O presente dos meios de comunicação já é digital há bastante tempo, mas também pertence especificamente aos dispositivos móveis, e com força cada vez maior. Nos Estados Unidos, a leitura de notícias através de smartphones e tablets já supera a leitura via computador. Por isso, os sites dos grandes jornais do mundo decidiram se renovar para se tornarem mais amigáveis e legíveis em celulares e tablets, e o buscador Google premiará isso os colocando em uma posição mais elevada nos seus resultados. Essa é a base do acordo apresentado nesta quarta-feira simultaneamente em Londres, Nova York e outras cidades por veículos de comunicação em posição de liderança no mundo. O Google e mais de 30 grandes veículos internacionais, incluindo o EL PAÍS, se associaram para criar conjuntamente o primeiro formato universal e em código aberto (ou seja, disponível para qualquer desenvolvedor que quiser explorá-lo), o que permitirá publicar e distribuir conteúdos muito mais rapidamente.
O projeto apresentado nesta quarta-feira se chama Páginas Móveis Aceleradas (AMP, na sigla em inglês), que batiza também o novo padrão, ainda um protótipo, que permitirá aos editores, programadores de aplicativos e usuários consultarem as notícias a partir de seus smartphones. Empresas tecnológicas como
Twittere o próprio Google, plataformas como Pinterest, LinkedIn e WordPress.com e publicações como Vox,
The New York Times,
O Globo e a BBC (a lista completa de participantes está disponível na página
ampproject.org) já confirmaram a intenção de publicar conteúdos no novo padrão.
Os veículos que criaram o formato junto com o Google são, além do EL PAÍS, Les Echos (França), FAZ(Alemanha),The Financial Times(Reino Unido), The Guardian (Reino Unido), NRC Media (Holanda), La Stampa (Itália) e Die Zeit (Alemanha). O Google publicou uma simulação no Google Search que permite comprovar a rapidez de carregamento dos novos sites.
A apresentação foi feita de forma simultânea em Londres, Nova York e cidades da América do Sul e Ásia. Madhav Chinnappa, diretor de relações estratégicas do Google, começou anunciando que “hoje é o verdadeiro começo de algo. O que fizemos foi falar sobre o que está ocorrendo no ecossistema das notícias. E uma das coisas que primeiro surgiram no nosso diálogo com os veículos foi a questão dos dispositivos móveis. Todos nos perguntávamos se era uma oportunidade ou um desafio”.
Segundo o executivo do Google, todos os veículos e o gigante de buscas concordaram em duas palavras-chaves: rapidez e abertura. “Todos precisamos que nossas páginas baixem muito mais rapidamente, nossos usuários nos pedem isso”, afirmou. De Nova York, o engenheiro-chefe do projeto AMP, Dave Besbris, afirmou que trabalham com a ideia de algo instantâneo. No entanto, esclareceu que nesse formato não haverá nada específico que privilegie essas páginas no buscador.
Os desenvolvedores do projeto criaram vários sites para que os leitores comprovem a rapidez no download de conteúdos: uma geral, no endereço
g.co/ampdemo, em que sugerem procurar termos como “Marte”, “Obamas” e “Prêmio Nobel” (em inglês). O EL PAÍS também lançou sua própria página de testes, a
g.co/ampdemo/es (o usuário nesse caso deve digitar “el pais”).
O tempo para baixar o conteúdo tornou-se um elemento crucial levado em conta pelos leitores na hora de escolher o veículo para se informar. Uma página que demora a aparecer ou tem baixa resolução é frustrante para eles. Já para os editores, é uma possibilidade perdida de cativar audiência e conseguir maiores receitas de publicidade.
Ao contrário de outros formatos recentes como o Instant Articles, que o Facebook lançou há poucos meses, e o estreante News, da Apple, o AMP nasce como um software em código aberto. Está disponível a partir de hoje para qualquer desenvolvedor que quiser explorá-lo, inclusive de outros veículos de comunicação diferentes dos criadores. As especificações estão disponíveis no serviço de compartilhamento GitHub, e alguns jornais, como o The Guardian, já publicaram simulações de como as notícias serão vistas.
O fato de se tratar de um padrão conjunto do Google e de alguns dos principais veículos internacionais é uma vantagem para que o AMP se transforme no equivalente do PDF para os documentos portáteis, do JPEG para as imagens e do FLAC para a música sem compressão. Como foi criado a partir da linguagem HTML, a mais usada para construção de páginas virtuais, o conteúdo em AMP não precisará de nenhum programa especial para ser lido.
Os leitores de notícias, melhores leitores
Os leitores de notícias continuam atraentes para todos os agentes do mundo digital: mídia, redes sociais e buscadores, como o Google. Um estudo da consultora digital Parsely indicava que o tempo dedicado a ler ou ver notícias é maior do que o de outros conteúdos. Além disso, os leitores de notícias, ávidos por atualizações, consultam a Rede mais frequentemente.
O formato é o primeiro resultado tangível da ambiciosa Digital News Initiative, uma aliança do Google com grandes editores para fomentar “o jornalismo de alta qualidade através de tecnologia e inovação”, segundo o buscador. A iniciativa inclui a criação, pelo Google, de um fundo equivalente a aproximadamente 650 milhões de reais em três anos “para projetos que mostrem novas formas de pensar na prática do jornalismo digital”, um programa de pesquisa e formação, e outro dedicado ao desenvolvimento de produtos. Desse programa nasceu o AMP.
O projeto surgiu das conversas entre os editores e as empresas de tecnologia sobre a urgência de melhorar o ecossistema para os aparelhos móveis. O novo formato foi criado integralmente pelas equipes de desenvolvimento de produto do Google e dos mais de 30 veículos envolvidos. Embora seja um projeto gerado por veículos europeus, outros do resto do mundo já se uniram em sua exploração. É o resultado do trabalho de vários meses, ainda que precise de melhoras e de consolidações que serão divulgadas em breve.
Simplificar sem homogeneizar
Danny Bernstein, diretor de alianças de produto do Google, explicou os dois elementos que permitem aumentar a velocidade de download. “Primeiro, estamos simplificando todo o código HTML que há por trás das páginas web atuais, mas com uma exigência: para o leitor, as páginas têm que manter a aparência particular de cada meio de comunicação”. Em outras palavras, as páginas serão mais homogêneas na parte invisível – a linguagem em que estão escritas –, mas vão manter a variedade dos estilos próprios de cada veículo.
Uma nova forma de fazer os conteúdos, a distribuição e a publicidade
Novos conteúdos. O novo formato pretende criar um padrão para que todos os veículos incorporem facilmente a enorme variedade de conteúdos oferecidos a seus leitores: galerias de imagens, mapas, links para redes sociais... A AMP se apresenta como um formato que permitirá aos jornalistas se concentrar no conteúdo, confiando que a experiência visual do usuário estará garantida.
Distribuição rápida e mundial. Além da velocidade, o novo formato deve ser totalmente adaptável a todo tipo de dispositivos e plataformas. Para o Google, “isso significa que notícias e conteúdos produzidos na Espanha podem ser distribuídos na hora, por exemplo, na Índia”. A rapidez não é só fruto de um projeto leve, mas do modelo de distribuição: os conteúdos estarão separados não só nos servidores dos veículos como também nos servidores de cache do Google, de alcance mundial. O buscador indexará mais rapidamente os conteúdos com este formato para que o leitor os localize de imediato ao fazer a busca no sistema.
Publicidade. Trata-se do elemento ainda menos definido do novo formato, mas permite novas formas de se fazer publicidade nativa. Todos os sites que incorporarem a AMP terão o poder de escolher seus anúncios. O formato será compatível com os modelos de negócio baseados em publicidade e em pay walls.
A segunda chave da velocidade consiste no modelo de hospedagem dos conteúdos. Eles não ficarão mais hospedados unicamente nos servidores de cada veículo; em vez disso, a rede do Google os reproduzirá para que sejam distribuídos em qualquer plataforma – Google, Twitter, etc. – e em qualquer lugar do mundo. Este sistema permitirá, por exemplo, que uma atualização numa notícia de um veículo apareça refletida de maneira quase imediata em qualquer outra parte do mundo. O projeto, ainda em suas primeiras fases, não tem uma data de lançamento definida para a versão definitiva.
Veículos de comunicação como The Guardian, BBC e EL PAÍS apresentaram seus próprios protótipos. Para os fundadores do AMP, o enfoque do projeto é muito ambicioso.
O projeto permitirá uma autonomia total dos editores sobre seus conteúdos e estilos. Segundo um porta-voz dos editores, “esta autonomia é fundamental, porque permite, ao mesmo tempo, fazer parte de uma plataforma maior, de uma iniciativa da qual participam tantos meios importantes”.
Os editores manifestaram outra vantagem adicional: será aplicável a qualquer plataforma tecnológica. “Construir soluções para tudo que existe atualmente é algo muito custoso”, afirmaram, e também disseram que “não há qualquer meio de comunicação apto a criar sua própria solução de maneira sustentável”. Vários editores convidaram os veículos de comunicação que ainda não se uniram à iniciativa para que “colaborem entre si” e levem em conta que “não existe qualquer ecossistema sustentável que seja capaz de garantir a experiência do usuário e a integração da publicidade. Este projeto leva em conta os dois aspectos”.