir a segurança pública no Estado, mesmo com o sacrifício da
própria vida, a votar contra a proposta de desmilitarização no site do
Senado Federal.
Cordialmente,
Márcio Martins Sant’ Ana, Coronel PM
Comandante-Geral
***
Segunda mensagem:
Prezado policial militar,
Em
complementação à mensagem anterior, relativa à enquete do Senado
Federal, esclareço a toda a tropa que, além dos aspectos já mencionados,
deve-se levar em consideração que os direitos elencados abaixo nos são
devidos, EXCLUSIVAMENTE, em função da nossa condição de militares:
a) sistema de educação escolar próprio (Colégio Tiradentes);
b) regras de ascensão na carreira;
c) sistema
previdenciário próprio, com regras de aposentadoria exclusivas (única
categoria que mantém a integralidade e paridade salarial quando da
transferência para a reserva);
d) sistema de saúde próprio (HPM, NAIS e convênios).
Caso
as polícias militares percam a condição que lhes garante tratamento
diferenciado pelo ordenamento jurídico brasileiro (SER MILITAR),
inúmeras prerrogativas poderão ser perdidas, com imensuráveis prejuízos a
todos os integrantes das instituições policiais militares brasileiras.
Cordialmente,
Márcio Martins Sant’Ana, Coronel PM
Comandante-Geral
Em
resposta às ponderações do Coronel PMMG Márcio Martins, o antropólogo
Luiz Eduardo Soares, mentor da PEC 51, publicou a seguinte carta aberta
em seu perfil no Facebook:
Carta aberta ao comandante geral da PMMG.
Prezado
Coronel Sant’Ana, respeito plenamente sua opinião contrária à
desmilitarização (à PEC-51). Expressar sua divergência é um direito
democrático. Portanto, respeitar sua opinião é meu dever. Entretanto,
lhe pergunto: se seus subordinados se pronunciarem a favor da PEC-51 e
da desmilitarização, serão respeitados pelo senhor e pela instituição
policial militar? Ou serão censurados e punidos? Muitos deles têm me
escrito afirmando que não ousam expressar opinião favorável à
desmilitarização e à PEC-51 porque temem ser punidos. Além disso,
afirmam que o senhor usou de sua prerrogativa e de canal de comunicação
interna, institucional, para “concitar” seus subordinados. Eu lhe
pergunto, ecoando a indagação de seus subordinados: teriam eles acesso
ao mesmo canal para afirmar suas próprias visões do tema, estabelecendo
um diálogo franco, respeitoso, enriquecedor, pluralista e democrático?
Finalmente,
gostaria de lhe informar que a PEC-51 afirma, enfaticamente, a
necessidade imperiosa de que sejam respeitados todos os direitos
adquiridos (trabalhistas, previdenciários, etc…) pelos policiais
militares. Seria um absurdo se assim não fosse. Os novos profissionais
que viessem a ser contratados como civis, não se beneficiariam dos
direitos exclusivos dos militares, por óbvio, mas seriam beneficiados
pelos direitos garantidos aos trabalhadores civis, entre os quais o
direito à sindicalização, à livre associação, à liberdade de pensamento e
expressão. Direitos vetados aos militares. Direitos aos quais, não por
acaso, suas duas mensagens, abaixo copiadas, não aludem.
Seriam
infundados os temores de seus subordinados de dirigir-se aos colegas
expressando suas próprias opiniões favoráveis à desmilitarização, assim
como o senhor fez, criticando-a? Se os temores não forem infundados, eu
lhe diria que o senhor e sua mensagem estão contribuindo,
involuntariamente, para demonstrar à sociedade brasileira e a seus
subordinados por que é urgente e imprescindível a desmilitarização. Mas
se os temores não tiverem fundamento, por favor, informe pelo mesmo
canal institucional a seus subordinados e os concite a participar do
debate sobre a desmilitarização e a reforma do modelo policial em nosso
país, propostas pela PEC-51. Em sua instituição, coronel, não houve
debate. Apenas o senhor expôs seu ponto de vista. Um debate franco e
aberto permitiria que o senhor aprofundasse suas opiniões, que
provavelmente se beneficiariam – como sói acontecer em ambientes
democráticos -, do contraste com posições opostas. Tenho certeza de que
aqueles que divergem do senhor, no interior de sua instituição, também
teriam uma oportunidade preciosa de rever seus conceitos e,
eventualmente, persuadir-se de que os argumentos que o senhor sustenta
são mais consistentes. Todos ganhariam com a livre manifestação das
ideias e a interlocução franca e respeitosa. Contudo, será que uma
polícia militar, por seu caráter militar, é compatível com a livre troca
de ideias, fonte do amadurecimento coletivo? Esta é a questão, coronel,
e talvez mais do que suas ideias, nesse momento, seus atos poderiam
demonstrar que a PEC-51 está errada.
Convoque
o debate amplo sem impor o silêncio com a arma da hierarquia e prove
que a desmilitarização é uma proposta desnecessária – este o desafio
que, respeitosamente, tomo a liberdade de lhe dirigir, entendendo que,
apesar de nossas profundas divergências, sua intenção não difere da
minha, e que ambos queremos ajudar a construir uma sociedade menos
violenta.
Cordialmente,
Luiz Eduardo Soares
Fonte: http://abordagempolicial.com/