A China ampliará um pouco mais nesta semana a sua presença na América Latina, que já é cada vez mais visível. O primeiro-ministro Li Keqiang chega nos próximos dias ao Brasil e a três países da Aliança do Pacífico – Colômbia, Peru e Chile – para assinar uma série de ambiciosos projetos de investimento com esses importantes parceiros comerciais de Pequim.
As quatro nações, que estão entre as economias mais abertas da região, respondem por 57% do intercâmbio comercial entre China e América Latina, que se multiplicou por mais de 20 desde o ano 2000 e já supera os 262 bilhões de dólares. Os investimentos chineses na região, quase inexistentes há alguns anos, superam atualmente os 100 bilhões de dólares. Na reunião de janeiro em Pequim com os países da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos, o presidente da China, Xi Jinping, prometeu destinar 250 bilhões de dólares em investimentos à região ao longo da próxima década.
Entre os grandes projetos a serem impulsionados nesta semana está uma futura ferrovia ligando o Brasil ao Peru, a ser construída pelos chineses. Para o Governo de Pequim, que ainda se lembra com amargura do cancelamento do contrato para a construção de um trem de alta velocidade no México, no ano passado, o desenvolvimento desse projeto na América do Sul é parte de uma estratégia de exportação da sua tecnologia ferroviária – um setor que precisa de alternativas devido à desaceleração interna da economia chinesa e do excesso de capacidade instalada.A China, segundo o vice-ministro de Comércio Tong Daichi, “está comprometida em diversificar o comércio com os países latino-americanos e a importar produtos de maior valor agregado”. “Esperamos que os países latino-americanos, especialmente esses quatro, possam desenvolver mais o mercado chinês e exportar mais produtos que satisfaçam os consumidores chineses”, declarou.
A cesta de compras da China na América Latina
M.V. L/PEQUIM
Apesar das promessas de Pequim no sentido de diversificar cada vez mais suas importações da América Latina, a maior parte do comércio da região com a China ainda consiste em matérias-primas.
- O Brasil, que no ano passado exportou mais de 40 bilhões de dólares para a China, tem na soja sua principal fonte de negócios, com um volume de 16,6 bilhões de dólares em 2014, segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. O ferro representou 12,3 bilhões, seguido do petróleo (3,5 bilhões), a celulose (1,4 bilhão) e o açúcar (880 milhões de dólares).
- A Colômbia exporta principalmente petróleo para a China. No ano passado, o país vendeu produtos num valor de 5,8 bilhões de dólares para a segunda economia mundial, sendo 5,5 bilhões (95,5% do total) em exportações de minérios, petróleo e café, segundo a ProColombia, agência governamental de comércio exterior.
- O cobre, o ferro e o chumbo representam 63 % das exportações do Peru para a China. A farinha de peixe (com vendas no valor de 688 milhões de dólares em 2014) é o principal produto não mineral exportado pelo país para o gigante asiático. Ao todo, o Peru exportou um pouco mais de 7 bilhões de dólares para a China no ano passado, sendo 4,3 bilhões só em cobre.
- O Chile exportou um total de 18,4 bilhões de dólares para a China em 2014, sendo 14,2 bilhões em cobre. Entre os produtos não minerais, o destaque foi a celulose, num valor de quase 1,2 bilhão de dólares. O escritório nacional de promoção comercial, ProChile, diz que o país sul-americano é o segundo maior fornecedor de vinho para China e o primeiro de uvas e cerejas.
A nova ferrovia permitirá que os produtores brasileiros de soja, ferro e açúcar tenham uma saída direta para o Pacífico, facilitando suas exportações para a China. “Será um grande corredor para as exportações”, afirmou o subsecretário geral do departamento de Política do Itamaraty, embaixador José Alfredo Graça Lima. O Peru, por sua vez, considera que a ferrovia “aumentará a integração nacional” do seu território e a conectividade entre os países da região – o que é justamente um dos princípios da Aliança do Pacífico –, segundo seu embaixador em Pequim, Juan Carlos Capuñay.
Durante a viagem de Li, será autorizado o início dos estudos de viabilidade da nova ferrovia. Um possível traçado pela Amazônia seria mais direto e reduziria o tempo de viagem, mas poderia causar um grave impacto ambiental. Um percurso mais ao sul permitiria incluir outros países, como a Bolívia.
A visita do Li incluirá outros acordos. O Brasil, o principal sócio comercial chinês na América Latina, espera, segundo Graça Lima, assinar cerca de 30 contratos, num valor de 50 bilhões de dólares, em áreas como a agricultura, aeronáutica, indústria automotiva, infraestrutura, energia e siderurgia. Entre eles se encontra um acordo para a venda de 22 aviões da Embraer para duas companhias aéreas chinesas, parte de um pacto para a venda de 60 aeronaves da empresa brasileira a companhias do gigante asiático. O vice-ministro Tong mencionou também um acordo para a importação de carne bovina do Brasil.
Na Colômbia, onde Li comemorará o 35.º aniversário do estabelecimento de relações diplomáticas bilaterais, o primeiro-ministro se reunirá com o presidente Juan Manuel Santos e, segundo Tong, abordará a cooperação em assuntos como o desenvolvimento da infraestrutura, capacitação em recursos humanos e investimentos.
O Peru, que já tem um tratado de livre comércio com Pequim e abriga a segunda maior comunidade chinesa na região, deposita grandes esperanças na visita de Li. Os investimentos chineses em mineração já representam um terço dos novos projetos neste setor no país, e Lima pretende receber tecnologias e investimentos em áreas como energia e telecomunicações.
A viagem de Li terminará no Chile, onde se reunirá com a presidentaMichelle Bachelet. Segundo o embaixador desse país em Pequim, Jorge Heine, a visita do premiê a Santiago visa a “dar um impulso ao investimento” chinês no Chile, que até agora mal alcançou algumas centenas de milhares de dólares. Serão assinados acordos para evitar a dupla tributação e para estimular o intercâmbio de divisas, entre outros assuntos.